Profunda relação

ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO  08/05/2021  08:05

REDAÇÃO/CONHEÇA O BUDISMO

Conceito de “relações de afinidade”, muito utilizado no budismo, aponta para a possibilidade de se construir um presente harmonioso e um futuro brilhante

Reprodução/Foto-RN176 Desenho ilustrativa – Editora Brasil Seikyo – BSGI

Quantas vezes nós nos pegamos refletindo sobre aspectos da vida como: “Por que nascemos em determinada família e sociedade?” ou “Por que certas pessoas surgem na nossa vida e por quais razões desenvolvemos algumas relações pessoais?”. Por meio do conceito de “relações de afinidade” (kenzoku), o budismo ensina que as relações que criamos na vida — por exemplo, nascer num local e família específicos, sob dadas condições — estão diretamente ligadas a, no passado, termos desenvolvido algum tipo de causa com as pessoas que compõem esses “ambientes”.

O que é carma?

O Dr. Daisaku Ikeda, presidente da SGI, declara: “O budismo ensina que nossa vida é, em grande parte, governada pelo carma, que se acumula devido às nossas ações praticadas em existências passadas”.1 Explicando de maneira simplificada, carma corresponde ao efeito de todas as ações que cometemos, nesta ou em outras existências, seja por meio de pensamentos, palavras ou ações, propriamente ditas. O que acontece na vida é efeito cármico, que pode ser negativo ou positivo e determina o nosso destino. A questão é que, popularmente, quando se trata desse assunto, de imediato, ou quase exclusivamente, se associa carma a dificuldades, mazelas e má sorte. Nesse “pacote”, inserem-se aí a condição em que vivemos, nossas características, personalidades, aptidões, onde nascemos e também as pessoas com as quais nos relacionamos.

Focalizando nas relações pessoais (família, bairro, ambiente profissional), por mais difícil (ou não) que seja aceitar, criamos relações com elas no passado e, agora, desfrutamos seu convívio. Fizemos causas semelhantes e, portanto, nascemos sob as mesmas circunstâncias nesta existência.

Ampliando nosso olhar

Quando se fala em relações de afinidade, o mais comum é apontar os fatores negativos, como se fossem uma espécie de castigo viver determinada realidade e conviver com algumas pessoas, ou ainda, por possuirmos certa característica não muito positiva e atrair indivíduos de comportamentos semelhantes. Vamos, aqui, observar as relações compartilhadas com um novo olhar, amplo e positivo, que nos impulsione para um futuro ainda mais promissor.

Tomemos como exemplo a união de pessoas que forma a grande rede de humanismo que é a Soka Gakkai. Juntos, superando diferenças, atuamos pelo desenvolvimento humano para a concretização de uma sociedade humanística (kosen-rufu) unidos pelos fios invisíveis da Lei Mística do Nam-myoho-renge-kyo. O presidente Ikeda observa: “Muito mais que as relações com a esposa e com os filhos ou com os parentes próximos, a relação eterna e fundamental de kenzoku ligada à Lei Mística é a verdadeira relação de kenzoku”.2

Podemos afirmar, com certeza, que essa observação do Mestre está alicerçada nos escritos de Nichiren Daishonin. Em um deles consta:

Devem ter sido os laços cármicos do distante passado que o levaram a se tornar meu discípulo numa época como esta. Shakyamuni e Muitos Tesouros, com certeza, compreenderam esta verdade. A declaração do sutra de que “As pessoas que ouviram a Lei habitaram aqui e ali, em várias terras do buda, e constantemente renasceram em companhia de seus mestres”,3 não pode, de maneira alguma, ser falsa.4

Em outro escrito, consta:

Agradeço-lhe profundamente por ter enviado uma carta a este lugar tão distante. É extremamente raro nascer como ser humano. O senhor não só foi dotado de forma humana, como teve a rara boa sorte de encontrar o budismo. Além disso, dentre o grande número de ensinamentos do Buda o senhor encontrou o daimoku, ou título, do Sutra do Lótus e tornou-se seu devoto. Na verdade, o senhor é uma pessoa que fez oferecimentos a cem bilhões de budas em existências passadas!5

Atuar pelo kosen-rufu, em torno de Ikeda sensei é, sem dúvida, uma poderosa causa positiva realizada no passado e no presente e que refletirá em nosso futuro. Considerando o agora, kenzoku não é apenas a relação do nosso passado com o presente, mas também a ligação do nosso presente com o amanhã que desejamos viver. E nesses esforços para continuar a construir um futuro brilhante, manifestar sabedoria com base na prática é básico. Recitar daimoku para pensar, falar e agir de maneira positiva é fundamental para quem deseja ser feliz hoje, assim como em momentos vindouros. Mudar nossa postura e valorizar nossas relações atuais também são importantes ações a serem empreendidas.

