Como ajudar um amigo ou parente que sofre com depressão

ROTANEWS176 E POR CORREIO BRASILIENSE 25/09/2022 08:37                                                                        Por Leticia Mouhamad

Lidar com o adoecimento mental é um desafio diário para muitos, inclusive para as pessoas ao redor, que se sentem perdidas quando o assunto é assistir corretamente o sofrimento do outro

 

Reprodução/Foto-RN176 (crédito: kleber sales)

Quando Luísa*, 26 anos, recebeu a notícia do suicídio de um amigo de longa data, seu mundo desmoronou. “Sabe aquelas situações que jamais imaginamos passar? Foi a primeira reflexão que tive. Era inacreditável.” Mas aconteceu. E, como em todo processo de luto, houve dor e, mais ainda, culpa, mesmo que, com o tempo, aprendesse a olhar a situação por outro ângulo.

Sua saúde emocional, que há meses não estava bem — “rotina puxada, né? O cansaço andava ao meu lado, fielmente” —, ruiu de vez. Foram muitas as noites mal dormidas, os pensamentos negativos e a sensação de estar vivendo no automático, tanto que pouco se lembra do que experienciou nesse período. Na consulta ao psiquiatra, veio o diagnóstico: depressão.

Para ela, essa palavra era tão pesada quanto a necessidade de cumprir tarefas cotidianas. Tudo era muito difícil. Da terapeuta, porém, veio o afago: “Vá com calma e viva um dia de cada vez, a passos de formiguinha”. Assim, a cada pequena demanda cumprida, enchia-se de satisfação. A terapia aliada à medicação formaram uma dupla dinâmica, mas que sem um terceiro elemento não seriam tão eficazes.

Tratava-se da sua rede de apoio, que incluía a família, o namorado e os amigos próximos. “Sem eles, sinto que não teria segurado a barra.” Conversar sobre suas inseguranças, compartilhar experiências e permitir-se ser cuidada foi fundamental, visto que o que mais temia era se sentir sozinha. Além disso, a jovem considera ter tido sorte por não receber julgamentos dessas pessoas, que jamais invalidaram seu sofrimento.

“Crescer em uma casa relativamente aberta a assuntos ligados à saúde mental evitou acontecimentos desagradáveis, como olhares de pena e comentários inconvenientes. Sei que não é assim com todos. Já conheci pessoas que tiveram sua condição agravada devido à falta de apoio e de compreensão dos pais”, recorda-se. Por isso, informar-se sobre o assunto é tão importante, seja para amparar alguém, seja para identificar traços do problema em si e procurar ajuda.

Conhecendo o transtorno

Para Verônica Teles, psicóloga com formação em terapia cognitivo-comportamental, não é incomum ouvir as pessoas se referirem a si mesmas, quando estão tristes, como “deprimidas”. Embora o termo seja bastante usado no senso comum, há muitas diferenças entre ambos.

A depressão é uma condição grave de saúde e de adoecimento mental, que depende de fatores genéticos, psicológicos e ambientais para se originar. Já a tristeza é um sentimento passageiro, que costuma aparecer como consequência de fatores adversos da vida — términos de relacionamentos ou a perda de um emprego, por exemplo.

Alguns traços de depressão são: mudanças no apetite, que resultam em perdas ou ganhos de peso não relacionados a dietas; insônia ou excesso de sono; perda de energia ou aumento de fadiga; inquietação, irritabilidade ou lentidão psicomotora; sentimentos de inutilidade ou de culpa inapropriada; dificuldade de pensar ou de se concentrar; indecisão; e, por vezes, pensamentos de morte e/ou suicídio ou tentativas de suicídio.

“É importante entender a diferença entre ambos para não tratar uma pessoa deprimida como alguém que só está triste e precisa se animar. E, também, para reconhecer quando é preciso buscar ajuda”, alerta Verônica. Vale lembrar que apenas profissionais da saúde mental, como psicólogos e psiquiatras, podem diagnosticar transtornos mentais. Na dúvida, procure um profissional.

Afinal, como assistir quem sofre com a doença?

Informar-se sobre o transtorno e entender como o tratamento funciona já é meio caminho andado, em especial para não criar expectativas irreais e prejudicar o quadro. Ademais, ouvir sem julgamento também é um ponto importante. “Esteja aberto, mesmo sem concordar, pois a pessoa em sofrimento já possui uma autocrítica muito grande e não precisa de mais julgamentos”, explica a psicóloga.

Se puder, ajude ativamente, dado que pessoas deprimidas normalmente negam possíveis ajudas. Então, colocar-se à disposição é uma boa alternativa. Caso se sinta sobrecarregado e sem saber como agir, ao conviver com alguém nesta condição, também busque auxílio. Lembre-se que é preciso estar bem para ajudar aos outros.

Hábitos aliados à nossa saúde emocional

  • Cuide da saúde física, praticando exercícios;
    • Mantenha uma boa alimentação;
    • Estabeleça objetivos, pois viver com um propósito gera satisfação;
    • Priorize seu sono;
    • Preserve boas relações e seja empático;
    • Busque autoconhecimento e, ao perceber que existem dificuldades em lidar com certas emoções e frustrações, não deixe de procurar ajuda profissional.

Busque ajuda

Se você estiver com sérios problemas e chegar a considerar o suicídio, pode procurar ajuda entrando em contato com o Centro de Valorização à Vida (CVV). Tratase de um projeto que fornece apoio emocional e prevenção do suicídio.

Por meio de telefone (188)e-mail e chat 24 horas, todos os dias da semana, eles atendem de forma voluntária e gratuita todos que precisam conversar. O serviço é totalmente sigiloso: cvv.org.br

E o que não fazer?

“A depressão é uma doença que afeta o cérebro, não é capricho ou uma frescura.” Assim pontua a psiquiatra clínica Clarice Araujo, dando vestígios do que não fazer ou dizer a alguém que sofre com o problema. Para ela, tentar incentivar a pessoa a reagir e lutar contra a depressão sem um tratamento adequado pode ser danoso e gerar apenas frustração.

Além disso, frases como “você tem que se esforçar mais para melhorar” ou “é preciso pensar positivo” apenas reforçam a falta de empatia e podem gerar sentimentos de culpa. Como um dos sintomas da depressão é a falta de energia mental e física, quem está doente já tenta realizar as atividades da rotina e, muitas vezes, não consegue, não por preguiça, mas por uma questão biológica.

Cabe ressaltar que alguns quadros depressivos apresentam variações de humor ao longo do dia e, por isso, verbalizar que o indivíduo “não parece deprimido” também é inadequado, visto que não é necessário estar em completo sofrimento para conviver com o transtorno.

Atenção aos sinais que podem indicar uma possível ideação suicida: vontade de sumir, desejo de morrer, pensamento ou planejamento de se matar. Há quem organize as finanças ou compre algum objeto letal. “Essas atitudes costumam refletir o desespero, a dificuldade em acreditar no futuro e a sensação de falta de saída. Muitos expressam seus pensamentos e é importante levá-los a sério”, orienta Clarice.

Não adianta falar “deixa disso” ou “mas a vida é tão boa”. O problema é mais profundo. Pessoalmente, é essencial demonstrar apoio emocional e verificar se a pessoa está em condições seguras, protegida, sem alcance a armas ou a meios para a autolesão. Caso o ambiente não ofereça segurança, o psiquiatra pode indicar uma internação, uma vez que o tratamento psiquiátrico requer, geralmente, um prazo longo para fazer efeito.

*Nome fictício a pedido da personagem

*Estagiária sob a supervisão de Sibele Negromonte