Idoso que subiu o Everest dá receita

ROTANEWS176 E POR AGÊNCIA O GLOBO 23/07/2022 09:45

Curitibano Joel Kriger mudou radicalmente os hábitos de vida para conseguir o feito

 

RN176 O Alpinista paranaense Joel Kriger, se torna brasileiro mais velho a escalar chegou ao topo do lugar mais alto do mundo o pico está a 8.848,86 metros acima do nível do mar

Ao chegar no cume do Everest (8.848 metros), o curitibano Joel Kriger, de 68 anos, não se tornou apenas o brasileiro mais velho a conquistar o topo do mundo. Ele mostrou que é possível ampliar — e muito — os limites humanos.

Mesmo para quem, como ele, foi sedentário por boa parte da vida. Exemplo de extremos da performance física, a trajetória de Kriger mostra que, se parar o tempo é impossível, é viável reduzir dramaticamente as marcas da passagem dele e reinventar aquilo que se costuma chamar de velhice.

Kriger até os 50 anos era sedentário. Hoje personifica o poder da atividade física. Também é a imagem da determinação, da perseverança e do foco. Em pouco mais de 18 anos, o empresário de Curitiba se tornou montanhista, maratonista aquático, triatleta e ultramaratonista de montanha.

E tudo porque, em 2003, aceitou o convite do amigo João Carlos Angelini de fazer uma caminhada até o Everest. Não só gostou, como ampliou o desafio.
Do Homem de Ferro ao Aquaman

Ao conquistar o Everest em 15 de maio, se tornou também o brasileiro mais velho a completar a escalada dos sete cumes mais altos do planeta. Mais um dos pontos altos — que no caso dele não é mero trocadilho — de uma trajetória que inclui provas de corrida de 100 quilômetros nos Andes e disputas de Ironman (prova de triatlo que consiste em nadar 3,8 Km, correr 42,195 metros ou uma maratona e ainda pedalar 180 Km).

Após subir no lugar mais alto do planeta, Kriger almeja ampliar seus horizontes no mar. Tentará no ano que vem atravessar a nado o Canal da Mancha, um percurso de 33,3 Km da França à Inglaterra, em águas geladas, um dos desafios mais icônicos da natação de longa distância.

Já tentou duas vezes e numa delas teve que parar a 800 metros da chegada. Desistiu da tentativa, mas não do desafio e ano que vem estará de volta. O Everest também só foi alcançado na terceira tentativa, sob um frio de -30°C.

A carreira de recordes no esporte não significou deixar de lado o trabalho. Numa idade em que a maioria das pessoas está aposentada, ele, que é profissional de computação por formação, continua a trabalhar oito horas por dia, à frente de sua empresa de importação em Curitiba.

Tampouco resultou em negligenciar a família e os amigos. São seu apoio e segurança, frisa.

— Vou e volto para a minha família. A montanha e o mar sempre vão estar lá. Sou uma pessoa confiante, mas não sou temerário — diz.

O expediente começa às 8h, depois de quatro horas de treinamento: duas de natação, uma de ciclismo e outra de corrida. Kriger toma um banho e começa a trabalhar.

— Tenho uma rotina bem definida. Sou disciplinado e não costumo desistir das minhas metas e isso faz diferença — acredita.

A maior viagem do mundo

Empresário da área de importação, Kriger passou boa parte de sua vida adulta viajando. Mas sua maior jornada foi a descoberta de que transformar o corpo e a cabeça é possível. Mudou o modus operandi de empresário sedentário para o de atleta dedicado, daqueles que nadam, pedalam, correm e — coisa para poucos — ainda escalam as montanhas mais altas do mundo.

— Eu só sabia nadar e fui parar nos Himalaias. Foi uma longa jornada pelo planeta e, sobretudo, de autoconhecimento — afirma.

Quando jovem, Kriger havia praticado natação. Filho do técnico e ex-campeão de natação paranaense Berek Krieger, ele chegou a competir até os 18 anos. Depois parou totalmente e foi estudar no Rio de Janeiro. Em sua volta aos esportes, já aos 50, descobriu que estava muito, muito fora de forma.

— O meu primeiro treinador achava que eu estava velho para os meus sonhos. Troquei de treinador. E segui — afirma Kriger.

Seguiu porque não havia nada que doses ainda maiores de determinação e treino não resolvessem. Foi melhorando e tomou gosto pelo treinamento. Descobriu nele prazer e alegria.

— Levei 19 anos para chegar ao cume do Everest. Tive êxito este ano, na terceira tentativa. Consegui porque aprendi a conhecer o meu corpo, a persistir, mas também a reconhecer quando é preciso desistir e o melhor momento para avançar — destaca.
Sorvete sim, maionese não

Kriger diz que é meticuloso com o treinamento e a saúde. Faz check-up regular, segue com rigor planilhas de treino.

