ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 21/08/2021 09:06
ENCONTRO COM O MESTRE
Da série “Viagens Inesquecíveis – Com um Coração como o Sol”.
Reprodução/Foto-RN176 Ikeda sensei e sua esposa, Kaneko, visitam a terra natal de Ota (Centro Cultural Ikeda de Ota, dez. 1990) Dr. Daisaku Ikeda, ele é um filósofo, escritor, fotógrafo, poeta e líder budista da SGI atualmente o Mestre e Presidente da Soka Gakkai Internacional – SGI – Editora Brasil Seikyo – BSGI
Brasil Seikyo publica, nesta edição, a sexta parte da série de ensaios do presidente da SGI, Dr. Daisaku Ikeda, “Viagens Inesquecíveis — Com um Coração como o Sol”, na qual ele narra suas recordações das pessoas com quem criou laços de amizade nas localidades que visitou no Japão e em diversos países, abordando também aspectos da cultura e história locais. A série foi veiculada, a princípio, na revista mensal Pumpkin e em livro; depois também foi divulgada no jornal Seikyo Shimbun.
Esta parte foi extraída do volume 2 da coletânea de ensaios de mesmo nome da série, lançada pela editora Ushio. O presidente Ikeda, que escreveu “Terra natal é onde estão as pessoas com quem compartilho preciosos laços de vida”, relembra com saudade de Ota, bairro onde nasceu e cresceu. Ele conclama todos a expandir os elos de amizade por meio do diálogo imbuído de coragem e edificar juntos a terra natal de transbordante alegria. Assim como a “Campanha de Fevereiro”, na qual o jovem Ikeda desenvolveu uma grande e incansável luta de visitas e de incentivos individuais, tendo como palco o bairro de Ota, vamos pôr em prática esse espírito de prezar cada pessoa e encorajá-la, abarcando todos os cantos de nossa localidade.
- DAISAKU IKEDA
Na minha infância,
Ota era
meu mundo inteiro.
Jamais me esquecerei
daquele lugar, daquelas ruas.
É estranho como as cenas vividas na “terra natal” parecem ficar cada vez mais coloridas e nítidas conforme vamos envelhecendo.
A terra natal é o solo em que minha vida foi gerada e no qual me desenvolvi. Posso dizer que não é só o local em que nasci, mas o palco do momento decisivo da minha juventude, do meu alçar voo. É onde uni a força com os colegas a fim de contribuirmos para seu desenvolvimento desejando sua prosperidade. Terra natal, acima de tudo, é onde estão pessoas inesquecíveis com quem compartilho preciosos laços de vida.
Para minha esposa e eu, essa preciosa terra natal repleta de nostalgia e de saudade é o bairro de Ota, da Grande Tóquio.
Pela construção da paz
[Nota do Editor: Ikeda sensei nasceu numa família que trabalhava na produção de nori [espécie de folha feita de algas marinhas], na região do atual bairro de Ota. Local em que se encontrou com seu mestre da vida e iniciou sua luta em prol da paz, Ota é a sua “terra do ponto primordial”.]
Reprodução/Foto-RN176 Bairro de Ota, Tóquio (no primeiro plano e costa ao fundo), e província de Kanagawa (ao centro e à esquerda) ladeados pelo rio Tama. A região verdejante em torno do lago é muito apreciada pelas pessoas para o lazer (ago. 1986)
Nasci em Iriarai e cresci em Kojiya [atualmente, fazem parte do bairro de Ota]. O mar da Baía de Tóquio se estendia amplamente bem próximo dali, e a brisa do mar soprava pelos campos. Se cruzasse o rio Tama, que corria nas proximidades, já estava na província vizinha de Kanagawa. A natureza solta teceu recordações ricas de tonalidades e cores da primavera, do verão, do outono e do inverno.
Durante a guerra, Magome, para onde nossa família teve de se refugiar, era chamada de “vila dos escritores” por ser a morada de muitos escritores e artistas desde o fim da era Taisho até o início da era Showa.
A escritora de contos infantis que traduziu a famosa obra Anne of Green Gables [de L. M. Montgomery] nesse local disse que tinha sempre em mente: “Olhemos bem para a realidade, e a partir daí, devemos rever o passado, vislumbrar o futuro e corrigir o presente”.
Depois da guerra, nós, jovens, também formamos um clube de leitura e aprendemos uns com os outros. Um episódio do qual me lembro com nostalgia é aquele em que, após o término de um desses encontros, enquanto passeávamos pela praia de Morigasaki, um amigo e eu prometemos mutuamente dedicar a vida em prol do bem social.
Em meio à busca por esse caminho, em 1947, no verão dos meus 19 anos, eu me encontrei com meu mestre, professor Josei Toda, numa reunião de palestra, realizada no bairro de Kamata. Sob a orientação dele, que havia lutado contra o militarismo e não se deixara sucumbir mesmo depois de dois anos de prisão, iniciei minha caminhada rumo à construção de uma nova sociedade de paz.
