Cada dia é o “16 de Março”!

ROTANEWS176 09/03/2024 09:00                                                                                                                          ESPECIAL DIRETO DA REDAÇÃO DO JORNAL SEIKYO PRESS

A cerimônia realizada em 1958 representa a passagem do bastão espiritual do mestre para os jovens discípulos que assumem o protagonismo da concretização do kosen-rufu

Reprodução/Foto-RN176 Em primeiro plano, jovem Daisaku Ikeda, à esq., ao lado do seu mestre, Josei Toda, em atividade realizada em Shizuoka, Japão (mar. 1958) – Foto: Seikyo Press

No início de 1958, o segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, tinha a saúde debilitada, inspirando cuidados médicos constantes. Mesmo assim, ele se empenhou com o forte desejo de realizar uma cerimônia que servisse como prelúdio do kosen-rufu, um preparativo para o futuro. Ele sabia que não mais teria condições para liderar o intenso movimento pela paz e, portanto, necessitava treinar os jovens com o intuito de fortalecê-los como seus sucessores na grande batalha humanística.

O momento certo se apresentou quando o primeiro-ministro do Japão, após alguns encontros com o presidente Josei Toda, manifestou o desejo de visitar o templo principal ao participar da peregrinação de 200 mil membros, que seria realizada pela Soka Gakkai. A data: 16 de março.

A cerimônia do Dia 16 de Março foi decidida no dia 8 daquele mês, e a convocação para os participantes, feita três dias depois. Para o jovem Daisaku Ikeda, a cerimônia era um teste. Além de cuidar dos detalhes, estava à frente do movimento de peregrinação diária de 7 mil membros durante todo o mês.

Para a viabilização da atividade, era preciso verificar o transporte, a comunicação rápida para os 6 mil jovens convocados, a organização da reunião e os acertos da recepção do primeiro-ministro e comitiva.

No dia a dia, o jovem Ikeda trabalhava pela manhã em Tóquio, viajava 130 quilômetros para se apresentar ao presidente Josei Toda e retornava à noite, viajando no trem noturno. Ele ainda respondia ao processo judicial do Incidente de Osaka sob a falsa acusação de violação da lei eleitoral. Devido à árdua rotina, o jovem estava exausto e todos ficaram receosos, pois achavam que ele poderia tombar a qualquer momento.

Em seu coração, no entanto, ardia o desejo de corresponder ao mestre. Assim, usava todas as forças para seguir com os companheiros, adotando uma atitude destemida capaz de transformar o ambiente, contagiando a todos.

A chegada dos jovens

A chuva gelada havia parado de cair na noite anterior à realização da cerimônia. Porém, pela manhã, havia nuvens e o frio ainda era intenso.

Milhares de jovens de Tóquio, de Kansai e de diversas outras localidades do Japão chegaram no meio da madrugada. Cada grupo era recebido calorosamente pelos demais, o que aquecia o coração dos participantes.

Naquela manhã gelada, os jovens saborearam uma sopa de leitão, denominada tonjiru, preparada para eles. Havia quem experimentasse esse prato pela primeira vez. Enfim, todos compreenderam a solicitação de trazer tigela e hashi.1 Aquecidos pelo gesto carinhoso do presidente Josei Toda, os jovens trocavam abraços, aperto de mão, conversavam e sorriam juntos. Era uma alegre visão do triunfo futuro.

Reprodução/Foto-RN176 O desafio de preparar a sopa de leitão. Os jovens se emocionaram com o sentimento do mestre. No entanto, não imaginavam o significado por trás do preparo daquela sopa. Antes de definir a programação da atividade, o presidente Josei Toda tomou uma série de providências, visando ao bem-estar de todos. A primeira delas foi oferecer uma sopa de leitão. Alguém havia sugerido bolinhos de arroz. Porém, Toda sensei, citando uma obra chinesa sobre a estratégia dos generais, disse: “O necessário para os jovens que chegarão de madrugada é algo quente”. Mesmo com o corpo fragilizado por causa do processo de cura da doença, o presidente Josei Toda se empenhou para tomar todas as providências e conseguir os ingredientes para a sopa. A cozinha foi montada ao lado do prédio no qual ele liderava as atividades. Assim, acompanhou os detalhes do preparo – Foto: Seikyo Press
Cancelamento da visita do primeiro-ministro

Às 8 horas da manhã do dia 16 de março, 6 mil jovens se reuniram em dois grandes blocos, formando um corredor. Todos estavam prontos para receber instruções relativas à visita do primeiro-ministro japonês, que participaria da cerimônia.

