ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 18/12/2021 10:48
CADERNO DE ESTUDO
Reprodução/Foto-RN176 Foto de ilustração da matéria – Editorial do Brasil Seikyo – BSGI
Trecho do Gosho
“Recebi cem bolinhos de arroz cozidos a vapor e uma cesta de frutas. O dia de Ano-Novo representa o primeiro dia, o primeiro mês, o começo do ano e o início da primavera.1 A pessoa que celebra esse dia acumulará virtudes e será amada por todos, assim como a Lua vai aumentando de tamanho à medida que se move do oeste para o leste,2 e assim como o Sol brilha mais intensamente enquanto se desloca do leste para o oeste.
Em primeiro lugar, sobre a questão de onde exatamente se encontram o inferno e o buda, um sutra diz que o inferno está abaixo da terra, e outro afirma que o buda reside no oeste. No entanto, um exame mais cuidadoso revela que ambos existem em nosso corpo de um metro e meio de altura. Isso deve ser verdade, pois o inferno está no coração da pessoa que, em seu íntimo, despreza seu pai e ignora sua mãe.”3
Cenário histórico
O escrito Carta de Ano Novo foi endereçado a uma discípula, a esposa de Omosu, que enviou cem bolinhos de arroz cozidos a vapor a Daishonin e uma cesta de frutas comemorativa do Ano-Novo.
A esposa de Omosu era a irmã mais velha de Nanjo Tokimitsu, e tinha perdido sua amada filha, acometida de uma doença, em 1278. Essa filha havia enviado várias cartas a Nichiren Daishonin. Antes de morrer, ela escreveu para ele dizendo que provavelmente seria sua última carta e expressou seu estado de espírito sereno enquanto enfrentava a morte.4
Embora não conste a data, presume-se que Carta de Ano Novo tenha sido escrita em 1281, um ano antes do falecimento de Daishonin.
Com certeza, a esposa de Omosu recebia cada novo ano com a determinação de permanecer firme em sua prática budista como discípula de Nichiren Daishonin, não somente para seu próprio bem, mas também em nome da filha que havia partido. Como o ano novo se aproximava, ela deve ter renovado sua decisão enviando esses oferecimentos a Daishonin. Ele, por sua vez, louva de todo o coração a sinceridade e vibrante determinação de sua discípula.
Explanação
Fazendo oferecimentos ao Sutra do Lótus com toda a sinceridade
No início desta carta, Nichiren Daishonin reforça a importância da sinceridade de se fazer oferecimentos ao Sutra do Lótus no início do ano novo, ressaltando quanto esse comportamento é nobre. Ele compara esse sincero coração às flores de cerejeira que brotam das árvores, ao lótus que desabrocha no meio da água lamacenta, às folhas de sândalo que se espalham nas Montanhas de Neve, ou à lua que começa a se erguer.5 As palavras utilizadas por Daishonin nessas analogias são todas cheias de vida, tais como “brotar”, “desabrochar”, “erguer”, “espalhar”.
O primeiro dia do ano novo é um dia de começos. Todos podem recomeçar com nova e revigorante determinação. É uma excelente oportunidade para despertarmos para o espírito budista da “verdadeira causa”6 — o espírito de sempre avançar a partir do presente momento. Quando agimos assim, nossa vida certamente transbordará de incontida alegria.
Nichiren Daishonin afirma que uma pessoa que comemora esse dia, com base na Lei Mística, acumulará constantemente virtude e benefício e será amada por todos, assim como a lua cresce gradualmente, ficando mais cheia, e o sol brilha ainda com mais intensidade à medida que sobe mais alto no céu.7
Daishonin imprimiu um profundo significado ao ideograma chinês hajime — que pode significar “em primeiro lugar”, “começo” ou “início”. Por exemplo, no escrito Os Benefícios do Sutra do Lótus, Daishonin escreve: “Em toda esta nação japonesa, sou a única pessoa que recita o Nam-myoho-renge-kyo. Sou como a única partícula de pó que marca o início do Monte Sumeru8 ou como a única gota de orvalho que dá origem ao grande oceano”.9
O inferno e o buda existem dentro de nós
Nichiren Daishonin deve ter considerado o espírito sincero da esposa de Omosu — seus esforços para apoiá-lo e continuar lutando com base na fé — incrivelmente nobre e belo.
Ele lhe assegura que o buda não pode ser encontrado em algum lugar distante, mas dentro do próprio coração. E explica a essência fundamental da vida, a “possessão mútua dos dez mundos”10 de forma acessível no trecho seguinte.
