ROTANEWS176 E BBC BRASIL31/05/2016 16:29
AMÉRICA LATINA
Caso que chocou a Bolívia só veio à tona após denúncia do hospital; situação se repete na América Latina, diz organização
Reprodução/Foto-RN176 Hospital teve papel fundamental em tornar público o caso de estupro e abuso contra a menor-Divulgação
Vania C., de 13 anos, chegou a acreditar que Elías V. era seu marido, e agora descobriu ter sido vítima de múltiplos estupros. Segundo ela, o homem de 32 anos que a engravidou contra sua vontade era alguém que ajudava sua família (ela e os pais) a enfrentar graves dificuldades econômicas.
Por isso Vania nunca denunciou os abusos. Seus pais, de acordo com a polícia boliviana, aceitaram Elias como “genro” e entregaram a filha grávida a ele. O caso não teria vindo à tona se não fosse a ação do hospital em Santa Cruz de la Sierra onde a menina deu à luz, que denunciou a história à polícia. Denúncia que agora motivou um processo judicial por “estupro qualificado contra criança”.
Presentes
O diretor da Força de Luta contra a Violência da polícia boliviana, Gonzalo Medina, disse à BBC Mundo, o serviço em espanhol da BBC, que Elias se aproximou de Vania por meio de presentes.
“O estuprador conquista a menina com roupa e outras gentilezas. Os pais também recebem presentes e alimentos. E assim o aceitam como genro”, disse. Deste modo, Elias conseguiu não apenas ter relações sexuais sem consentimento com a menina de 13 anos, mas a levou para viver como sua mulher.
“Os pais não veem isso como crime. Inclusive pensam que é uma situação de sorte”, afirmou Medina. Segundo os registros policiais do caso, a condição econômica de Vania e dos pais foi um dos elementos usados por Elias para se aproveitar da situação.
A família de Vania vem de uma comunidade rural que migrou em condições precárias para Santa Cruz, uma das maiores cidades da Bolívia.
“O salvador”
De acordo com Miriam Suárez, diretora da organização boliviana de auxílio legal e psicológico Casa da Mulher, casos como o de Vania se repetem “com muita frequência” com meninas desde os 10 anos.
“As meninas estão muito expostas e não apenas por condições econômicas, mas pela violência nas casas e pela decomposição das famílias. Por isso fogem, e é quando acreditam ter encontrado um ‘salvador'”, afirma.
A última pessoa que pode ser responsabilizada nesses casos, afirma Suárez, é a menina. “São esses ‘salvadores’ que se aproveitam da pobreza e da desproteção. A menina nunca é culpada, é praticamente obrigada a se expor a abusos.”
Ela acrescentou que, como no caso de Vania, muitas vezes os pais são cúmplices porque consentem com estupros e outros abusos. São situações, afirma, que não geram apenas convivência forçada e estupros, mas servidão e abusos físicos. “É um problema que conhecemos em vários pontos da Bolívia, mas também ocorre no resto da América Latina”, diz Suárez.
Reprodução/Foto-RN176 Pai da garota também responderá no processo por estupro qualificado que tramita contra agressor BBC (arquivo)
Liberdade
Elias V. foi preso logo que o caso veio a público. Contudo, horas depois, no último dia 27 de maio, ele foi posto em liberdade. Ele usou o argumento que formava um “casal” com a menina e apelou aos “usos e costumes” da Bolívia.
Mas a polícia diz que ele não está livre das acusações. O pai de Vania também responderá no processo por estupro qualificado que tramita contra o agressor.
Enquanto isso, Vania permanece com seu bebê no hospital em que deu à luz. Aos 13 anos, ela já tem outra vida sob sua responsabilidade.