24 de agosto O início da minha jornada de unicidade de mestre e discípulo (parte 2)

ROTANEWS176 E POR  JORNAL BRASIL SEIKYO  16/07/2022 09:45

ENSAIO

Por Ho Goku

Reprodução/Foto-RN176 Ilustração retrata o jovem Daisaku Ikeda, à esq., e seu mestre, segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, à dir., idealizando a criação de um jornal da organização. Ao fundo, o objetivo concretizado: jornal Seikyo Shimbun e o Centro Mundial Seikyo da Soka Gakkai. Dr. Daisaku Ikeda, ele é um filósofo, escritor, fotógrafo, poeta e líder budista da SGI atualmente o Mestre e Presidente da Soka Gakkai Internacional – SGI – Ilustração: Kenichiro Uchida

No dia 24 de agosto, comemoram-se 75 anos da conversão do presidente da Soka Gakkai Internacional (SGI), Dr. Daisaku Ikeda, ao Budismo de Nichiren Daishonin. Brasil Seikyo relembra o ensaio de Ikeda sensei sobre a data, publicado em três partes na série “Reflexões sobre a Nova Revolução Humana” na revista Terceira Civilização.

O Budismo Nichiren é o Budismo do Sol. Para que ele ilumine toda a humanidade, é preciso que se propague amplamente pelo mundo. Esse é o decreto do Buda.

Nichiren Daishonin escreveu:

Nos setecentos anos ou mais transcorridos desde que os ensinamentos do Buda foram introduzidos pela primeira vez no Japão, nunca houve alguém que fosse tão odiado por causa do Sutra do Lótus [quanto eu].2

Daishonin considerava uma honra enfrentar perseguições árduas, pois o Sutra do Lótus prediz que obstáculos desse tipo recairiam sobre os seus devotos.

Mais de setecentos anos se passaram desde a época de Daishonin. Embora algumas vezes enfrentemos hostilidades e inveja ou então perseguições e ataques, nós, da SGI, seguimos os ensinamentos de Nichiren Daishonin e expandimos resolutamente nosso movimento pelo kosen-rufu, que hoje abrange uma rede de 183 paí­ses e territórios [artigo escrito em 2002, atualmente são 192]. Esse é o orgulho de todos nós que sustentamos o espírito dos três primeiros presidentes mantenedo­res do forte compromisso do caminho de mestre e discípulo.

* * *

No início de 1949, com 21 anos, comecei a trabalhar na editora Nihon Shogakkan, de [Josei] Toda, como responsável pela publicação de duas revistas — As Aventuras dos Meninos e O Japão dos Meninos.

Josei Toda não era somente meu “mestre”; ele também viria a ser um “soberano” e um “pai” para mim.

Podia compreender perfeitamente a alegria de Platão, o qual observou que o maior presente que o destino lhe havia concedido foi ter vivido na mesma época de seu mestre, Sócrates! Não tive a menor dúvida ao decidir dedicar minha vida a esse notável líder que não temia morrer por suas crenças. Prometi fazer o máximo pela Soka Gakkai, porque esse era o caminho para o avanço do kosen-rufu.

Todo ano, com a aproximação do dia 24 de agosto, minha determina­ção arde com mais intensidade e sou totalmente envolvido pelo espírito do meu mestre, Josei Toda, exemplo de “devoção abnegada pela propagação da Lei”.

* * *

Vinte e quatro de agosto de 1950 — terceiro aniversário de minha conversão ao budismo. Os negócios do presidente Josei Toda passavam por sérias dificuldades e muitos de seus funcionários o denunciaram publicamente e abandonaram o emprego. Nessa situação desesperadora, fui o único que continuou a auxiliá-lo. Orei daimoku do fundo do coração e trabalhei furiosamente para resolver os problemas que enfrentávamos.

Naquele dia, Toda sensei e eu nos encontramos com um jornalista e nos empenhamos sinceramente em corrigir várias interpretações equivocadas que ele sustentava. Esperávamos evitar matérias sensacionalistas e deturpadas sobre a situação de Toda sensei. Depois do encontro com o jornalista em um café no distrito de Toranomon, em Tóquio, meu mestre e eu nos dirigimos para o Parque Ibiya. Para­mos por um tempo para apreciar a paisagem ao longo do fosso que cercava o palácio imperial.

