ROTANEWS176 E UOL 31/03/2016 06h00
Reprodução/Foto-RN176 Foto ilustrativa
Se sobrasse apenas um casal na Terra, ele seria capaz de povoá-la? Se você já se fez essa pergunta, não é o único. Cientistas de diversas épocas já questionaram o assunto, que permanece controverso, pois, obviamente, não será possível fazer a experiência na prática.
O pesquisador de genética de populações da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Waldir Stefano, acredita que é possível, mas lembra que a primeira condição para que isso ocorra é que o casal seja fértil. “É possível, mas não é fácil”, ressalta.
Isso porque o casal teria pouca variabilidade genética, o que está relacionado com diversos problemas. Um estudo feito com crianças nascidas na Tchecoslováquia entre 1933 e 1970 mostrou que quase 40% daquelas cujos pais eram parentes de primeiro-grau tinham graves deficiências –14% morreram por conta de alguma delas.
Segundo Stefano, com o passar do tempo, essa variabilidade aumentaria, mas tudo depende de para que lado iria o processo de seleção natural. Ele explica que ao longo dos anos, mutações ocorrem no DNA dos descendentes e, caso as mutações vantajosas para a sobrevivência prevaleçam, a chance de povoar o planeta novamente é grande.
Existem exemplos de colonização com pequenas populações iniciais, como a do Havaí, em que havia muita consanguinidade e foi bem-sucedida
Waldir Stefano, professor de genética
E quando há problemas?
No entanto, as mutações que aparecem podem trazer desvantagens para os indivíduos. Há casos, como algumas famílias reais europeias, em que as mutações desvantajosas chegaram a causar esterilidade nos descendentes.
Stefano cita o livro “As Sete Filhas de Eva”, escrito por Bryan Sykes, professor de genética da Universidade de Oxford. “A obra mostra o estudo do DNA mitocondrial, que é herdado da mãe. Os pesquisadores chegam a sete grandes matrizes de ascendentes na Rússia”, diz. “Antes dessas sete, provavelmente havia menos ainda”.
Ele explica que, como o gameta feminino (óvulo) é muito maior que o gameta masculino (espermatozoide), quando o zigoto é formado, as mitocôndrias (responsável por “fabricar” a energia das células) são iguais às da mãe. O professor lembra que há doenças transmitidas geneticamente pelas mitocôndrias, como a doença de Leber, que provoca cegueira entre os 40 e 50 anos.
Quanto tempo seria necessário
Na grande parte das vezes, as variações do material genético não trazem grande efeito no fenótipo (características visíveis, como cor dos cabelos e dos olhos) e não são percebidas de imediato. Se trouxerem vantagens maiores para a sobrevivência dos descendentes, serão passadas adiante. “A grande questão é em que período de tempo isso poderia acontecer”, disse referindo-se a quantos anos seriam necessários para que os descendentes de um casal gerassem uma população de 7 bilhões de pessoas.
Em 2002, o antropólogo John Moore publicou um estudo pela Nasa em que estima que seriam necessárias 160 pessoas para dar início a uma população estável para um novo planeta. O estudo partiu do modelo de pequenos grupos migratórios antigos da humanidade.
Ele recomendava começar com casais jovens sem filhos e sem genes recessivos perigosos. No caso, o número usado no cálculo vale para uma viagem no espaço permite 200 anos de isolamento antes da volta à Terra, quando as pessoas teriam novamente contato com maior variabilidade genética.
Stefano lembra ainda que o próprio Charles Darwin, no livro ‘A Origem das Espécies’, brincou com uma conta parecida à de Adão e Eva. Se nada causasse a morte de um casal de elefantes enquanto eles vivessem, quantos descendentes eles teriam em 700 milhões de anos? Além disso, os descendentes também não poderiam morrer logo, ou seja, trata-se de uma conta bem hipotética. A gestação de um elefante dura dois anos e a expectativa de vida desses animais é de cem anos. Assim, Darwin calculou 19 mil descendentes daquele casal no período de tempo avaliado.