ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 25/09/2021 08:01
Por Priscila Feitosa
COLUNISTA
Entenda se e quando alterações em contratos de trabalho podem ser feitas
Reprodução/Foto-RN176 Foto de ilustrativa da matéria de acordo trabalhista – Editora Brasil Seikyo – BSGI
Uma das máximas mais conhecidas no âmbito das relações trabalhistas é o princípio da inalterabilidade contratual lesiva ao trabalhador, a qual consiste numa diretriz basilar do contrato de trabalho que veda qualquer alteração nas condições do pacto laboral que enseje em prejuízo ao trabalhador, mesmo com seu consentimento.
Desde que foram criadas, as normas trabalhistas sempre foram firmes no sentido de assegurar a manutenção dos termos ajustados entre empregado e empregador quando da contratação, seja com relação ao salário, jornada de trabalho, local da prestação de serviços, concessão de benefícios adicionais como plano de saúde, cesta básica etc. A própria lei traz algumas possibilidades de alterações lícitas, mas muito restritas, tais como mudança do local da prestação de serviços com pagamento de adicional de 25% sobre o salário, mudança de horários, desde que não alterne turnos diurnos e noturnos, subtração do cargo de confiança e retorno ao posto de trabalho do contrato inicial, entre outros.
É muito comum surgirem dúvidas quando, ao longo do contrato de trabalho, o empregador concede benefícios adicionais aos que já são estabelecidos em leis, normas coletivas ou no contrato individual escrito. Esses benefícios adicionais, denominados liberalidades, são ofertados ao trabalhador voluntariamente pelo empregador, o que conduz à conclusão equivocada de que eles podem também ser subtraídos a qualquer tempo. Contudo, ao contrário do que muitos pensam, mesmo as concessões voluntárias do empregador se incorporam ao contrato de trabalho, ou seja, não podem ser mais destacadas do patrimônio do empregado, sob pena de gerar uma alteração contratual prejudicial. Exemplos claros e bem comuns são a concessão voluntária de plano de saúde, a cesta básica e o 14º salário que, não raro, nos períodos de dificuldade financeira da empresa, se convertem em benefícios ameaçados, pois são vistos pelos empregadores como “bônus”, quando, na realidade, uma vez concedidos, passam a ser permanentes e obrigatórios.
Possibilidades de alterações
Reprodução/Foto-RN176 Priscila Feitosa, Advogada, pesquisadora em direito humanos e pós-graduada em direito previdenciário e processo do trabalho – Editorial Brasil Seikyo – BSGI
Com o advento da reforma trabalhista, vigente desde novembro de 2017, muitas dúvidas surgiram sobre a possibilidade de conferir validade ao acordo firmado entre empregado e empregador nesses casos de alterações prejudiciais. Contudo, o texto de lei continuou com a vedação expressa de tais mudanças, deixando claro o legislador, no artigo 468, da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que Nos contratos individuais de trabalho só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia.
Desse modo, está muito evidente no texto de lei que as alterações no contrato de trabalho, de modo geral, só são permitidas se forem combinadas entre empregado e empregador e, ainda, se não resultarem prejuízo ao trabalhador. É claro que infinitas situações podem surgir ao longo do tempo, com grandes alterações na dinâmica da empresa e da prestação de serviços, a exemplo do que ocorreu desde o início da pandemia da Covid-19, que, de forma abrupta, mudou muitos contratos de trabalho. Mesmo nessa situação, é importante o uso do bom senso na aferição do que é ou não passível de alteração, como a redução da jornada de trabalho com a redução de salário para professores que geralmente têm suas remunerações vinculadas ao número de turmas para as quais leciona. Nesse caso, com a devida comprovação da subtração de alunos na instituição de ensino, é plenamente lícita a redução de salário com a redução de horas de trabalho.
Em linhas gerais, pode-se dizer que permanecem em pleno vigor as normas protetivas que impedem mudanças no contrato de trabalho que sejam prejudiciais ao trabalhador. Contudo, sempre se faz necessária também a busca de um equilíbrio entre os interesses e as necessidades de empregado e empregador, pois a experiência também revela que o engessamento absoluto gera prejuízo para ambas as partes, de modo que doses de equilíbrio e sensatez sempre são bem-vindas na solução de conflitos decorrentes da necessidade de alterações das condições originalmente contratadas.