ROTANEWS176 E POR ISTOÉ 25/10/19 09h30 Por Guilherme Sette
A demora e inabilidade do governo federal para tomar decisões fazem com que a população tenha apenas uma alternativa para limpar o óleo que impregnou as praias do Nordeste: fazer o trabalho por si mesma
Reprodução/Foto-RN176 DESTRUIÇÃO Contaminação das praias deve afetar o turismo no Nordeste e prejudicar comunidades de pescadores (Crédito: Salve Maracaípe/Reprodução/Whatsapp)
Desaparelhado e sem interesse para combater as manchas de óleo que se acumulam há 50 dias no litoral nordestino, o governo federal não deixou alternativa para a população a não ser cuidar do trabalho de descontaminação com as próprias mãos. No Cabo de Santo Agostinho, litoral sul de Pernambuco, por exemplo, a limpeza das praias passou a ser feita, sem qualquer coordenação, pelos próprios moradores, algo desaconselhável por apresentar sérios riscos à saúde. Em outros pontos do litoral acontece o mesmo. O problema ocorre porque em abril deste ano o presidente Jair Bolsonaro deu fim a dois comitês que integravam o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Água (PNC), que deveria ficar responsável pelos esforços de despoluição. Sem um plano de ação, restou a ação de voluntários apoiados pelas prefeituras locais. Na semana passada, com grande atraso, o presidente em exercício, Hamilton Mourão, destacou mais de quatro mil homens do Exército para ajudarem na limpeza.
A situação das praias exige pressa. Além das consequências ambientais imensuráveis causadas pelo óleo, cuja origem ainda não foi esclarecida, há também um forte impacto social na região, que ainda está sendo contabilizado. Muita gente precisa do mar para seu sustento. Há pescadores e comerciantes que vivem das praias, tanto para abastecer restaurantes locais como para dar conta do contingente de turistas que as visita. Um relatório preliminar da Bahia Pesca, órgão que fomenta a atividade no estado, prevê problemas sociais graves nas comunidades de pescadores. “A mariscagem será diretamente afetada nesses locais, visto que, com a presença de óleo, a recomendação é evitar a pesca e a comércio desses organismos”, informa. A Secretaria de Turismo da Bahia informou que “a exposição deste desastre não é boa para nenhum estado do Nordeste” e que já recolheu mais de 230 toneladas do produto nas praias. No total, o governo contabiliza mais de mil toneladas removidas. Teme-se que a região perca muitos visitantes no próximo verão.
Poucas respostas
Ainda não há explicações para o acúmulo de sujeira nas praias. O Ministério Público Federal notificou o governo federal para que o PNC fosse colocado em ação imediatamente. O ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ativou o plano apenas em 11 de outubro, mais de 40 dias após o primeiro registro de mancha. Na terça 22, Salles visitou a região afetada. “É o momento de trabalhar, recolher o óleo e dar o destino necessário. Lá na frente iremos aprofundar as causas desse acidente”, disse. Ele estava acompanhado de membros do Exército, que se tornou uma espécie de “pau para toda obra” que o governo emprega em situações de emergência.
A chegada das forças militares para cuidar da limpeza gerou estranheza. Em algumas praias, os soldados tentaram impedir que os cidadãos participassem da descontaminação, talvez como uma medida protocolar apenas, mas que deixou a impressão de que “queriam aparecer”. Na noite do dia 23, Salles se contradisse quanto à intenção de descobrir as causas do acidente. Ele afirmou que fez uma solicitação formal para a Organização dos Estados Americanos (OEA) para que a Venezuela se “manifeste oficialmente” sobre o ocorrido. A estatal PDVSA já negou envolvimento com o desastre. Parece que a preocupação é encontrar culpados e não dar soluções. E, enquanto isso, quem suja as mãos é o povo nordestino.