Pelé, 80 anos em 80 dias: o dia no qual o ‘Rei’ celebrou seu cinquentenário em campo

ROTANEWS176 E POR LANCE! 31/10/2020 08h31                                                                                                    Por Vinícius Faustini

Há 30 anos, o Atleta do Século voltava ao gramado pela Seleção e fascinava colegas de convocação por sua dedicação no treino e por dribles com a camisa canarinha

O ar de incansável de Pelé se estendeu até mesmo depois de ele pendurar as chuteiras oficialmente. Há exatos 30 anos, o “Rei” prorrogava as comemorações pelo seu cinquentenário do jeito que mais gostava: em campo. O projeto “Pelé, 80 anos em 80 dias”, feito pelo LANCE!, recorda o dia no qual a Seleção Brasileira contou com o homenageado entre seus titulares para um amistoso no Estádio San Siro contra o Combinado do Resto do Mundo.

Reprodução/Foto-RN176 Pelé atuou na Seleção que, comandada por Falcão, tinha nomes como o goleiro Sérgio, os laterais Leonardo e Cafu, o volante César Sampaio, o meia Neto e os atacantes Charles Baiano e Rinaldo (Divulgação) – Foto: Lance!

Designado como comandante no ciclo canarinho após a eliminação na Copa do Mundo daquele ano, Paulo Roberto Falcão recorda que se impressionou com a conduta do “Rei” (que em 23 de outubro completou 80 anos) em torno da partida comemorativa pelos seus 50 anos.

– Ele era o dono da festa, poderia só aparecer para o amistoso. Mas agiu com seriedade, fez questão de ir, treinar com os convocados… – disse ao LANCE! e, em seguida, revelou um pedido feito pelo camisa 10:

– Só tivemos tempo para fazer um treino. Aí ele me pediu: “posso só cobrar uma falta no jogo?”. Eu ia dizer o contrário? Foi impressionante o respeito dele, a dedicação. Tenho certeza que isto foi uma referência para quem viveu aquele momento. Eu vinha dando chance a jogadores que atuavam no Brasil. Além disto, também tinham muitos jovens na lista – completou.

Entre os convocados para o confronto estavam nomes como Cafu (que iniciou o jogo como ponta, enquanto Gil Baiano ocupava a lateral direita) e o lateral-esquerdo Leonardo, o zagueiro Adilson, o meio-campista César Sampaio e o atacante Charles Baiano.

Titular daquele confronto, o goleiro Sérgio destaca que conhecia a postura de Pelé desde o convívio com ele na Vila Belmiro.

– Na época eu era goleiro do Santos, e o Edinho, filho dele, estava começando carreira. Pelé ia com frequência à Vila e, em relação a mim, até brincava, dizia para o Edinho: “esse vai ser o seu pai aqui no Santos. Ouve bem os conselhos dele”. Agora, este jogo com o Pelé foi um exemplo para a gente. Mesmo com 50 anos, ele foi com toda humildade treinar com a gente, naquela ânsia de ganhar – afirmou.

O então camisa 1 contou como foi a convivência com o “Rei” para o duelo.

– Festa era só antes do apito. Pelé levou tudo a sério, treinou pensando em ser competitivo em campo. Isso ajuda quem está com ele, motiva qualquer jogador – declarou.

Falcão detalha o que chamou sua atenção na atuação de Pelé no Estádio San Siro.

– Mesmo com 50 anos, a capacidade dele dentro de campo não tinha mudado. Quem sabe futebol não perde o olhar, a interpretação de jogo… E isso porque tinha treinado só em um dia com o restante do jogadores. Imagine se tivesse mais ritmo de jogo! Ele voltou a incorporar com uma naturalidade a camisa da Seleção, tentou jogadas, deu dribles… – relembrou.

Pelé se tornou titular no lugar de Neto, que na época era “cotado” para deslanchar com a camisa 10 canarinha. O eterno ídolo do Corinthians também falou sobre o convívio com o Atleta do Século neste período.

– Foi uma experiência diferente. Sinceramente eu vinha de convocações seguidas naquela ocasião e, no início, só me parecia mais uma. Mas quando vi todo o cenário em torno daquele jogo, me surpreendi. O Pelé sempre foi um grande amigo. Respeitoso e atencioso – enfatizou.

Em seguida, o craque contou que reagiu de maneira bem-humorada ao saber que teria de ceder espaço justamente a Pelé entre os titulares.

– O Falcão me disse no hotel que isso aconteceria. De pronto, brinquei: “nem f…!”. Mas lógico que foi uma baita honra pra mim participar dessa partida dessa maneira especial – disse.

O “Rei” ficou em campo durante 43 minutos. Em um momento, o grito de gol ficou preso na garganta de quem queria vê-lo balançar as redes. Promissor atacante que atuava no Fluminense, Rinaldo teve a chance de acionar o “Rei”. Porém, optou por finalizar e a bola foi para fora.

– Nossa, na hora a gente não entendeu nada. O Pelé estava na boca do gol. Depois, a gente até foi e reclamou com ele – disse Sérgio.

Após ficar 43 minutos em campo, Pelé foi sacado para a entrada justamente de Neto. Naquele momento, o Brasil perdia por 1 a 0, devido ao gol marcado pelo espanhol Michel. O hoje apresentador na Band, lembra-se do momento no qual entrou em campo no lugar do “Rei”.

– O Pelé não me deu conselho. Ele só agradeceu. É mole? Pouco humilde o Rei! – garantiu.

Coube ao próprio Neto marcar o gol da Seleção Brasileira em uma cobrança de falta. O meia corintiano garante que não chegou a pedir conselhos ao ilustre companheiro de convocação daquela partida.

– Até porque se tinha algo em que eu desafiaria ele era nas faltas. Mas sem ele em campo o jogo virou normal. Quer dizer, a Seleção do Resto do Mundo era monstruosa. Mas tive a oportunidade e marquei. Sempre treinei. Era bom nesse fundamento – declarou.

Seu gol não evitou a derrota por 2 a 1 da Seleção Brasileira para o Combinado do Resto do Mundo. O romeno Hagi também marcou para a equipe de astros que contou com nomes como Goycoechea, Carlo Ancelotti, Van Basten, Roger Milla, Francescoli e os brasileiros Júlio César, Alemão e João Paulo.

Passados 30 anos, Paulo Roberto Falcão fala com carinho deste dia no qual teve sob seu comando o “Rei”.

– É um privilégio para poucos treinadores. Trata-se de um atleta que não chegou a tantas conquistas por acaso. Pelé teve muita dedicação, profissionalismo. Além disto, a maneira como ele ia para o gol era de assustar. Parecia que tinha um ímã na bola. Um grande jogador e uma pessoa impressionante – declarou.

Pelé saía do San Siro ainda mais valorizado como símbolo para as futuras gerações que viriam na Seleção Brasileira.