ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 20/04/2023 16:39 APRENDER COM A NOVA REVOLUÇÃO HUMANA Por Dr. Daisaku Ikeda
Nesta continuação da série publicada no Seikyo Shimbun, trechos selecionados do romance.
Reprodução/Foto-RN176 Brados de alegria ecoam pelo Brasil – Ilustrações: Kenichiro Uchida
Em março de 1974, um festival cultural estava sendo planejando no Brasil para dar as boas-vindas ao presidente da Soka Gakkai, Shin’ichi Yamamoto, durante a sua visita às Américas do Norte e do Sul. No entanto, o governo negou seu pedido de visto necessário para entrar no país, em virtude de ideias equivocadas em relação à Soka Gakkai, e sua viagem ao Brasil foi cancelada. Ligaram para os líderes da organização no Brasil para informá-los sobre o cancelamento, e Shin’ichi incentivou-os a continuar com o andamento das atividades.
— Sei quão indignado e triste está. Contudo, esta situação deve ser encarada como a manifestação da sabedoria do buda. Com toda a certeza, há um profundo significado em tudo isso. Há ocasiões em que uma vitória pode ser a causa da derrota no futuro. Da mesma forma, a derrota pode ser transformada em causa da vitória. Espero que o Brasil se levante agora e avance com firmeza, fazendo desta situação a causa para a grande vitória no futuro. Agir dessa forma é agir com determinação embasada na prática da fé. Se olharmos a longo prazo, perceberemos que quanto maior a dificuldade, maior será o fortalecimento. Este é o princípio do budismo. Embora não possa viajar desta vez, irei sem falta numa outra oportunidade para incentivar os companheiros do Brasil. Está bem?
* * *
Os membros da organização no Brasil empregaram sua decepção como um estímulo para uma nova decisão na fé e dedicaram-se à recitação de daimoku e aos esforços para construir uma rede de confiança e de amizade em sua respectiva comunidade. Finalmente, em fevereiro de 1984, Shin’ichi pôde visitar o Brasil a convite do presidente da República.
Nos intervalos desses compromissos oficiais, Shin’ichi manteve encontros com os membros e incentivou-os calorosamente.
No dia 25 de fevereiro, o presidente Yamamoto surpreendeu com sua repentina presença os milhares de figurantes e membros que se encontravam no Ginásio de Esportes do Ibirapuera para assistirem ao ensaio geral do festival cultural.
Quando adentrou o ginásio e começou a dar a volta pela pista olhando para os membros que lotavam as arquibancadas, uma forte ovação e um turbilhão de vozes estremeceram o local. Todos aguardavam por esse grande momento.
Depois de percorrer o ginásio com os braços erguidos, Shin’ichi pegou o microfone e externou seu profundo sentimento aos membros do Brasil.
— Sinto-me muito feliz por estar aqui junto com todos os senhores. Foram dezoito anos de longa espera, mas finalmente pude reencontrar-me com os senhores, sublimes mensageiros do Buda. (…) Até chegar este momento, quanto avanço e devoção não houve da parte dos senhores e quantos belos laços de solidariedade não se formaram entre todos! Neste momento, meu sentimento é o de abraçar cada um dos senhores, apertar a mão de cada um com minha mais profunda gratidão. (…)
Todo o ginásio estremeceu novamente com uma estrondosa salva de palmas e um “pique-pique” de alegria e juramento de alegria ecoou alto pelos céus de São Paulo.
Com os olhos vermelhos e cheios de lágrimas, as pessoas nas arquibancadas pulavam, gritavam com todas as forças, acenavam e se abraçavam com incontida emoção.
(Trechos do capítulo “Luz do Alvorecer” )
A prática da fé não se define pela função na organização ou pela posição social
Em março de 1966, Shin’ichi viajou para as Américas do Norte e do Sul. Ele também enviou líderes a vários países das Américas Central e do Sul para incentivar pioneiros que haviam superado diversas adversidades para estabelecer a organização em suas regiões locais. No Paraguai, cada pergunta formulada pelos membros tinha a marca da angústia e da agitação. Alguns estavam enfrentando problemas como colheitas malsucedidas e dívidas acumuladas, e outros, sofrendo com doenças.
