ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 16/07/2022 10:57 ESPECIAL DA REDAÇÃO
Reprodução/Foto-RN176 Ilustração mostra Daisaku Ikeda, em pé, recitando um poema em agradecimento a Josei Toda, terceiro à esq., durante a primeira reunião de palestra da Soka Gakkai da qual participou (14 ago. 1947). Dr. Daisaku Ikeda. Ele é um filósofo, escritor, fotógrafo, poeta e líder budista da SGI atualmente o Mestre e Presidente da Soka Gakkai Internacional – SGI – Editora Brasil Seikyo – BSGI – Ilustração: Kenichiro Uchida
O presidente da Soka Gakkai Internacional (SGI), Dr. Daisaku Ikeda, completa 75 anos de conversão ao Budismo de Nichiren Daishonin no dia 24 de agosto. Sua vida dedicada à propagação dos ideais humanísticos budistas pelo mundo baseia-se na relação de unicidade de mestre e discípulo com Josei Toda, iniciada em uma reunião de palestra da Soka Gakkai.
Era 1947, dois anos haviam se passado após o fim da Segunda Guerra Mundial e o Japão sofria com a destruição e as consequências do conflito. Um clima de desesperança e de incerteza pairava sobre o povo.
Josei Toda dedicava-se intensamente a reconstruir a Soka Gakkai e a propagar o Budismo de Nichiren Daishonin, objetivando transformar a realidade da sociedade. Em meio aos membros da organização, começaram a despontar jovens que aprendiam a alegria de realizar o shakubuku, como dois amigos que moravam no distrito Kamata, em Tóquio. Com pouco mais de 20 anos, eram colegas desde o ensino fundamental 1 e procuravam por amigos daquela época para convidá-los a participar das atividades, dentre eles o jovem Daisaku Ikeda, de 19 anos.
Os amigos foram várias vezes à casa dele, mas não conseguiram falar diretamente sobre a prática da fé. Para os jovens daquele período, além da cultura e da política, conversas sobre religião eram distantes da realidade. Quando entravam no quarto, viam a estante repleta de obras literárias de diversas épocas e lugares. Embora conhecessem alguns títulos e nomes de autores, não sabiam muito bem sobre o conteúdo delas.
Certo dia, percebendo o interesse do jovem Ikeda por filosofia, uma moça o convidou para uma reunião de palestra, dizendo se tratar de uma “conversa sobre filosofia”. Ele indagou se seria uma palestra sobre Henri Bergson (1859-1941), filósofo francês por quem nutria admiração, e quem seria o palestrante. A amiga respondeu que seria Josei Toda e que se tratava de uma filosofia que elucidava fundamentalmente a vida. Ele concordou e disse que levaria amigos de seu grupo de estudos também ao encontro.
Na noite da atividade, 14 de agosto, os amigos vieram buscar o jovem Ikeda, mas ele estava esperando por dois colegas que o acompanhariam. Enquanto aguardava, sentia o cansaço decorrente de uma febre que havia surgido desde o fim da tarde. Sua saúde se encontrava bastante debilitada nessa ocasião. Finalmente, os colegas chegaram e os cinco jovens foram caminhando pelas ruas sem iluminação até a casa da jovem onde seria realizada a reunião.
Por volta das 20 horas, chegaram à residência e podia-se ouvir a voz animada de um homem de meia-idade, embora rouca. Cerca de vinte pessoas estavam sentadas em duas salas cujas divisórias haviam sido retiradas. Na parte da frente, um senhor de óculos com lentes grossas palestrava em tom calmo, mas vigoroso.
