ROTANEWS176 E DELAS 22/12/2017 10:00
“Usamos proteção, mas o pensamento de que ‘eu não quero ter que fazer um aborto novamente’ passou pela minha cabeça”, diz mulher em um dos relatos
Sofrer um aborto é algo terrível para qualquer mulher, desejando ou não a criança, ela sente as consequências no corpo e, principalmente, na mente. Após o trauma, é comum que várias perguntas surjam na cabeça dela: a relação sexual vai doer? Como vou me sentir? Será diferente? Para ajudar a responder essas questões, mulheres relataram ao portal “Self” como foi passar por esse processo e como conseguiram seguir em frente.
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Reprodução/Foto-RN176 Mulheres revelam suas histórias e contam como superaram o trauma de um aborto e voltaram a ter relações sexuais
Vale ressaltar que as mulheres que expuseram suas histórias são americanas e todas optaram por interromper a gestação, algo permitido nos Estados Unidos. Já no Brasil é diferente, as mulheres só tem o direito de abortar se elas correm risco de morrer durante a gestação, se a gravidez é resultado de um estupro ou se o feto sofre de anencefalia. Ainda assim, muitas brasileiras sofrem com aborto espontâneo ou se arriscam em clínicas clandestinas para tirar o bebê. Depois sofrem as consequências físicas e psicológicas, principalmente na parte sexual.
Confira os relatos de oito mulheres que preferiram divulgar apenas o primeiro nome para preservar a imagem delas e de suas famílias:
Samie, 29 anos
Tive um aborto quando tinha 26 anos porque eu quis. Estava saindo casualmente com um cara e foi quando descobri que estava grávida. Sabia que não estava preparada para ter um filho. Acho que há muitos equívocos sobre o que você pode sentir depois de ter um aborto. Pensei, por exemplo, que poderia me arrepender, mas isso nunca aconteceu. Foi uma decisão fácil e fico extremamente orgulhosa em saber que fiz isso.
Três ou quatro meses se passaram entre o meu procedimento e quando eu fiz sexo novamente. Coloquei na cabeça que a primeira vez pós-aborto precisaria ser especial – igual quando perdi minha virgindade de maneira especial. Agora que eu sabia mais sobre as “consequências” do sexo fiquei esperta e tornei as relações mais importantes, mais corretas. Só então, percebi que sexo não era algo especial ou diferente. Percebi que não precisava me preocupar com erros e que poderia continuar fazendo o que fazia anteriormente.
Ressalto que isso só ficou claro quando percebi o tipo de preconceito que guardava no meu inconscientemente. Apesar de todo o meu pensamento progressivo, tive essa fase em que achei que o sexo era ruim, que provavelmente passei por tudo isso porque fiz algo errado e que teria que viver com as consequências, em vez de tratá-lo como parte da minha vida e do meu desejo. Percebi que meu aborto pertence a mim e só eu posso decidir como lidar com isso.
Alayna, 25
Na verdade, tive três abortos. O primeiro aconteceu quando tinha 17 anos. Eu estava no ensino médio na época e senti uma pressão imensa para fazer sexo com meu então namorado, embora eu soubesse que não deveria. Perdi o controle dos métodos contraceptivos em uma semana, fiquei grávida e decidi abortar. Depois disso, voltei a fazer sexo assim que pude, porque acreditava que essa era a forma de manter o meu parceiro comigo. Eu realmente não pensei nas consequências das minhas atitudes.
Reprodução/Foto-RN176 Na maioria dos depoimentos, as mulheres dizem que a princípio sentiram medo de como seria o sexo
A segunda vez que fiquei grávida tinha 19 anos. Estava noiva no momento (de um parceiro diferente) e, olhando para trás, percebo que não deveria ter tirado a criança. Após o procedimento, comecei a fazer uso de outros métodos contraceptivos, e isso fez com que a relação se tornasse dolorosa. Senti muito incomodo quando fiz sexo pela primeira vez no pós-aborto, mas achava que era meu dever continuar a ter relações sexuais regularmente com meu parceiro. Fazia de qualquer maneira, apesar do meu desconforto.
Ainda assim, fiquei muito mais nervosa com a ideia de engravidar novamente. Eu não sei se foi por causa do desconforto ou porque eu simplesmente não estava tão interessada sexualmente pelo cara. Minha libido ficou muito baixa por um longo tempo depois disso.
Então, eu tive meu terceiro aborto quando tinha 23 anos. Estava em um relacionamento muito bom e saudável, e meu parceiro era realmente amoroso, solidário e atencioso. Esperei uma pouco mais de tempo, mas como nas duas primeiras gravidezes, acabei abortando. Eu sangrei por muito mais tempo. Mas, eu também estava mais velha e segura demais para estabelecer limites com meu parceiro. Esperamos alguns meses antes de fazer sexo novamente e acho que porque ele estava mais nervoso do que eu.
Kenya, 42
A primeira vez que tirei uma criança tinha 19 anos, estava na faculdade e não me sentia preparada para me tornar mãe. Fiquei meio envergonhada por ter engravidado, então não compartilhei isso com ninguém – basicamente fiz tudo sozinha. O cara que eu estava ficando na época estava em outro relacionamento, porém ele omitiu isso de mim. Fiquei devastada quando descobri.