Enquanto caminhávamos, Toda sensei me disse: “O Japão hoje desfruta liberdade de expressão. Ter um jornal próprio é um trunfo e uma fonte de força extraordinários. A Soka Gakkai também precisa ter o próprio jornal um dia. Daisaku, gostaria que você começasse a pensar nisso visando o futuro”.

Seikyo Shimbun nasceu desse diálogo entre mestre e discípulo, no dia 24 de agosto, em meio às circunstâncias mais desoladoras.

Naquela noite, após o término de sua habitual explanação sobre o Sutra do Lótus, Toda sensei declarou que renunciaria ao cargo de diretor-geral da Soka Gakkai [porque não queria que as dificuldades da editora prejudicassem a organização]. Logo depois, ele pediu desculpas por me causar tantos problemas, mas me assegurou que, mesmo deixando de ser diretor-geral, continuaria a ser sempre meu mestre.

Naquela época, a editora estava imersa em altas dívidas. Houve ocasiões em que meu mestre, corajoso como ele só, parecia tão abatido que chegava a ser doloroso vê-lo. Ele estava diante de um precipício, travando uma luta agonizante e desesperadora.

Eu também estava tão mal de saúde que, a qualquer momento, podia sofrer um colapso. Porém, com forte espírito de luta e cheio de paixão juvenil, disse-lhe: “Sensei, por favor, não se preocupe! Encontrarei uma solução para essas dificuldades. Estou determinado a vê-lo como presidente da Soka Gakkai!”. Todo o meu ser ardia com a decisão de proteger a vida do meu mestre, não importando o quê.

Daishonin advertiu: “Se mestre e discípulo possuem pensamentos diferentes, jamais conseguirão rea­lizar algo”.3 Mas se mestre e discípulo estiverem unidos, eles poderão vencer, transformando até mesmo as circunstâncias adver­sas em algo positivo de acordo com o princípio budista de “transformação de veneno em remédio”.

Pelo fato de Toda sensei e eu estarmos firmemente unidos como mestre e discípulo, conseguimos superar aqueles tempos severos. E no ano seguinte, em 3 de maio de 1951, ele se tornou segundo presiden­te da Soka Gakkai numa cerimônia histórica, gloriosa, realizada num dia ensolarado e de céu azul.

* * *

Para apoiar meu mestre, deixei o curso noturno e o sonho de ingressar em uma universidade. Mas Toda sensei, um educador extraordinário, foi meu professor particular e dividiu seu amplo conhecimento comigo. Visualizando o futuro, ele dedicou seu tempo, apesar de sua atarefada agenda, para me instruir em uma variedade de assuntos em aulas realizadas todas as manhãs, de segunda a sábado, e algumas horas aos domingos. Lembro-me desses dias com imensa gratidão ao meu mestre e hoje valorizo ainda mais sua profun­da generosidade e seu afeto.

Neste 24 de agosto — meu 55o aniversário de conversão ao budismo [neste ano comemora-se o 75o aniversário] — convidados da Índia, berço do budismo, chegaram ao Japão. Eles formam uma delegação da renomada Universidade Himachal Pradesh, chefiada por seu vice-presidente Shruti Datt Sharma, que viajou uma longa distância especialmente para me conferir o título de doutor honoris causa em literatura (em 26 de agosto de 2002).

Meu maior desejo é estender esta honra acadêmica — a 130ª da categoria que recebi até a presente data [agosto de 2002] — aos meus queridos companheiros da Soka Gakkai que têm compartilhado sofrimentos e alegrias comigo.

Recentemente, um famoso educador observou que ele sabia de poucos indivíduos ou de quase nenhum no mundo, muito menos do Japão, que tivessem recebido tantas homenagens de universidades do mundo inteiro. Apesar de eu ter sido alvo constante de críticas e insultos durante longos anos, ele me enviou suas mais calorosas felicitações, repletas de expressões de louvor e de admiração. Meu mestre costumava dizer que tudo o que necessitamos é de um verdadeiro amigo.