Daisaku Ikeda e seus amigos achavam que seria uma reunião de jovens, mas havia também donas de casa e pessoas de idade que ouviam atentamente. A explanação de Toda sensei era sobre o escrito Estabelecer o Ensinamento para a Pacificação da Terra (Rissho Ankoku Ron). Uma moça lia o trecho original da obra e ele dava a explicação de forma vigorosa. À medida que ouviam, os três jovens perceberam que se tratava de uma palestra sobre o budismo. Ikeda sensei relembra esse momento:
O Sr. Toda, meu mestre, aguardava-me como um pai afetuoso. Foi um momento solene, eterno, que abarcou as três existências. Foi o dia do juramento de um discípulo — o meu — de me tornar discípulo do Sr. Toda e de devotar minha vida ao kosen-rufu. (…)
Na explanação que ele fez nessa primeira vez que participei numa reunião, o Sr. Toda imprimiu forte paixão e determinação num alerta às pessoas. Foi um rugido do leão proclamando a essência do Budismo de Nichiren Daishonin.
A explicação do Sr. Toda não era de um budismo antiquado e ultrapassado. Revelava um caminho grandioso com a promessa de um futuro brilhante, que transbordava convicção e dinamismo. (…)
Após concluir sua explanação, o Sr. Toda iniciou um diálogo informal. Ele mastigava pastilhas de menta e se portava com naturalidade e descontração. Não demonstrou a mínima atitude de superioridade pretensiosa e arrogante que muitos falsos líderes políticos e religiosos exibem. Estava sendo ele mesmo. Embora aquele fosse o nosso primeiro encontro, senti-me à vontade para fazer qualquer pergunta que guardava em meu jovem coração. Lembro-me de ter arriscado, com certa intensidade, esta questão: “Senhor, qual é o modo correto de vida?”.
O Sr. Toda me deu uma resposta clara, com plena convicção, isenta de qualquer jogo intelectual ou desonestidade que obscurecesse o verdadeiro ponto de minha pergunta. Eu estava cansado de adultos que tratavam os jovens com uma superioridade paternalista, por isso, a sinceridade do Sr. Toda me tocou profundamente. Além disso, não suportava políticos e intelectuais que haviam cantado hinos em louvor à guerra, mas de repente se transformaram em pacifistas depois que os combates acabaram. O fato de o Sr. Toda ter sido perseguido pelas autoridades militares e passado dois anos encarcerado por sustentar suas crenças foi o fator decisivo para eu me tornar seu discípulo.1
Em determinado momento, o jovem Ikeda contemplava algo, com olhares atentos, deixando sua face inteiramente corada. Parecia estar impaciente, desejando pronunciar algo novamente. De súbito, levantou-se decidido e externou:
— Sensei, muito obrigado. Há um antigo ditado que diz: “Faz bem pensar mais uma vez, mesmo que concorde. É bom pensar novamente, mesmo que discorde”. Acreditando nas palavras do senhor ao me sugerir que como jovem estudasse e colocasse em ação, gostaria de segui-lo e me empenhar nos estudos. Nesse momento, gostaria de expressar meu sentimento de gratidão com um poema, embora não tenha nenhuma habilidade e tenha sido de improviso…2
Josei Toda concordou em silêncio. O rapaz fechou levemente os olhos e começou a declamar com sua voz sonora:
Ó viajante!
De onde vens?
E para onde irás?
A lua desce
no caos da madrugada,
mas vou andando
antes de o Sol nascer.
à procura de luz.
No desejo de varrer
as trevas de minh’alma,
a grande árvore
eu procuro
que nunca se abalou
na fúria da tempestade.
Neste encontro ideal,
sou eu quem
surge da terra!3
Todos ficaram surpresos. Para Josei Toda, especialmente, a última frase soou de forma muito significativa. “Sou eu quem surge da terra!” — era a missão dos bodisatvas da terra que surgiram nos Últimos Dias da Lei para propagar o ensinamento do budismo. Naturalmente, o jovem Ikeda não conhecia esse conceito. Ele retratava no verso o sentimento que carregava no coração ao observar a força vital da natureza demonstrada pelo nascimento vistoso das plantas e árvores verdejantes que, com a chegada da época certa, emergiam dos campos devastados pela guerra. Entretanto, Toda sensei pressentia que tudo aquilo havia sido místico: o encontro com aquele rapaz de 19 anos lembrava-o do que tivera com seu mestre, Tsunesaburo Makiguchi. “Se o budismo é certo, deverá surgir infalivelmente uma relação de mestre e discípulo entre as duas pessoas que infalivelmente deverão realizar uma revolução religiosa sem precedentes na história da humanidade”, era o que pensava Josei Toda.
