O que é terror religioso e por que o tema é tão fascinante para o cinema?

ROTANEWS176 31/05/2024 14h00                                                                                                                              Por Laysa Zanetti

Com ‘Imaculada’ chegando aos cinemas, entenda por que temas religiosos são tão presentes em fimes de terror.

 

Terror religioso é um subgênero de terror que aborda temas relacionados à fé para causar medo e questionar tabus da sociedade. Símbolos da Bíblia e seres sobrenaturais costumam ser elementos comuns nas obras.

Reprodução/Foto-RN176 Imaculada, novo terror com Sydney Sweeney, chega nesta quinta (30) aos cinemas Foto: Diamond Films/Divulgação

Se você acompanha as estreias do cinema e do streaming, mesmo que de forma ocasional, já deve ter percebido que não faltam novos filmes e séries de terror chegando a todo momento. Eles tomam as formas mais variadas que existem, mas basta um olhar um pouco mais atento para notar que um subgênero parece ser o franco favorito de cineastas e também dos espectadores: o terror religioso.

Por definição, terror religioso é uma obra que aborda temas relacionados à fé e a crenças ou mitos de algumas religiões para causar medo. Alguns elementos comuns são seres sobrenaturais, figuras demoníacas e fenômenos inexplicáveis. Símbolos como crucifixos, água benta e a Bíblia também costumam ser comuns, justamente para representar essa ligação com a fé. Seu mais recente representante, “Imaculada”, traz Sydney Sweeney como uma freira que fica grávida misteriosamente e todos no convento passam a acreditar que ela está gestando o salvador.

Como gênero, independentemente de suas dezenas de ramificações, o terror é tradicionalmente um tipo de válvula de escape para que convenções e tabus da sociedade sejam questionados. Para o autor dinamarquês Mathias Clasen, especializado em estudos de ficção e terror, a fascinação por filmes do gênero pode estar relacionada ao estado de constante risco em que viviam gerações antepassadas; em resumo, os filmes seriam uma forma sem riscos de viver as mesmas experiências, e treinar nossa resposta imediata a situações perigosas.

Reprodução/Foto-RN176 Foto: Diamond Films/Divulgação

Outras teorias apontam que o gosto por filmes de terror vem de uma curiosidade mórbida por assuntos como morte, vida e um dito “lado sombrio” do ser humano. É possível, por exemplo, explorar os limites da maldade por intermédio destas obras de ficção.

É neste sentido que o terror religioso torna-se algo particularmente interessante. Conceitos de “bem” e “mal”, presentes inclusive nas leituras sagradas, influenciam obras desde o surgimento dos primeiros movimentos artísticos clássicos, e isso casa perfeitamente com a própria tendência do terror de questionar o tradicional e noções pré-estabelecidas de certo ou errado.

Não por acaso, as ideias de punição, medo, traição, assassinatos e até fenômenos naturais, conceitos que existem na Bíblia e movem grande parte das histórias, estão entre os principais motores das histórias de terror mais clássicas.

“Parece que a religião sempre nos dá uma forma de lidar com os elementos mais misteriosos e amedrontadores de nossas vidas. Faz sentido que alguns desses símbolos da iconografia que nos dá esperança se encaixem perfeitamente nesses filmes”, relaciona o professor Andrew Rudd ao jornal Canton Rep.

“Há outro nível, em que os realizadores de filmes de terror reconhecem o significado mitológico de cruzes e sangue. Se você pensar no assunto, a história do Cristianismo tem alguns elementos bastante macabros e horripilantes.”

O professor Timothy Beal, do departamento de estudos religiosos da Universidade de Georgetown, Washington (DC), aponta que filmes de terror fascinam por serem palcos para perguntas sobre religião que, em outros lugares, podem não ser bem-vindas.

“Drácula e seus descendentes não-mortos nos convidam a perguntar se a vida eterna é mesmo desejável. Zumbis nos fazem questionar se a ressurreição é algo que devemos esperar (…) Os filmes de terror oferecem espaço para fazer perguntas religiosas profundas que outros lugares rejeitam.”

A favor ou contra?

Reprodução/Foto-RN176’O Exorcista’ (1973) Foto: Sunset Boulevard/Corbis/Reprodução/IMDb

Entre os muitos filmes com comentários religiosos, é natural que haja vertentes que se antagonizam. Há obras com comentários positivos, que mostram a fé como uma “tábua de salvação”, e outras que servem como uma espécie de alerta para os potenciais perigos de organizações e cultos.

Neste sentido, é interessante que obras fujam do viés doutrinatório, embora o questionar faça parte do conceito básico de uma obra de arte.

Em filmes como “O Exorcista” e “O Exorcismo de Emily Rose”, que se encaixam no icônico subgênero da possessão demoníaca, a ausência de uma conexão com a fé parece ser o principal motor para que a entidade do mal “tome conta” do corpo de alguém. São obras que indicam uma constante batalha do bem contra o mal, com a igreja funcionando como a solução para a pobre garota em sofrimento.

Ainda assim, não há uma visão maniqueísta: dentro desta lógica, a vulnerabilidade existe pelo distanciamento divino, e a instituição religiosa é vista como passível de falhas e questionamentos. Na imensa maioria das vezes, o padre ou a autoridade religiosa encarregada de solucionar o problema é também alguém que já questionou a própria fé.

“O Exorcista tem um equilíbrio entre o psicológico e o físico”, declarou em entrevista Corin Hardy, diretor de A Freira. “Ele acessa nosso medo da religião, de demônios e possessão. É pautado na realidade. Pode te balançar com esse subtexto de bom e mau.”

FONTE: TERRA