Katsu Kiyohara dedicou-se ao máximo para incentivar cada um dos presentes. Em suas palavras, enfatizou os benefícios provenientes da oração ao Gohonzon. Não havia outra forma senão incutir no coração das pessoas a forte convicção na prática do budismo.
Uma senhora idosa com uma criança no colo perguntou a Kiyohara:
— Este menino é meu neto, está com três anos e nasceu cego. Será que praticando o budismo ele poderá enxergar?
A família dessa senhora praticava o budismo havia algum tempo. Os familiares e ela dedicavam-se a ensinar às pessoas a grandiosidade da fé neste ensinamento. Mas quando o menino nasceu e os vizinhos perceberam que ele era cego, começaram a criticar o budismo. Isso feriu profundamente o coração de todos da família, principalmente o da avó. (…)
Todos ficaram em silêncio aguardando as palavras de Kiyohara.
— Há apenas uma coisa que posso afirmar sem medo de errar: seremos absolutamente felizes se nos empenharmos na prática da fé. Por isso, ensine essa prática a seu neto. Ele também tem uma missão a cumprir. Quando crescer e tomar consciência dessa missão, certamente viverá com dignidade.
Essas palavras dissiparam o constrangimento que ela sentia diante das pessoas por ter um neto com problemas visuais e também a preocupação dos demais familiares.
A partir desse dia, a atitude da avó e dos demais em relação ao menino mudou completamente. Até então ele era o foco do problema, mas, depois de ouvirem as orientações de Kiyohara, passou a ser tratado como o maior tesouro da família. Na verdade, foi ele quem uniu os familiares e fez com que mudassem a atitude de orar ao Gohonzon e se empenhassem com mais afinco na propagação do budismo.
* * *
Durante a viagem, os membros da comitiva refletiram se teriam continuado a prática budista vivendo nas mesmas condições dos companheiros de Frederico Chávez. Embora tivessem de orientá-los, sentiram que foram eles quem mais aprenderam. Os pioneiros do Paraguai, que enfrentaram a dura realidade da vida de imigrantes, foram para o grupo um magnífico exemplo de dedicação.
A prática da fé não se define pela função exercida ou pela posição social, mas pela atuação concreta em prol das pessoas e do kosen-rufu.
(Trechos do capítulo “Arando a Terra”)
Filhas da Soka Gakkai jamais são derrotadas
No dia 18 de setembro de 1966, foi realizado o Festival Cultural de Kansai, no Estádio Hanshin Koshien, província de Hyogo, apesar da chuva provocada por um tufão. Embora tivesse sido decidido que o festival seguiria em frente, uma apresentação de crianças da faixa de idade das que estudavam no ensino fundamental teria de ser cancelada, priorizando a saúde e segurança delas.
Elas foram informadas do cancelamento quando já estavam uniformizadas e prontas para entrar no campo. A responsável pela Fuji Kotekitai de Kansai reuniu o grupo e transmitiu com tristeza no coração:
— Devido à chuva, tivemos de cancelar a apresentação do Pompom para que vocês não tenham nenhum problema de saúde.
Todas começaram a chorar ao ouvirem a inesperada comunicação. Com o único sentimento de se apresentarem diante do presidente Yamamoto, elas se esforçaram nos ensaios, sob um sol escaldante, mesmo durante as férias escolares de verão. Ao saberem que não poderiam se apresentar no festival, o coração das jovens encheu-se de tristeza.
A responsável pelo grupo Pompom, Ineko Yoshikura, queria abraçar cada uma das meninas e chorar junto por compartilhar o sentimento delas. Entretanto, precisava ser forte naquele momento e encorajá-las como vencedoras.
— Haja o que houver, as meninas da Soka Gakkai jamais choram como derrotadas! São também filhas do leão! O presidente Yamamoto certamente não gosta de meninas choronas!
As meninas do Pompom levantaram o rosto banhado de lágrimas e ouviram com atenção as palavras de sua líder.