As instruções de cuidados que recebi foram que eu deveria esperar pelo menos quatro semanas antes de fazer sexo novamente após o procedimento, mas eu não pensava nisso. Só lembro que fiquei paranoica com medo de engravidar mais uma vez e ter de passar por tudo isso novamente. Então, optei por esperar um bom tempo antes tentar ter relações novamente. Nesse período, foquei nos estudos.
Lindsay, 30
Quando eu tinha 23 anos, namorava um cara que era terrível e fiquei grávida por acidente. No fundo, sempre soube que abortaria se isso um dia acontecesse. Eu simplesmente não sou apenas uma pessoa que nasceu para ter filhos. O cara que eu estava ficando não me apoiava. Ele realmente é era detestável. Agora, ele está fora da minha vida, o que é incrível, mas isso provavelmente não teria acontecido se eu tivesse escolhido ter a criança.
Reprodução/Foto-RN176 Mesmo com receio, elas voltaram a ter relações e passaram a tomar mais cuidado e usar os métodos contraceptivos
Eu definitivamente sou uma pessoa muito sexual. Minha sexualidade é uma grande parte de quem eu sou, mas, depois de abortar, meu psicológico ficou mexido. Eu não estava me sentindo 100% como eu era e não sabia onde exatamente minha sexualidade se encaixaria porque foi através dela que tudo aconteceu.
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Acabei tendo relações duas semanas depois, o que provavelmente era mais cedo do que deveria. Eu estava em uma festa com um amigo, e na minha cabeça era como se só se passasse “Fod@#%-se tudo. Vamos acabar com isso”. Curiosamente, acabamos a noite na minha cama. Eu definitivamente estava um pouco mais nervosa do que o normal, ficava checando para me certificar de que o preservativo ainda estava lá. E, mesmo usando preservativo, tomei a pílula do dia seguinte. Foi realmente bom, porque isso me ajudou a recuperar parte de mim e me fez ter certeza de que minha vida sexual estava ok.
Stephanie, 33
O meu primeiro procedimento aconteceu quando eu tinha 25 anos. A gravidez foi inesperada, mas meu então namorado – agora marido – e eu decidimos manter o bebê. No nosso ultrassom de oito semanas, no entanto, algo parecia estar errado. Recebemos a notícia que nosso bebê tinha uma condição genética rara que afetaria a qualidade de vida dele.
Estávamos com o coração partido. Diante de uma escolha difícil, decidimos não passar pela gravidez. Esperamos pelo menos três ou quatro semanas para o sangramento diminuir e logo comecei a me sentir fisicamente melhor. Quando voltamos a ter relações, o sexo estava cheio de ternura, gentileza, choro e cuidados.
O meu segundo aborto aconteceu recentemente – cerca de um mês atrás. Meu marido e eu temos dois filhos, e ter mais um bebê não estava em nossos planos. Dessa vez, não foi uma jornada emocional, mas, sim, uma atitude prática.
Ainda assim, me surpreendi com a rapidez com que queria fazer sexo novamente. Estava de volta na cama como meu marido poucos dias depois do meu procedimento. Acho que o maior desejo era querer estar perto dele para ser consolada, e parte disso foi porque o acontecimento me despertou vários questionamentos. Não devo me sentir horrível? Como eu deveria estar depois dessa experiência? Bem, eu não estava planejando nada disso, mas, naquele momento da minha vida, eu estava confortável o suficiente, aceitando o presente de sentir excitação naquele momento e sem sentir vergonha disso.
Kayla, 24
Tive um aborto quando tinha 19 anos e depois outro quando tinha 21 anos – as duas vezes que engravidei foi do mesmo parceiro e estou com ele até hoje. Na primeira vez, me lembro de estar realmente nervosa para ter relações sexuais novamente.
Os profissionais da clínica que eu fui me disseram para esperar várias semanas antes de partir para os momentos íntimos, mas confesso que não esperei tempo suficiente. Estava com medo e não tinha noção de como seria. Vou sangrar? Tem alguma coisa errada? Tudo será normal ou não? Todas essas perguntas estavam dominando minha cabeça. Mas, no fim tudo acabou bem.
Reprodução/Foto-RN176 A gravidez não é um sonho para todas as mulheres, por isso, algumas optam por interromper a gestação
O meu segundo aconteceu alguns anos depois. Tinha acabado de ter meu primeiro filho – ele tinha quatro meses na época. Eu e meu parceiro concordamos que ter outro filho tão cedo não era o ideal para nós. Como já tínhamos passado por isso antes, não ficamos com receio de como seriam as relações sexuais depois do procedimento, sabíamos que as coisas voltariam ao normal.
Aziza, 38
Eu tinha 33 anos quando abortei. Estava morando em Chicago, tinha um subemprego e estava fazendo de tudo para mudar de vida. Mantinha um relacionamento à distância. Depois de uma visita de uma semana do meu parceiro, fiquei grávida. Nós falamos em tomar a pílula do dia seguinte, mas achei que nunca engravidaria porque já tinha 33 anos. Pensei que isso não aconteceria comigo, mas estava errada. Uma semana depois de tirar a criança, fui visitar meu parceiro.
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Nós deveríamos esperar pelo menos duas semanas para fazer sexo novamente. Porém, só me lembro de querer muito transar com ele, porque nós não nos víamos com uma frequência de um casal que mora perto. No fundo da minha mente, ficava martelando que eu precisava tomar as devidas precauções. Usamos proteção, mas o pensamento de que “eu não quero ter que fazer um aborto novamente” passou pela minha cabeça.