Para ilustrar seu ponto de vista, Daishonin escolhe como exemplos os estados de inferno e de buda, os dois extremos dos dez mundos. Essas condições de vida, que aos nossos olhos de mortais comuns parecem as mais distantes da realidade cotidiana, estão, na verdade, presentes em nosso coração. Da ótica dos ensinamentos que eram amplamente difundidos a respeito de inferno e buda naquela época, essa foi uma mudança radical.
Nesse escrito, Daishonin afirma claramente que inferno e buda estão aqui, no “nosso corpo de um metro e meio de altura” e “no coração da pessoa”.11 Em primeiro lugar, usando a palavra “nosso”, Daishonin indica que esses estados estão dentro de todos nós, inclusive dele próprio, sem qualquer distinção ou discriminação. Em segundo, o estado de inferno e o estado de buda não estão distantes de nós. Eles existem em nossa vida, na vida de pessoas reais aqui e agora.
Ao explicar a “possessão mútua dos dez mundos”, Daishonin primeiro dá um exemplo de como o estado de inferno é um potencial dentro da própria vida, descrevendo-o, por exemplo, como o “coração da pessoa que, no seu íntimo, despreza seu pai e ignora sua mãe”.12
O auspicioso descortinar do “Ano dos Jovens e do Progresso Dinâmico” é um momento propício para renovarmos as nossas decisões junto com o Mestre. No prefácio da nova edição de Nichiren Daishonin Gosho Zenshu (Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin), Ikeda sensei declara:
O Gosho exalta a igualdade de todos os seres vivos, elucida a filosofia da coexistência e da harmonia e a filosofia da tolerância e da compaixão. Não é exagero afirmar que o Gosho é o tesouro imortal capaz de extrair a “sabedoria que opera de acordo com as mudanças das circunstâncias” (zuien-shinnyo-no-chi) no desafio dos problemas globais, tais como guerras, epidemias, miséria, desastres naturais, mudança climática, entre outros, e elevar e unir toda a humanidade. Desejo, do fundo do coração, que os preciosos amigos emergidos da terra avancem bailando alegremente pela jornada da unicidade de mestre e discípulo do juramento seigan pelos “dez mil anos e mais, por toda a eternidade”, rumo à pacificação da terra e do mundo por meio do estabelecimento do ensinamento.13
Notas:
- De acordo com o calendário lunar japonês, a primavera começa com o primeiro mês, isto é, por esse sistema oficial se inicia o ano novo. Pelo calendário gregoriano, essa data corresponde a algum dia entre 21 de janeiro e 19 de fevereiro.
- Refere-se ao fato de que a lua nova é vista pela primeira vez a oeste logo após o pôr do sol. Nas noites que se seguem, como a lua cresce mais cheia, parece ter se movido um pouco mais para leste.
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II, p. 405, 2018.
- Cf. Ibidem, p. 166.
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II, p. 405, 2018.
- “Verdadeira causa”: Também chamada de princípio místico da “verdadeira causa”. O Budismo de Nichiren Daishonin expõe diretamente a verdadeira causa para a iluminação, como o Nam-myoho-renge-kyo, que é a lei da vida e do universo. Ele ensina uma forma de prática budista de sempre avançar a partir deste momento e superar todos os problemas e dificuldades com base nesta lei fundamental.
- Cf.Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II, p. 405, 2018.
- Monte Sumeru: Na antiga cosmologia indiana, montanha que se ergue do centro do mundo.
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. I, v. 703, 2014.
- “Possessão mútua dos dez mundos”: Segundo esse princípio, cada um dos dez mundos possui o potencial inerente a todos os dez. “Possessão mútua” significa que a vida não se fixa a um ou outro dos dez mundos, mas pode manifestar qualquer um dos dez — do estado de inferno ao estado de buda — a qualquer momento. O ponto fundamental desse princípio é que todos os seres, em qualquer um dos nove mundos, possuem a natureza de buda. Assim, cada pessoa tem o potencial para manifestar o estado de buda, da mesma forma que um buda também possui os nove mundos, não sendo, portanto, separado ou diferente das pessoas comuns.
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II, p. 405, 2018.
- Ibidem.
- NOTÍCIAS. BS+, 24 nov. 2021. Disponível em: https://www.brasilseikyo.com.br/central-de-noticias/noticia/999560002. Acesso em: 1º dez. 2021.