ROTANEWS176 01/09/2024 09:30
Reprodução/Foto-RN176 Luciano Callegari em documentário publicado no YouTube; ex-diretor analisa situação do SBT
Ex-diretor do SBT e braço-direito de Silvio Santos (1930-2024) durante mais de 40 anos, Luciano Callegari criticou a situação da emissora sob o comando das filhas do apresentador. Ele ainda afirmou que o futuro da empresa já estava sendo traçado antes mesmo da morte do fundador.
“Não precisou o Silvio morrer para sabermos qual será o caminho do SBT. Desde que o Silvio deixou de participar, e suas filhas e a Iris [Abravanel] começaram a liderar os negócios, nós vimos que a falta de experiência e os egos são o que ditam hoje o caminho do SBT. Infelizmente, o SBT deixou de ser vice-líder numa rapidez alarmante, e o caminho contrário é muito mais difícil”, disparou em entrevista à Folha de S.Paulo.
Silvio Santos considerava Callegari como seu melhor amigo. O executivo esteve ao lado do comunicador na fundação e nas primeiras décadas do SBT, ajudando a emissora a conquistar a vice-liderança e brigar pelo primeiro lugar no Ibope.
Ele também investiu na dramaturgia e viabilizou a produção de novelas, como Éramos Seis (1994) e As Pupilas do Senhor Reitor (1994). O diretor deixou a emissora em 2000, período em que Silvio Santos passou a tomar decisões executivas na empresa.
“Acho que tem que haver um equilíbrio entre a marca colocada pelo Silvio e a modernização. Modernizar não quer dizer você destruir o DNA da empresa. É triste ver o caminho que o SBT está tomando”, completou o profissional de 86 anos.
Callegari ainda falou sobre as decisões de Daniela Beyruti, filha número três de Silvio Santos, na direção da emissora. “A Daniela tem que descobrir alguma forma de melhorar o SBT. Faço votos para que ela consiga. Mas, até agora, ela não agradou. Transformar o SBT em ‘Disney brasileira’ é uma brincadeira, não pode ser levado a sério. A Daniela vai ter muitos problemas”, opinou.
O veterano comentou a escolha de influenciadores digitais para apresentar atrações no SBT. “O público da televisão aberta não é o mesmo público que eles têm em redes sociais. O DNA da televisão é outro. Você não pode esperar que o influenciador vire um apresentador, não é assim. Se a pessoa não tem talento, e como bem dizia o Boni, ‘lastro’, não vai durar”, analisou.
“O programa com a Virginia [Fonseca] é muito fácil de se destacar, mas não quer dizer que é um sucesso. Dar dois pontos [de audiência] e, eventualmente, cinco pontos não é um sucesso, principalmente naquele horário de sábado à noite. A Globo tentou com a Jade Picon, que tem no Instagram 22 milhões de seguidores. Colocou ela na novela [Travessia] e não deu mais audiência do que a novela daria”, comparou.
“A migração das redes sociais para a televisão não é assim, os números são muito maiores na televisão. Não podemos também esquecer do fato de que muita gente que só acompanha a televisão não sabe quem são esses influenciadores. Nós vivemos num país onde a grande massa ainda não tem todo esse conhecimento”, completou.
Último encontro com Silvio
Luciano Callegari contou que não conversava com Silvio fazia um tempo, mas Iris Abravanel o procurou há cerca de cinco meses. A escritora explicou que o marido queria falar com ele.
No dia seguinte, fomos jantar na casa dela. Vi o Silvio, ele não estava bem. Eu sentia que ele queria falar alguma coisa, mas não conseguia. O que ficou gravado é que, na hora em que eu estava saindo, ele me chamou numa outra sala e me perguntou se eu precisava de alguma coisa. Foi a última vez que eu falei com meu amigo.
O ex-executivo ainda recordou da parceria com o dono do SBT: “A principal qualidade do Silvio é que quando ele pegava o microfone, em frente ao público, acontecia a mágica, as pessoas ficavam hipnotizadas. Fora a parte artística, fazíamos uma dupla que deu muito certo. Brigávamos muito, mas, no final, a programação se tornava um sucesso”.
“[Os acertos] Só aconteceram porque nós conversávamos dez horas por dia, em média. Não tinha ego envolvido [entre] ele e eu. Discutíamos por horas os melhores talentos para a programação e o que deveria ser feito. A nossa intimidade, e o fato de podermos falar tudo um para o outro, sem qualquer tipo de preocupação, ajudou no desenvolvimento da emissora. A paixão que tínhamos pela televisão se refletia na audiência”, explicou.
A amizade ultrapassou o lado profissional. “A minha maior satisfação não foi ser o melhor amigo do Silvio, como ele disse diversas vezes. Mas foi ver que nossas famílias se davam bem também. A gente era uma família como na televisão”, afirmou.
TV aberta vai acabar?
Callegari discorda dos pessimistas que insistem no fim da televisão aberta, mas fez um alerta. “A TV aberta ainda mantém relevância e pode continuar a ser uma parte importante do panorama midiático no futuro. Mas isso dependerá de sua capacidade de adaptação às novas realidades do mercado e de sua habilidade em integrar tecnologias e estratégias digitais. A TV aberta pode incluir uma combinação de tradição e inovação.”
Apesar de sentir falta do trabalho na TV, o ex-diretor não pretende voltar. “A gente tem saudade de tudo o que foi bom, mas não tenho interesse em voltar para a TV. O que eu e o Silvio começamos do zero, levando o SBT ao segundo lugar em audiência, foi, sem dúvida nenhuma, a maior realização da minha vida profissional”, arrematou.
FONTE: FOLHA DE SÃO PAULO