Vídeo com William Waack debochando de ‘preto’ opõe merchandising social contra o preconceito em ‘O Outro Lado do Paraíso’
ROTANEWS176 E BLOG SALA DE TV 09/11/2017 12:12 Jeff Benício
“Os arrogantes são como os balões: basta uma picadela de sátira ou de dor para dar cabo deles”, escreveu a célebre ensaísta francesa Madame de Staël, opositora do ególatra Napoleão.
Reprodução/Foto-RN176 William Waack armou uma arapuca para si mesmo ao achar que não estava sendo gravado Foto: Zé Paulo Cardeal/TV Globo
William Waack, conhecido no meio jornalístico pela empáfia atrás das câmeras, caiu numa armadilha armada por ele próprio. Um deboche seu virou drama – e pode antecipar o fim de sua carreira no telejornalismo.
Um vídeo de bastidor do ‘Jornal da Globo’, durante a cobertura da eleição presidencial americana de 2016, mostra o âncora ironizando um motorista que buzinava perto de onde ele e um entrevistado estavam, em Washington (cidade com numerosa população negra), à espera da entrada ao vivo na TV.
“Tá buzinando por quê, seu merda do cacete?”, diz o apresentador. Em seguida, sussurra para o convidado ao seu lado o que se entende como: “é preto. É coisa de preto”.
O flagra vazado por alguém ainda não identificado foi o assunto mais comentado da internet na quarta-feira (8). Tornou-se um escândalo de cunho racista poucas vezes visto na mídia brasileira.
Depois de horas de inexplicável silêncio, a emissora anunciou a saída temporária de William Waack da bancada do ‘JG’, onde ele está desde 2005.
“A Globo é visceralmente contra o racismo em todas as suas formas e manifestações. Nenhuma circunstância pode servir de atenuante. Diante disso, a Globo está afastando o apresentador William Waack de suas funções em decorrência do vídeo que passou hoje a circular na internet, até que a situação esteja esclarecida”, diz o comunicado.
Outro trecho da nota: “Waack afirma não se lembrar do que disse, já que o áudio não tem clareza, mas pede sinceras desculpas àqueles que se sentiram ultrajados pela situação”.
‘Àqueles que se sentiram ultrajados’ são ‘apenas’ 54% da população brasileira, de acordo com o IBGE, algo em torno de 111 milhões de ‘uns’, como a Globo passou a tratar seus telespectadores na nova campanha de autopromoção.
Esse escândalo racial envolvendo a maior e mais poderosa emissora do País acontece – santa ironia! – no momento em que sua principal novela aborda de maneira contundente a discriminação contra negros.
Em ‘O Outro Lado do Paraíso’, o autor Walcyr Carrasco mostra o racismo de uma branca de classe média alta, a dondoca Nádia (Eliane Giardini), contra sua empregada doméstica Raquel (Érika Januza), pertencente a um quilombo.
Desde o primeiro dia de trabalho, a moça foi alvo de críticas e zombaria por conta de sua origem étnica. A situação piorou quando Nádia descobriu o romance da moça com seu filho, o estudante de Direito Bruno (Caio Paduan).
No capítulo de quarta-feira (8), ela soltou uma ‘pérola’ racista: “já pensou eu ter um neto preto? Troco no berçário”.
O folhetim denuncia o racismo explícito e também o ‘racismo cordial’, expressão criada para descrever o preconceito praticado de maneira dissimulada.
A Globo, que já foi acusada de empregar atores negros somente em papéis de empregados e bandidos, ampliou nos últimos anos a presença de afrodescendentes na teledramaturgia e no telejornalismo.
Há vários jornalistas negros em destaque, como Gloria Maria, ícone do ‘black power’ na TV e hoje no ‘Globo Repórter’, Maria Júlia Coutinho, apresentadora da previsão meteorológica e ocasionalmente do ‘Jornal Hoje’, e Heraldo Pereira, apresentador eventual do ‘Jornal Nacional’ e comentarista de política do ‘Jornal da Globo’, onde interage diariamente com William Waack.
Uma interação que, hoje, parece ser improvável que continue. O retorno de Waack ao ‘Jornal da Globo’ é incerto.
Fonte: Especial para Terra