* * *

Havia aquelas que pareciam acreditar em mim, mas começaram a criar dúvidas ao me verem ser perseguido. Elas não só abandonaram o Sutra do Lótus como também acreditaram que eram sábias o bastante para me orientar.4

Reprodução/Foto-RN176 Daisaku Ikeda, à esq., e seu mestre, Josei Toda, à dir. caminham lado a lado em atividade em Shizuoka (1958). Dr. Daisaku Ikeda, ele é um filósofo, escritor, fotógrafo, poeta e líder budista da SGI atualmente o Mestre e Presidente da Soka Gakkai Internacional – SGI – Foto: Seikyo Press

Essa é a passagem do escrito Carta de Sado, de Nichiren Daishonin, que o presidente Makiguchi sublinhou em vermelho em seu Gosho, a qual lia e refletia várias vezes.

Quando Makiguchi foi preso, ele foi traído e perseguido por discípulos a quem estimava e confia­va. Ao saber disso, Toda sensei, também na prisão, esbravejou: “Que bando de covardes, de fracos!” Eles não são discípulos, não passam de calhordas interesseiros que usaram Makiguchi sensei”.

Toda sensei foi o único que corajosamente se uniu a Makiguchi em sua luta, declarando com sincera gratidão: “Sua vasta benevolência permitiu-me acompanhá-lo até mesmo na prisão”.

Os clérigos covardes e insensíveis proibiram Makiguchi sensei de visitar o templo Taiseki-ji, apagaram seu nome do registro de seguidores leigos e, quando ele foi preso, incitaram seus familiares a convencê-lo a abandonar suas convicções.

No momento crucial, a indecisão no coração das pessoas é reve­lada claramente. De fato, o cora­ção humano pode abrigar sentimentos terríveis.

Por exemplo, certo Sr. Yajima, que, por curto tempo, sucedeu a Toda sensei como diretor-geral, mais tarde traiu e começou a atacar a Soka Gakkai. Toda sensei costumava dizer: “Nos momentos de grandes dificuldades, a máscara das pessoas de má índole, sem princípios, interesseiras, fúteis e pretenciosas logo cai revelando seu verdadeiro aspecto. Apesar de brada­rem pelo kosen-rufu e de falarem sobre o budismo para muitas pessoas, esses indivíduos desprezíveis invariavelmente acabam vestindo a armadura malévola da perfídia, tornando-se uma força antagônica que insulta e inflige sofrimento àqueles que se dedicam a seguir o caminho correto e verdadeiro”.

Possuidor de uma percepção aguçada, Toda sensei também disse: “Deixe estar esses perdedores vis e covardes. Trair a Gakkai é trair Daishonin. Vocês entenderão o que estou dizendo quando virem a punição que sofrerão no final da vida”.

Nesses 55 anos [em 2022, 75 anos] que se passaram tenho observado claramente esse tipo de comportamento humano. A rigorosidade da lei de causa e efeito budista é mais precisa que a ciência mais exata, absolutamente infalível.

Aqueles que avançam junto com a Soka Gakkai, que seguem resolutamente o caminho da verdade e da integridade, nunca falham em adornar os últimos anos com magnífica glória e vitória, banhados pelos brilhantes raios de sol carmesim.

Continua na próxima edição.

No topo: ilustração retrata o jovem Daisaku Ikeda, à esq., e seu mestre, segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, à dir., idealizando a criação de um jornal da organização. Ao fundo, o objetivo concretizado: jornal Seikyo Shimbun e o Centro Mundial Seikyo da Soka Gakkai

Fonte:

Terceira Civilização, ed. 413, fev. 2003, p. 7.

Notas:

  1. Ho Goku: Pseudônimo de Daisaku Ikeda.
  2. Coletânea dos Escritos de Nichiren Dai­shonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. I, p. 542, 2020.
  3. Ibidem, v. II, p. 173, 2019.
  4. Ibidem, v. I, p. 322, 2020.

 Ilustração: Kenichiro Uchida

Foto: Seikyo Press