Daisaku Ikeda e os líderes da Divisão dos Jovens (DJ) foram ao encontro de Toda sensei nos aposentos dele no templo principal. Instantes depois, o telefone toca; era o primeiro-ministro. Dentro do quarto, eles ouviram a voz vigorosa do presidente Josei Toda: “O que quer dizer com não poderá vir? Entende o que significa quebrar uma promessa? Seis mil jovens estão aguardando a sua vinda. São jovens de coração puro! Vai enganá-los?”. O primeiro-ministro disse que havia um problema diplomático e, por essa razão, não poderia ir, desculpando-se pela ausência.

Furioso, Josei Toda respondeu: “Não estou dizendo para pedir desculpas a mim. Deve se desculpar com os jovens! Como ficará a sincera dedicação deles, que se prepararam para se encontrar com o senhor?”.2

Durante a ligação, uma pessoa do templo, sem verificar se estavam usando o telefone, virou a chave que intercambiava a linha telefônica entre o lado do templo e o do prédio onde estava o presidente Josei Toda. Só existia uma linha telefônica que servia a ambos. Por isso, a ligação do primeiro-ministro caiu. Mais tarde, soube-se que o motivo da ausência era a intromissão de pessoas próximas e políticos do mesmo partido.

Após colocar o telefone no gancho, Josei Toda permaneceu calado por um tempo e depois disse: “Mesmo que ninguém venha, realizaremos uma grande cerimônia com os jovens!”.

Treinar em cada detalhe

O presidente Josei Toda afirmou: “Os jovens estão esperando. Pois bem, eu os incentivarei. Realizarei a cerimônia de transferência do bastão espiritual do kosen-rufu!”. Então, chamou o jovem Ikeda e iniciou os preparativos finais.

O discípulo conduziu o mestre até o local em que se encontrava uma liteira. Ao vê-la, Toda sensei esbravejou com uma voz que parecia um trovão: “A liteira de onde Komei liderava era algo pequeno, sendo carregada por duas pessoas na frente e duas atrás. Não se consegue lutar com algo tão grande assim!”. Essa rigorosidade era uma constante no mundo particular dos dois.

Reprodução/Foto-RN176 A liteira construída com sinceridade Toda sensei pensou na sopa para seus discípulos. Por outro lado, o jovem Daisaku Ikeda se preocupou com a locomoção segura do seu mestre, em decorrência da dificuldade dele de andar. Foi preparada então uma liteira, na qual Josei Toda seria carregado pelos jovens até o local da cerimônia. A ideia de construir uma liteira surgiu da história do grande estrategista chinês Shokatsu Komei, que liderou a batalha de Gojoguen sentado numa cadeira de quatro rodas. Na tarde de 15 de março, a liteira ficou pronta. Ao vê-la, o jovem Ikeda afirmou: “É um tanto grande. Mas ficou boa”. Em seguida, entrou no prédio onde estava o presidente Josei Toda para comunicá-lo que havia construído a liteira. Alguns líderes chegaram a rir devido ao tamanho dela, mas o jovem Daisaku Ikeda não se abalou. Quando saiu do prédio, ele pagou as despesas de construção da liteira e disse aos jovens que a construíram: “Estou muito agradecido pelos seus esforços. Está tudo bem. Toda sensei subirá nela, sem falta. Afinal, foi construída com a sinceridade dos discípulos que pensaram nele” – Foto: Seikyo Press

Sensei, compreendi muito bem”, disse o jovem Ikeda. Então, o presidente Josei Toda respondeu de repente: “Compreendeu? Está bem!”. E, no mesmo instante, voltou a ter sua feição de alegria. Sorrindo, subiu na liteira.

Aquele instante foi uma obra-prima da unicidade de mestre e discípulo. Josei Toda tinha uma sensibilidade aguçada e sabia dos sentimentos do seu discípulo. O que mais queria era treiná-lo sobre cada detalhe até o último momento. Estavam em perfeita sintonia.

Da liteira, Toda sensei conduziu a cerimônia com toda a dignidade. Os rapazes que o carregavam irradiavam felicidade, e em sua fronte brilhavam douradas gotas de suor.

A programação da cerimônia

Às 12h40, o jovem Ikeda anunciava o início da reunião. Sua voz era tão firme, vibrante e cheia de determinação, que se expandia e parecia balançar as árvores em volta do auditório. A importância da cerimônia podia ser sentida por meio da voz do jovem Ikeda, mestre de cerimônia. Para os participantes, não importava a ausência do primeiro-ministro.

