O direito animal e a tutela jurídica dos animais não humanos (1)

ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 12/05/2022 18:50      

PorJorge Kuranaka

COLUNISTA

Reprodução/Foto-RN176 Foto de ilustração da matéria – Editora Brasil Seikyo – BSGI

Apura-se que um dos efeitos do período da pandemia decorrentes da Covid-19 foi o estreitamento de laços afetivos entre os tutores e seus bichos de estimação. Isso fez com que o “mercado pet” crescesse de 15% a 18% em 2021, chegando a um faturamento superior a R$ 51 bilhões,2 com quase 23 mil novas empresas, entre 2019 e 2021. Em agosto do ano passado, apurou-se que o Brasil tem quase 140 milhões de animais de estimação, dos quais 54,2 milhões são cães; 23,9 milhões são gatos; 19,1 milhões são peixes; e 39,8 milhões são aves.3

Em julho de 2020, Sansão, um cão da raça pit bull, após ser torturado, teve as patas traseiras decepadas por dois homens.

A notícia viralizou na internet e, junto com a história de uma cadela de rua espancada e envenenada, fez com que, a partir de setembro de 2020, começasse a valer a Lei nº 14.064/2020, apelidada por isso de Lei Sansão. Essa lei aumentou as penas previstas na Lei nº 9.605/1998, para crime de maus-tratos aos animais, quando se tratar de cão ou gato, podendo a pessoa ser condenada a reclusão de dois a cinco anos, multa e proibição de nova guarda. Antes, a pena era de detenção de três meses a um ano e multa.

Para entender melhor, a Lei Federal nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, regula em seu artigo 32 ser crime a conduta de uma pessoa que resulte em ato de abuso, maus-tratos, e de ferir ou mutilar animais silvestres ou domesticados, nativos ou exóticos. Os nativos fazem parte da fauna brasileira; e os exóticos são originários de outros países. Inclusive, com a Lei Sansão, passa a incorrer nas mesmas penas também aquele que impuser ao bicho “experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos”. Se dessas práticas resultar a morte do animal, a pena poderá ser aumentada de um sexto a um terço.

No estado de São Paulo, em dezembro do ano passado, foi sancionada e entrou em vigor a Lei Estadual nº 17.497/2021, criando o Programa de Proteção e Bem-Estar dos Animais Domésticos, que altera alguns critérios do Código de Proteção Animal do Estado de São Paulo (Lei nº 11.977/2005).

Esse programa, que tem por objetivo combater e prevenir a prática de maus-tratos aos animais domésticos, determina que os municípios paulistas promovam políticas públicas de proteção dos animais, ações educativas e fiscalização dos órgãos.

Também criou o Registro Único do Tutor (RUT) no estado, que é o registro para identificação dos tutores de cães e gatos. Também, entre as novidades, houve um agravamento das penas e multas para os donos que maltratarem seus animais de estimação. Inclusive, eles poderão ser proibidos de adquirir novos animais pelo prazo de cinco anos.

Reprodução/Foto-RN176 Jorgo Kuranaka Procurador do Estado mestre em direito. É vice-coordenador da Coordenadoria Norte-Oeste Paulista (CNOP) e consultor do Departamento de Juristas da BSGI – Editora Brasil Seikyo – BSGI

Enquanto o direito evolui lentamente nessa área, o budismo demonstra milenar respeito aos animais. O Dr. Daisaku Ikeda, presidente da Soka Gakkai Internacional (SGI), conta sobre a lenda japonesa de uma raposa que havia caído num lago gelado.

Fadada à morte, foi resgatada por Hikozaemon, chefe da vila, que a aqueceu e a secou, alimentando-a antes de soltá-la. Na manhã seguinte, dois faisões foram deixados na varanda externa da casa do protetor. Vendo as pegadas de raposa na neve, ele soube que era uma expressão da gratidão do animal. “Os seres humanos também precisam aprender com este exemplo”,4 conclui o presidente Ikeda.

A propósito, o cachorro Sansão passa bem; ganhou uma prótese e já voltou a andar.

 Jorge Kuranaka

Procurador do Estado, mestre em direito. É vice-coordenador da Coordenadoria Norte-Oeste Paulista (CNOP) e consultor do Departamento de Juristas da BSGI

Notas:

  1. A nomenclatura “direito animal”, para os que a defendem, surge da disciplina jurídica autônoma, distinta do direito ambiental, a partir do art. 225, § 1º, VII, parte final, da Constituição Federal, reconhecendo o direito fundamental animal à existência digna, havendo inclusive cursos de pós-graduação em torno do tema.
  2. Divulgado em matéria intitulada Mercado Pet Cresce de Forma Vertiginosa no Brasil Durante a Pandemia, vídeo exibido em 21 de fevereiro de 2022. Link: https://globoplay.globo.com/v/10323384/
  3. Dados da Revista Ecotour News & Negócios. Link: https://portal.comunique-se.com.br/253692-mercado-pet-apresentou-um-crescimento-expressivo-durante-a-pandemia/
  4. IKEDA, Daisaku. Nova Revolução Humana. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. 30-I, p. 134, 2020.