— A apresentação foi cancelada porque vocês são tesouros da Gakkai, e a saúde de vocês é, da mesma forma, muito preciosa. Vocês são jovens e terão ainda muitas oportunidades pela frente para participar de outros festivais. Todos os ensaios realizados até agora certamente servirão para futuras apresentações. A pessoa que mais se preocupa com vocês é o presidente Yamamoto. E tenho certeza de que ele está plenamente ciente do sentimento de cada uma. Compreendo quão desapontadas vocês devem estar, porém, o verdadeiro espírito de um membro da Kotekitai é superar a tristeza que invadiu nosso coração e dizer ao presidente Yamamoto que ele não precisa se preocupar conosco, não é mesmo?
Apesar dos incentivos, algumas meninas continuaram a chorar baixinho. Ineko aproximou-se delas. Enquanto enxugava as lágrimas de cada uma com um lenço, dizia-lhes carinhosamente:
— Eu também estou triste, mas devemos nos esforçar. Isso faz parte da luta do festival cultural. Agora é o momento de nos levantar e torcer pelas nossas companheiras que se apresentarão na chuva.
(Trechos do capítulo “Contínuas Vitórias”)
Avançar em face de perseguições com o coração de um rei leão
No dia 22 de abril de 1967, durante a sua visita à província de Niigata, Shin’ichi refletiu sobre a luta atroz de Daishonin na Ilha de Sado (parte da atual província de Niigata).
Mesmo enfrentando condições adversas como exilado, Daishonin não deixava de se preocupar com seus discípulos. Desde a Perseguição de Tatsunokuchi, muitos seguidores abandonaram a prática temendo a opressão governamental ou ficaram abalados em relação ao budismo ensinado por ele. (…)
Entre eles, alguns se acovardaram e começaram a criticá-lo. Como tinham medo de enfrentá-lo pessoalmente, diziam com palavras brandas: “Nichiren é nosso mestre. Porém, não podemos concordar com sua maneira de propagar o budismo. Ele é muito severo e intolerante. Desejamos difundir o budismo de forma branda”. Tais alegações pareciam razoáveis, porém, nada mais eram que artifícios para ocultar a covardia e o medo de combater a maldade, o objetivo primordial do budismo. Eles criticavam o mestre para justificar o abandono da luta como discípulos, apesar de se dizerem como tais. Esse é o meio comumente usado pelas pessoas que abandonaram a fé devido à autodecadência.
Muitas das cartas escritas em Sado revelam o rigor de Nichiren Daishonin ao ensinar a verdadeira atitude na prática do budismo na tentativa de banir a fraqueza do coração de seus discípulos. No escrito Abertura dos Olhos consta: “Declaro aqui que não importa que os deuses me abandonem. Não importa que eu tenha de enfrentar todas as perseguições. Ainda assim, darei a vida em prol da Lei”.1 Nichiren registrou sua própria decisão de consagrar a vida em prol do kosen-rufu sem se importar com as perseguições e dificuldades. Essa declaração era seu brado para despertar os discípulos da visão distorcida de esperar apenas pela proteção dos deuses e pela tranquilidade da vida diária. (…)
Outro importante ensinamento de Daishonin aos seguidores consta na seguinte frase: “Quando um mau governante, associado a reverendos que praticam ensinamentos errôneos, tenta destruir o ensinamento correto e eliminar um sábio, os que possuem o coração de um rei leão, sem dúvida atingirão o estado de buda”.2 Nichiren ensina que o espírito de lutar com base na unicidade de mestre e discípulo é o caminho para a iluminação. (…) O próprio Nichiren Daishonin afirma que se não fossem as pessoas que o perseguiram, não poderia provar que ele era o verdadeiro devoto do Sutra do Lótus.
Pode parecer contraditório praticar o budismo e sofrer dificuldades. Porém, esta é a suprema fórmula da transformação do “negativo” em “positivo”, que gera a mudança na vida das pessoas e proporciona a revolução humana.
(Trechos do capítulo “Dinâmico Avanço”)
(Traduzido da edição do jornal Seikyo Shimbun do dia 24 de setembro de 2019.)
Notas:
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. I, p. 293, 2020.
- Ibidem, p. 318.
Ilustrações: Kenichiro Uchida