— À medida que envelhecemos, perdemos massa óssea, muscular. Eu treino muito porque uma pessoa mais velha precisa treinar mais justamente para procurar amenizar essas perdas — observa.

Mas há vantagens na maturidade, salienta:

— A experiência nos ensina a ouvir o corpo e conhecer suas possibilidade e limites. Não ouvir o corpo mata — enfatiza.

Também cuida com zelo da alimentação. Porém, não se priva de prazeres da mesa. Magro — tem 66 kg e 1,73m —, ele luta agora para engordar. Precisa acumular alguma gordura para suportar as longas horas nadando nas águas geladas da Mancha.

— Estou com o mesmo peso que tinha aos 18 anos. Engordar não é fácil para alguém que não é particularmente guloso e precisa treinar muito, como eu. Minha nutricionista me manda tomar sorvete — diverte-se.

Sorvete, por ora, está liberado. Mas há cinco coisas banidas para sempre da vida de Kriger: refrigerantes, frituras, manteiga, margarina e maionese.

— É bem tranquilo. Na verdade, só sinto saudade do pastel — comenta.

O segredo

Acostumado a tomar decisões e levá-las adiante, Kriger só hesita quando perguntado o que lhe move:

— É difícil. Mais do que só força física, força de vontade. Sou focado e do tipo ‘acorda e vai’. Mas o fundamental mesmo é não deixar que a idade lhe consuma. As pessoas se resignam a ouvir coisas como “você está velho”, “está desmontando”, e se acomodam. Existem até médicos, ainda muito conservadores em relação à atividade física. Cada pessoa tem seus limites, mas é preciso conhecê-los e quase sempre eles são mais amplos do que se imagina — salienta.

O poder das proteínas

Pessoas que se mantém atléticas em idade avançada, correndo maratonas e competindo em provas esportivas até os 100 anos; um grupo de 800 proteínas e estruturas celulares que funcionam como usinas de energia são elementos de um quebra-cabeças que, quando completo, promete revelar um retrato de mecanismos fundamentais da longevidade.

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O que a ciência busca é compreender os mecanismos bioquímicos que permitem a algumas pessoas não apenas viver mais, mas ter uma idade biológica menor do que a cronológica. Os desdobramentos são potencialmente imensos como, por exemplo, impedir ou reverter a perda de força associada ao envelhecimento.

Cientistas americanos descobriram que as células de músculos de atletas mais velhos produzem níveis diferentes pelo menos 800 proteínas em relação às de idosos sedentários. A maioria está aumentada nos atletas e há 176 que só eles têm, segundo um estudo publicado na revista científica eLife.

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É gente como o britânico de origem indiana Fauja Singh, que, em 2011, aos 100 anos de idade completou os 42 quilômetros de uma maratona em Toronto em apenas oito horas.

Singh começou a correr maratonas aos 89 anos. Agora, aos 111 anos, está aposentado das maratonas, mas ainda pratica atividade física. Ele é extraordinário, mas têm se multiplicado os casos de pessoas que conseguem manter níveis altos de performance atlética em idade avançada.

Os pesquisadores suspeitam que as mitocôndrias, as usinas de energia das células, estejam relacionadas a pelo menos metade dessas proteínas.

Já se sabe que as mitocôndrias estão ligadas à atividade física. Uma série de estudos revelou que as pessoas que se exercitam pelo menos 30 minutos por dia produzem mais proteínas associadas às mitocôndrias do que sedentárias. Os pesquisadores, porém, não sabem como essas proteínas ajudam idosos ativos.

Russel Hepple, da Universidade da Flórida, está à frente do estudo que identificou as 800 proteínas. O estudo é pequeno, teve apenas 15 voluntários, mas seus resultados foram considerados significativos.

Os voluntários eram pessoas com mais de 80 anos que ainda competiam em provas esportivas. Foram analisados dados como equilíbrio, eficiência do uso de oxigênio e velocidade. Também se analisou tecido muscular. Os dados foram comparados aos de idosos sedentários.

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Muitas das 800 proteínas com níveis diferentes entre atletas e sedentários estavam aumentadas nos primeiros. Porém, Hepple disse à revista Science que algumas estavam reduzidas. Nesse caso, estão proteínas associadas a uma estrutura celular chamada spliceossoma, cuja função é limpar trechos sem função de material genético e que se acredita ajudar a amenizar os efeitos de alguns processos do envelhecimento.

Os pesquisadores se viram à frente de um dilema como o do ovo e da galinha. Não sabem se os atletas idosos têm níveis diferentes de proteínas porque são ativos ou se conseguem se manter ativos justamente porque possuem essas alterações.

Hepple e seus colegas supõem que a resposta possa estar no meio do caminho. Uma possibilidade é que o retardamento dos efeitos da velhice seja resultado de uma combinação de genes com intensa atividade física.