Ikeda sensei recebeu o Gohonzon e se converteu ao Budismo Nichiren em 24 de agosto de 1947. Embora sua família, a princípio, não fosse a favor de sua prática, o jovem não hesitou, inspirado pela confiança que Josei Toda depositava nele, como afirma:
Ele confiava em mim, e me dizia: “Vamos, não hesite! Desafie seu espírito de procura comigo! Estude e pratique com coragem, assim como cabe a um jovem!”. Minha intuição de jovem dizia-me que podia seguir com segurança aquele homem que havia sido preso durante a guerra em defesa da paz e do budismo. Nesse sentido, 24 de agosto marcou meu ingresso na “Universidade Toda”. Uma vida dedicada à verdade tem início com a relação entre mestre e discípulo.4
Em pouco mais de dez anos de convívio, mestre e discípulo tiveram uma existência em perfeita harmonia e união, conquistando grandes feitos como a concretização de 750 mil famílias ao budismo, a Declaração pela Abolição das Armas Nucleares, em 1957, e a Cerimônia do Kosen-rufu, realizada em 16 de março de 1958.
Reprodução/Foto-RN176 Daisaku Ikeda, com 19 anos. Dr. Daisaku Ikeda, fundador da Universidade Soka. Dr. Daisaku Ikeda. Ele é um filósofo, escritor, fotógrafo, poeta e líder budista da SGI atualmente o Mestre e Presidente da Soka Gakkai Internacional – SGI – Editora Brasil Seikyo – BSGI Fotos: Seikyo Press
Após o falecimento de Josei Toda, Ikeda sensei assumiu a terceira presidência da Soka Gakkai em 3 de maio de 1960. Em outubro daquele ano, partiu para a primeira viagem ao exterior a fim de propagar o budismo em diversos países, entre eles o Brasil. A partir de então, vem se empenhando incansavelmente para cumprir os ideais do seu mestre e impulsionar o movimento pelo kosen-rufu. Suas inúmeras realizações vão desde a criação do sistema educacional Soka e escrever livros até a fundação de instituições como o Museu de Arte Fuji de Tóquio e a Associação de Concertos Min-On; dos diálogos com diversas personalidades mundiais às homenagens recebidas de cidades, universidades e outras instituições reconhecendo seus esforços pela paz, cultura e educação.
A sublime relação de mestre e discípulo, eternizada em sua máxima obra literária, o romance Nova Revolução Humana, é a base de todo esse desenvolvimento da Soka Gakkai e também da transformação de vida de milhões de pessoas em vários países por meio da prática do Budismo de Nichiren Daishonin.
No topo: ilustração mostra Daisaku Ikeda, em pé, recitando um poema em agradecimento a Josei Toda, terceiro à esq., durante a primeira reunião de palestra da Soka Gakkai da qual participou (14 ago. 1947)
Fontes:
Brasil Seikyo, ed. 1.951, 16 ago. 2008, p. B3.
Idem, ed. 2.574, 8 ago. 2021, p. 6 e 7.
IKEDA, Daisaku. Emergindo da Terra. Revolução Humana. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. 2, p. 187-207, 2022.
Notas:
- IKEDA, Daisaku. Pilares de Ouro Soka. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, 2019. p. 51-55.
- Idem. Emergindo da Terra. Revolução Humana. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. 2, p. 205, 2022.
- Ibidem, p. 206.
- IKEDA, Daisaku. Pilares de Ouro Soka. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, 2019. p. 63.
Ilustração: Kenichiro Uchida
Foto: Seikyo Press