Daisaku Ikeda conduzia a reunião atento a cada movimento do seu mestre, que ficava totalmente tranquilo quando seu discípulo estava por perto.

O discurso de Josei Toda fechou a cerimônia:

A Soka Gakkai é a monarca do mundo religioso. Isso significa sermos o monarca do pensamento e o monarca da filosofia. E mais, é sermos o monarca das pessoas e o monarca da paz, que seguirão liderando a sociedade e o mundo. É também sermos o monarca da justiça e o monarca da vitória, que triunfarão sobre tudo. Nós temos a missão de concretizar, de qualquer maneira, o kosen-rufu. E é justamente essa missão que eu quero confiar a vocês no dia de hoje. Deixo o futuro em suas mãos. Conto com vocês para realizar o kosen-rufu!.3

Ao refletir sobre esse discurso, o presidente Ikeda comenta: “Era um grito da vida de Toda sensei. Uma profunda emoção, como se um raio tivesse atravessado o coração de 6 mil jovens. Por alguns instantes, o ambiente foi tomado por um solene silêncio”.

A cerimônia encerrou-se por volta das 14h30. O presidente Josei Toda subiu novamente na liteira e foi conduzido pelo jovem Ikeda. Os discípulos se concentraram novamente na frente do auditório para se despedir do mestre com uma grande salva de palmas. O Monte Fuji, que no período da manhã teve o cume encoberto pela névoa da primavera, abriu-se claramente. Após o término da reunião, Toda sensei disse: “Gostaria de percorrer todo o Japão nesta liteira construída sinceramente por vocês”.

Reprodução/Foto-RN176 Aspecto da cerimônia do dia 16 de março de 1958, com a participação de cerca de 6 mil jovens, liderada pelo segundo presidente da Soka Gakkai, Josei Toda, e conduzida pelo discípulo Daisaku Ikeda – Foto: Seikyo Press

Desde os preparativos até a conclusão da cerimônia do Dia 16 de Março, os jovens testemunharam a atuação conjunta de mestre e discípulo. A reunião foi um teste dado pelo mestre para a nova geração de discípulos. O desempenho do jovem Daisaku Ikeda, que assumiu a responsabilidade por todo o evento, demonstrou, na prática, o que era ser o modelo de força jovem da Soka Gakkai. Sua atuação, inspirada na unicidade de mestre e discípulo, é o espírito imortal da nossa organização.

O legado de Josei Toda

Semanas depois, no dia 2 de abril, Toda sensei faleceu após encarregar seus discípulos do cumprimento do kosen-rufu. Em especial, o jovem Daisaku Ikeda dedicou-se incansavelmente a concretizar todos os ideais do seu mestre. Tornou-se, enfim, o terceiro presidente da Soka Gakkai no dia 3 de maio de 1960, dando continuidade ao grandioso legado de Josei Toda e propagando o budismo pelo mundo.

Em relação ao Dia 16 de Março, o presidente Ikeda comenta:

Dezesseis de Março é o ‘eterno dia da verdadeira causa’, onde se levantam os discípulos. Para mim, todos os dias são a partida com um novo objetivo, e todos os dias são “16 de Março”. Cada dia é um dia de renovado juramento seigan. Cada dia é o “16 de Março!” Seguindo o modelo do dia “16 de Março”, passei totalmente o bastão do espírito da Soka Gakkai aos jovens. Jovens que eu sempre amarei! Jovens em quem sempre confiarei! O século 21 é de vocês. Sua época chegou. Não tenho dúvidas de que sua época chegou.4

Decorridos 66 anos da histórica cerimônia de 16 de março de 1958, os jovens da Soka Gakkai no mundo levantam-se para cumprir os ideais de Ikeda sensei, que faleceu serenamente no dia 15 de novembro de 2023, aos 95 anos. No Brasil, os integrantes da Juventude Soka empenham-se, entre outras frentes, no movimento de levar a 100 mil jovens de todo o país o humanismo com base no Budismo de Nichiren Daishonin para a criação de um mundo de paz e de respeito à dignidade de cada pessoa.

No topo: Em primeiro plano, jovem Daisaku Ikeda, à esq., ao lado do seu mestre, Josei Toda, em atividade realizada em Shizuoka, Japão (mar. 1958)

Fonte:

Brasil Seikyo, ed. 2.507, 14 mar. 2020, p. 6 e 7.

Notas:

  1. Pauzinhos utilizados para comer.
  2. Terceira Civilização, ed. 511, mar. 2011, p. 62.
  3. Ibidem, p. 63.
  4. Ibidem, p. 64.

Fotos: Seikyo Press

FONTE: SEOKYO PRESS