Prosperidade na família

Outro aspecto que precisa ser pensado sobre “relações de afinidade” é como a condição de uma pessoa pode interferir na vida daquelas pessoas com as quais convive. Vamos ao exemplo. Numa família, uma mãe batalhadora consegue inspirar os filhos e o marido a se esforçar como ela. Ao obter determinada vitória em algum aspecto, o qual desafia diariamente sob o olhar da família, essa mãe interfere diretamente na vida de todos, motivando-os a vencer também. Esse exemplo revela que, nas relações de afinidade, a vitória de um é contagiante, inspirando aqueles ao redor.

Preciosidade das relações familiares

Já não é novidade que o isolamento social, medida necessária na contenção da pandemia ocasionada pelo coronavírus, mexeu fortemente com os eixos familiares. Alguns núcleos se fortaleceram, outros nem tanto. Porém, uma coisa é certa: ficou evidente a necessidade do cuidado e do apreço nos laços familiares. Analisar esse ponto por meio do conceito de relações de afinidade fortalece a ideia de que esses laços são extremamente valorosos; são pessoas com as quais escolhemos desfrutar esta existência por termos algo para aprender ou mesmo ensinar a elas. O Buda explicou isso também citando a relação que tinha com seus pais:

Os pais que deram vida a este homem extraordinário chamado Nichiren são as pessoas mais afortunadas de todo o Japão. Sem dúvida, foi por uma profunda força cármica que eles se tornaram meus pais, e eu, seu filho. Se Nichiren é o emissário do Sutra do Lótus e d’Aquele que Assim Chega Shakyamuni, seus pais também devem compartilhar essa mesma relação. Eles são como o rei Adorno Magnífico e a dama Virtude Pura, e seus filhos, Acervo Puro e Visão Pura. Será possível que os dois budas Shakyamuni e Muitos Tesouros renasceram como pais de Nichiren?6

Conclusão

Compreender relações de afinidade é ter nas mãos a possibilidade de agir e mudar algo em nosso interior. E, ao tratar desse tema, qualquer exemplo que utilizemos ainda é muito limitado, mas é inegável a necessidade de observar os laços familiares (consanguíneos ou não) por meio dele. Dois filhos de um mesmo casal, não necessariamente devem ser iguais ou têm de concordar em tudo, por maior afinidade que tenham. O que faz a diferença, por exemplo, entre nós e outros familiares com quem convivemos, é que essas relações possuem um significado profundo de reencontro. Cabe a nós, que praticamos o Budismo Nichiren, buscar superar as diferenças pelo bem da harmonia familiar, do ambiente de trabalho, no bairro etc. Nossa sincera dedicação às atividades da “família Soka” é uma mostra de que é possível superar as divergências quando se tem um objetivo grandioso e mobilizar essas relações de maneira construtiva.

Relações de afinidade ou kenzoku são o próprio universo, são a relação com toda a vida existente, independentemente se a compreendemos ou não, pois estamos ligados pela Lei Mística do Nam-myoho-renge-kyo. Unidos, nós nos dedicamos à propagação de uma filosofia universal que defende a dignidade da vida e que ensina a conquistar a verdadeira felicidade, transpondo qualquer condição. Superamos todas as nossas diferenças para cumprir nossa missão, em torno do Mestre, de apresentar ao mundo o supremo ensinamento de Nichiren Daishonin, com o objetivo de transformar o coração humano e, consequentemente, pacificar a sociedade.

Notas:

  1. Brasil Seikyo, ed. 2.290, 5 set. 2015.
  2. Terceira Civilização, ed. 442, jun. 2005.
  3. Sutra do Lótus, cap. 23.
  4. Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. I, p. 226, 2014.
  5. Idem, v. II, p. 259, 2017.
  6. Ibidem.

Fontes:

Terceira Civilização, ed. 546, fev. 2014.

Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. I, 2014.

Idem, v. II, 2017.