O mar está para os corajosos

ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO  03/03/2022 17:42

RELATO

Janne desafia as ondas bravias do carma e transforma a vida

Reprodução/Foto-RN176 Janne Pereira Sousa, Responsável pela DF da Área Mangueirão, RM Augusto Montenegro, Sub. Amazônia Oriental, CRE Oeste – Editora Brasil Seikyo – BSGI

Sempre me questionei sobre a existência de um deus que determinava a felicidade ou a infelicidade das pessoas. E acreditava que deveria haver algo místico e buscava conhecimento sobre o assunto.

Em 1987, minha mãe já participava dos encontros da Soka Gakkai aqui em Belém, PA, sem que soubéssemos. Um dia, ela reuniu a família para falar que teríamos em casa o Gohonzon (objeto de devoção dos praticantes budistas) e que seria para nossa felicidade. No dia da consagração, os líderes da regional falaram da grandiosidade da Lei Mística e do Gohonzon, bem como da infalível lei de causa e efeito. Meus olhos brilhavam ao ouvir aquelas palavras.

Reprodução/Foto-RN176 Janne em seu ambiente de trabalho – Editora Brasil Seikyo – BSGI

Isso porque eu já era mãe, aos 20 anos, do Iury, de 2 anos, e estava num relacionamento que nunca tinha bons momentos. Participava das atividades às escondidas, mas ele descobriu e me proibiu, dizendo ser coisa de aproveitadores. Então, resolvi testar o poder do daimoku, a recitação do Nam-myoho-renge-kyo, para que ele aceitasse ir a uma reunião. E acordamos: ele participaria e, se percebesse que não era coisa boa, não mais iria. Ele concordou.

Fiquei em casa fazendo daimoku, para que ele retornasse decidido a praticar. E assim aconteceu: ele recebeu o Gohonzon, sendo meu primeiro shakubuku (pessoa a quem apresentamos o budismo). Uma grande alegria, pois, além do meu pai, dos meus irmãos e de mim, agora ele pertencia à família Soka.

No ano seguinte, adotamos uma menina, Nádla, e fui recebendo funções dentro da organização, com muita gratidão. Em 1994, esse com­panheiro foi trabalhar no Japão, as crianças e eu ficamos na casa de minha mãe e nos mantendo com o dinheiro enviado por ele. Não media esforços para levar meus filhos aos ensaios das bandas Taiyo Ongakutai e Asas da Paz Kotekitai, da Divisão dos Jovens (DJ) da BSGI. Porém, o relacionamento não resistiu à distância e às constantes brigas. Depois de onze anos transcorridos, houve o término de uma relação de quase vinte anos.

Entrei em depressão, sentia como se estivesse num poço liso e não conseguisse subir. Sofri também ameaças da família do meu ex-companheiro, a ponto de entregar a casa que construímos juntos. Fazia daimoku chorando na frente do Gohonzon, mas, quando me encontrava com os membros, sentia-me fortalecida. Esse é o maravilhoso ambiente das reuniões Soka.

Reprodução/Foto-RN176 Saindo para visitas junto com a mãe Eunice e a filha Nádla (foto tirada antes da pandemia da Covid-19) – Editora Brasil Seikyo – BSGI

Fé e foco

Uma voz interna foi ficando cada vez mais forte: precisava rea­gir. Assim, busquei forças nas orientações do sensei, e foi numa das cartas de Nichiren Daishonin, Um Barco para Atravessar o Mar dos Sofrimentos, explanada pelo Mestre, que li: “Quanto piores forem as adversidades que recaírem sobre o devoto [do Sutra do Lótus], maior será a alegria que ele sentirá devido à forte fé”.1 Queria manifestar essa alegria!

Então, decidi mudar radicalmente por meio de um trabalho que me proporcionasse construir tudo novamente, e rápido. Nessa época, iniciaram os preparativos para os 39 anos de budismo na Amazônia, e eu faria parte, por isso desafiei a recitação de muito daimoku.

O ano 2009 chegou e, em paralelo, fiz um curso de cozinheiro no Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (Senac) e passei a ouvir sobre trabalhar em navios. Tirei minha carteira de marítimo mercante. Meus filhos participaram alegremente da Convenção dos Jovens da BSGI, no dia 3 de maio desse ano, em São Paulo, e, por intermédio de um amigo praticante, consegui enviar currículo para a Transpetro.

Celebramos os 39 anos do budismo Soka na Amazônia em novembro, e eu ainda estava sem sinal de trabalho, mas firme no daimoku. No dia 20 de dezembro, recebi uma ligação solicitando a minha documentação para embarcar. Eu, que mal conhecia meu estado, conheci várias partes do Brasil e países que via apenas no mapa, como Singapura, China, Japão, Chile, França. Em 2012, minha filha, que já era responsável pela Divisão Feminina de Jovens (DFJ) de área, participou de um curso de aprimoramento no Japão. E com os dólares que conquistei na minha segunda viagem à China, ela pôde ir tranquilamente. Consegui custear também a faculdade tanto da Nádla como a do Iury.

Além do mais, conquistei o que tinha perdido: a “minha dignidade”. Por tantos benefícios, meu Kofu é pura gratidão e nunca deixei de assinar os periódicos, agora reunidos no BS+.

Reprodução/Foto-RN176 Família reunida, Janne, sentada, segunda à esq., ladeada pela filha. Atrás, de pé, terceiro da esq. para a dir., o marido Alan, com o filho Iury ao lado. (fotos tiradas antes da pandemia da Covid-19) – Editora Brasil Seikyo – BSGI

E o coração? Depois de vinte anos sozinha, decidi ter alguém com uma prática igual ou melhor que a minha. Há oito anos, reencontrei um companheiro da área onde eu atuava; e para ter certeza dessa união, resolvemos recitar três horas de daimoku cada um até o dia do nosso encontro, e para que nossas famílias também aceitassem. Passaram-se três meses, reunimos as famílias e nos casamos no budismo e no civil. Hoje, tenho um companheiro maravilhoso, Lauro Alan, e atuamos juntos na Área Mangueirão.

Quero agradecer à minha família, sempre comigo; à Divisão Feminina, tão presente também; e principalmente a Ikeda sensei, por ter trazido este budismo para o Brasil. Olho para trás e vejo aquela mãe jovem e assustada com o futuro. Agora, estou plenamente feliz, comprovando os benefícios de 33 anos de prática budista, ciente de que nunca estamos livres dos problemas, mas estarei sempre segura ao leme da prática da fé. A vitória é certa!

Muito obrigada, sensei!

Janne Pereira Sousa, 53 anos. Marítima, chef de cozinha. Responsável pela DF da Área Mangueirão, RM Augusto Montenegro, Sub. Amazônia Oriental, CRE Oeste.

Nota:

  1. Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. I, p. 33, 2020.