Depois de me casar e morar em uma casa alugada em Mita, no bairro vizinho de Meguro, minha esposa e eu moramos por três anos no condomínio Hideyama, em Sanno, bairro de Ota, perto da casa dos pais dela, e mais cerca de doze anos em Kobayashi [também em Ota]. Unindo nossas forças, percorremos a localidade ao máximo com o intuito de contribuir ao menos um pouco para o desenvolvimento da região.
Kan Shimozawa, escritor cujo pseudônimo é o nome de uma localidade do bairro de Ota, era amigo e conterrâneo do meu mestre. Na sua obra-prima Grande Caminho, publicada pela editora que Toda sensei administrava antes da guerra, Kan retrata a felicidade das pessoas comuns da localidade e a honrosa e nobre existência dedicada a qualquer custo à geração futura.
“Lutarei até o fim contra qualquer coisa / e não recuarei nem um passo até derrotá-lo”; “Não importa como seja pisado ou golpeado, / sempre me erguerei novamente. É preciso estar preparado / para se levantar ainda mais alto que da vez anterior” — são versos que tocam fundo no coração.
Tendo como ponto de partida o bairro de Ota, percorri Tóquio, Kansai e o Japão inteiro. Como editor de uma revista juvenil, eu ia buscar os originais de escritores e artistas que moravam em bairros vizinhos como Setagaya e Machida.
Em Toyoshima, onde fica o auditório do centro cívico em que meu mestre proferiu uma palestra sobre filosofia de vida; assim como em Arakawa, minha amada cidade das pessoas comuns; em Adachi, Sumida, centro repleto de simpatia e calor humano; em Shinjuku, Nakano, de profunda relação cármica — por todos os cantos existe a conexão de vida com amigos que estimo e confio.
“Não serei derrotada jamais!”
[Nota do Editor: O presidente Ikeda apresenta a figura de uma integrante da Divisão Feminina de Ota que está expandindo a rede solidária de felicidade sem se permitir ser abalado pelas repetidas dificuldades. Ele solicita que construamos com as próprias mãos nossa terra natal, principalmente porque estamos numa época em que a ligação com os vizinhos está cada vez mais enfraquecida.]
Uma mãe, preciosa amiga de minha esposa e moradora de Ota, perdeu todos os seus irmãos devido à guerra ou em decorrência de acidentes. E as provações da vida as assolaram seguidamente: a asma do pai, a doença do filho, as dificuldades financeiras, o falecimento do marido.
No entanto, tendo em seu coração a filosofia da esperança de que as pessoas eram capazes de evidenciar dentro de si a mais sublime e nobre condição de vida, rica e forte, ela superou e venceu a tudo, incentivando-se, segurando as mãos das companheiras e dizendo: “Eu serei feliz. Nós seremos felizes sem falta. Não serei derrotada jamais!”.
Essa mãe de Ota afirma: “Todas as pessoas têm problemas. Vendo somente por fora não é possível perceber. Mas quando conseguirmos dialogar com o coração aberto, entendemos que cada pessoa possui algo que a aflige. E ninguém está livre dos quatro sofrimentos — nascimento, envelhecimento, doença e morte”.
Ela sorri dizendo que é exatamente por isso que necessitamos de uma filosofia confiável e positiva, e que a ação de conversar com as pessoas da localidade no dia a dia e de se incentivarem mutuamente é o melhor porto seguro da felicidade.
Tóquio reúne pessoas do mundo inteiro e de todas as partes do Japão que deixaram sua terra natal para trás. De acordo com uma pesquisa, metade das famílias de 23 bairros de Tóquio vive isoladamente. O número de condomínios com travas automáticas tem aumentado cada vez mais e muitas vezes nem se sabe quem mora ao lado.
ReproduçãoFoto-RN176 Fotos tiradas pelo presidente Ikeda: Aeroporto Internacional de Tóquio (conhecido como Aeroporto de Haneda), o maior do Japão. Em outubro de 1960, o presidente Ikeda partiu desse aeroporto para sua primeira viagem ao exterior pela paz (ago. 1994)
As pessoas da sociedade atual são consideradas isoladas e independentes. Contudo, pode ser que a questão esteja mais ligada à diminuição da ação de criar, nutrir e manter laços do que à perda de vínculos sanguíneos ou de laços regionais.
A terra natal é algo que nós próprios devemos construir. Gostaria de fazer do lugar onde estou morando neste momento a nova terra natal, considerar as pessoas com quem crio laços afetivos como conterrâneas e expandir o círculo de amizade. Assim, a alegria se estenderá também nesse local. O primeiro passo é o cumprimento, criar coragem e tomar a iniciativa para conversar. Meus amigos e jovens que conheço também foram pioneiros nessa era, amando Tóquio e empreendendo esforços para contribuir em prol da localidade.
Como autêntico “filho de Tóquio”, estou disposto a me empenhar cada vez mais para saldar minhas dívidas de gratidão com essa minha terra natal.
Levante-se!
Eu também me levantarei
com alegria
junto com a família Tóquio
resplandecente como o sol.
Publicado no Seikyo Shimbun do dia 18 de fevereiro de 2021.
No topo: Ikeda sensei e sua esposa, Kaneko, visitam a terra natal de Ota (Centro Cultural Ikeda de Ota, dez. 1990)