ROTANEWS176 E POR CORREIO BRASILIENSE 13/03/2022 08:00 Por Leticia Mouhamad
Assim como nos humanos, a obesidade em animais causa uma série de problemas de saúde que, se não tratados, podem reduzir a longevidade dos pets
Reprodução/Foto-RN176 O shih-tzu Hachi costumava receber petiscos indevidos das visitas familiares, fator que aumentou o seu peso – (crédito: Arquivo pessoal)
A mudança de rotina na vida das famílias, derivada da pandemia, não é novidade, mas o quanto isso teve impacto no cotidiano dos pets? Estar com os tutores a todo momento em casa até pode ter sido positivo para os peludos, no entanto as preocupações e a ansiedade dos humanos reverberam para todos e trazem consequências físicas e emocionais. Uma delas está relacionada à superalimentação dos animais — um petisco aqui, um pedaço de pão acolá — que, gradativamente, transformam-se em quilos a mais e, muitas vezes, em obesidade.
Em um primeiro momento, a diminuição na frequência nos passeios, provocando estresse e transtornos alimentares, foi um dos fatores que, atrelado ao isolamento, contribuíram para o ganho de peso, como explica Katiane Rocha (@katianevet.endocrino), médica veterinária especialista em endocrinologia e metabologia. Hoje, com a situação mais controlada, não há desculpas para manter o pet confinado em casa e sem praticar atividades físicas. “É preciso ter disposição para ter um bicho, cuidar não é apenas dar carinho”, lembra a médica veterinária, especialista em nutrição, Marina Zimmermann.
Sobre os comportamentos alimentares, cabe reforçar que cães e gatos são carnívoros e, como tal, têm como base principal de alimentação, especialmente o felino, a proteína. “Com a humanização e as rações industrializadas, percebemos uma quantidade enorme de carboidratos, que o organismo dos pets não está preparado para receber em grandes quantidades. Dessa forma, temos muita resistência insulínica que predispõe à obesidade”, esclarece Katiane. Procurar por alimentos apropriados, específicos para cada espécie, com mais proteína, umidade e fibra e menos carboidrato deve ser o ideal.
Para a dona de casa Márcia Imai, foram os petiscos dados demasiadamente nas visitas dos familiares que colaboraram para o aumento de peso do seu shih-tzu. Quando estava com quase 12kg, Hachi tinha dificuldades para brincar e ficava cansado com frequência. Alguns aperitivos, principalmente os que provêm do cardápio humano e contêm gordura trans, conservantes, açúcar, sal em excesso e frituras podem ser bastante prejudiciais para a saúde dos pets. Além disso, há aqueles alimentos que são tóxicos e merecem atenção redobrada, como cebola, açaí, chocolate e uva.
Atualmente, com quase quatro quilos a menos, Hachi tem mais disposição para passear e brincar, ou seja, sua qualidade de vida melhorou significativamente. “Percebo que ele está mais feliz, mais ativo e, com certeza, mais saudável”, completa Márcia. A mudança se deu quando o peludo adoeceu em decorrência de problemas nos rins e sua tutora, nas inúmeras consultas ao veterinário, conheceu a alimentação natural.
Segundo Marina Zimmermann, o resultado em pacientes que passaram a se alimentar dessa forma tem sido muito positivo. Isso porque é possível oferecer uma boa quantidade de comida, de forma que o animal não sinta fome, com ingredientes que sejam menos calóricos e mais balanceados, para que o pet não tenha prejuízo à sua saúde.
Katiane Rocha lembra que, na alimentação natural, é possível personalizar tudo o que o animal precisa, mas adverte que essas refeições não se tratam de comida caseira e precisam ser prescritas e acompanhadas por um especialista, dado que é necessário suplementar o que falta, como as vitaminas e os nutrientes minerais. No que tange às rações comuns, sobretudo as secas, há unanimidade no entendimento de que elas contêm mais carboidratos que proteínas e, oferecidas demasiadamente, também favorecem o ganho de peso. Já as rações específicas para aumentar a saciedade podem ter ingedientes menos calóricos, mas não substituem o acompanhamento médico.
Entendendo as causas
Para além da ausência de atividade física e da alimentação inadequada, outros fatores devem ser investigados no que se refere à obesidade. “É imprescindível cuidar da família desse pet, entender a causa do problema. Ansiedade? Depressão do tutor? Muitas vezes, precisamos compreender que o responsável também é obeso e acaba não cuidando de si nem do animal”, detalha Marina. Ademais, existem algumas raças com tendência ao ganho de peso: beagle, cocker spaniel, pug, dachshund, basset hound, golden retriever e rottweiller. Katiane frisa, entretanto, que, hoje, até raças que não têm predisposição tendem a ficar obesas por conta do estilo de vida.
Há, ainda, doenças que podem levar à obesidade, tais como: o hiperadrenocorticismo, caracterizado pelo excesso de produção do hormônio cortisol, e o hipotireoidismo, insuficiente produção e secreção dos hormônios tireoidianos. Para identificar se o excesso de peso provém de transtornos primários, cabe a observação: se o cão ou gato estiver ganhando muito peso rapidamente, se engordar mesmo sem mudanças alimentares ou começar a sentir mais fome, é necessário investigar mais a fundo a sua saúde.
Vale frisar que a obesidade é uma doença multifatorial. “O animal obeso é uma ‘bolinha’ de inflamação, já que o tecido adiposo é o que mais produz hormônios, entre eles, os pró-diabetogênicos e os pró-cancerígenos. Isso diminui a longevidade e causa diversas alterações em todo o metabolismo desse animal”, salienta a veterinária endocrinologista. Problemas ósseo-articulares, cardíacos, respiratórios e dermatológicos também podem ocorrer.
Por isso, para os tutores, seguem as recomendações: conscientizar-se sobre os riscos da obesidade; procurar por ajuda de médicos veterinários que possam fazer uma avaliação nutricional e prescrever o tratamento adequado; informar-se sobre a quantidade correta de comida; ser proativo com mudanças no estilo de vida e investir em um melhoramento ambiental, para que os pets não fiquem no ócio e possam passear, brincar, farejar e caçar. Olhar os rótulos dos alimentos e pensar na possibilidade de refeições naturais também é uma dica.
Os riscos da castração precoce
Muito já se fala sobre a importância e necessidade da castração de cães e gatos, principalmente em se
tratando de animais de rua, com o intuito de diminuir a superpopulação e evitar algumas doenças. Entretanto, no que se refere ao ganho de peso, as médicas veterinárias Marina Zimmermann e Katiane Rocha concordam que a castração precoce — antes da puberdade — pode intensificar os riscos de obesidade.
Isso porque a ausência do hormônio sexual interfere no ganho de massa gorda e diminui a disposição para exercícios físicos. Torna também o metabolismo mais lento em cerca de 30%. As
cadelas, em especial, precisam ter contato com os hormônios, um amadurecimento do ponto de vista endocrinológico, que diminuiria as chances de ficarem obesas.
“Nos cães, ocorre em maior grau com as fêmeas e nos felinos, com os machos. Por isso, cada vez mais se preconiza que a castração deve ser avaliada como algo individual de cada animal, segundo a sua necessidade fisiológica”, afirma Katiane.
Além disso, há algumas categorias de câncer predispostas em cadelas castradas antes do primeiro cio. “Ocorre, por exemplo, uma situação chamada infantilismo genital, na qual as cadelas ou gatas castradas muito cedo não desenvolvem esses órgãos. Sem o ovário há tendência à obesidade. Quanto antes tirar, pior”, finaliza a veterinária nutricionista.