ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 25/08/2022 19:07 CADERNO NOVA REVOLUÇÃO HUMANA
Capítulo “Levantando Voo”, volume 30
Por Ho Goku
Reprodução/Foto-RN176 Desenho de ilustrações da Editora Brasil Seikyo – BSGI
PARTE 5
Quando Chang Shuhong começou a viver perto das Cavernas de Mogao, em Dunhuang, era uma área extremamente remota, isolada e cercada pelo deserto
Comprar itens essenciais para a vida significava viajar para uma cidade a cerca de 25 quilômetros de distância, pois, naturalmente, não possuía carro próprio.
Ele colocou um tapete fino sobre uma plataforma de tijolos de barro feitos à mão e por cima dispôs um colchão improvisado de palha coberto de pano para servir de cama. Não tinha nem sequer uma fonte satisfatória de água potável. No inverno, não raro a temperatura caía para menos de 20 oC negativos.
Não havia instituições médicas nas proximidades, e quando sua filha mais nova adoeceu, infelizmente ela faleceu cinco dias depois. Um pintor, que fazia pesquisas em Dunhuang desde antes da chegada de Chang, disse com certa ironia ao deixar o local que morar lá era como “cumprir uma sentença de prisão perpétua”.
Contudo, Chang Shuhong descreveu seus sentimentos na época:
— Senti que, se pudesse receber uma sentença de prisão perpétua nesta vasta extensão da cultura budista antiga, eu a aceitaria com prazer.
Pessoas firmemente decididas são fortes. Determinadas a avançar, mesmo com todos os tipos de dificuldades e de desafios, são capazes de realizar o que se propõem a fazer e de vencer na vida. Esse também é o modo de viver de um praticante budista. Por isso, Daishonin afirma: “Não esperem bons tempos, mas tenha os maus como certos”.1
Esquecidas, enterradas na areia e expostas à erosão pelo vento e pela areia por séculos, as cavernas de Mogao corriam o risco de desabar. Foi nessas condições que estava sendo feito um trabalho para preservar e restaurar as pinturas e esculturas de parede dentro das cavernas.
O primeiro passo foi plantar árvores para bloquear o vento e a areia — uma tarefa árdua e aparentemente interminável. Entretanto, os esforços de Chang Shuhong frutificaram, e o Instituto de Pesquisa de Relíquias Culturais de Dunhuang ganhou reconhecimento internacional.
Naquele dia em Pequim, Shin’ichi e o diretor Chang tiveram uma conversa animada na qual se viram em profundo acordo. Eles se encontraram e dialogaram por sete vezes até o último encontro em 1992.
Um livro embasado no conteúdo de suas conversas, intitulado Tonko no Kohsai — Bi to Jinsei wo Kataru (O Brilho de Dunhuang — Diálogo sobre a Beleza e a Vida), foi publicado em japonês em 1990.
Foi um diálogo inspirado no desejo apaixonado de abrir um novo caminho da seda da amizade e da cultura espiritual que leva ao futuro.
PARTE 6
Em novembro de 1990, foi inaugurada uma exposição de pinturas de Chang Shuhong no Museu de Arte Fuji, em Fujinomiya, província de Shizuoka.
Uma pintura em particular se destacou: uma tela gigante com mais de três metros de altura e cinco metros de largura, intitulada Pico Chomolungma. “Chomolungma”, que significa “Deusa Mãe da Terra”, é o nome tibetano para o Monte Everest.
A pintura mostra o magnífico pico do Everest coberto de neve elevando-se em direção ao céu, com pessoas subindo para chegar ao cume.
Era uma obra-prima imortal, que Chang Shuhong havia pintado com sua esposa e um colega artista, Li Chengxian. Eles a criaram imediatamente após a Revolução Cultural, quando as condições eram bastante severas e era quase impossível adquirir suprimentos de pintura. E fizeram isso com um juramento mútuo: “Está sofrido agora, mas vamos juntos visar o topo mais alto do mundo da cultura”.
Shin’ichi dialogou com o casal, que veio ao Japão especialmente para a exposição. Durante esse sexto encontro com Chang Shuhong, este lhe disse que queria lhe oferecer essa grande obra-prima, a cristalização de imensuráveis esforços. Era uma pintura muito preciosa, feita de corpo e alma pelo casal. Shin’ichi recusou o oferecimento dizendo que não poderia aceitá-lo, que só o sentimento do casal já era mais que suficiente.
Contudo, Chang insistiu que não havia outra pessoa mais adequada para receber essa obra que Shin’ichi, acrescentando:
— Durante a Revolução Cultural, nós fomos submetidos a um tratamento desumano indescritível. Nossa vida foi enclausurada na escuridão, sem um único feixe de luz. No entanto, ao criar essa pintura, fomos capazes de estender amplamente as asas da esperança, impossíveis de serem amarradas pelo poder da autoridade, e voar alto pelo céu. Quando concluímos a obra, sentimos uma renovada esperança brotar em nossa vida. O senhor vem transmitindo esperança a inúmeras pessoas até hoje. Por isso, acredito que presenteá-lo com essa pintura é o mais apropriado.
Eram palavras por demais generosas, e Shin’ichi considerou que deveria corresponder ao sincero coração do casal. Então, ele aceitou humildemente a pintura como representante de todos os membros da Soka Gakkai, que estavam envolvidos numa grande luta para estender a luz da esperança para a humanidade.
PARTE 7
Por ocasião do oferecimento da pintura, Chang Shuhong e sua esposa, Li Chengxian, expressaram o desejo de criar uma nova versão dela. Os materiais utilizados na produção da original eram de baixa qualidade e de um período imediatamente posterior à Revolução Cultural. Eles queriam oferecer a Shin’ichi um trabalho que perdurasse por todo o futuro.
Shin’ichi ficou profundamente comovido com essa consideração.
Assim que a concluíram, eles enviaram a Shin’ichi a nova pintura, que era do tamanho da primeira e tinha o mesmo tema. Uma cerimônia especial de inauguração foi realizada em abril de 1992. Mais tarde, esse quadro se tornaria um precioso tesouro da Soka Gakkai e ficaria exposto no lobby do andar térreo do Auditório Memorial Makiguchi de Tóquio, em Hachioji, para recepcionar os companheiros Soka do mundo que lutam bravamente para irradiar a luz da esperança para a humanidade.
O intercâmbio amistoso entre Shin’ichi e Dunhuang, iniciado pelo encontro com Chang Shuhong, continuou a crescer e a florescer. Em outubro de 1985, a exposição Tesouros de Dunhuang, China foi aberta no Museu de Arte Fuji de Tóquio. Depois disso, viajou para outras quatro cidades, apresentando a arte de Dunhuang para um grande público em todo o Japão. Em um gesto de agradecimento pelo apoio de Shin’ichi, a Academia de Pesquisa de Dunhuang incluiu seu retrato entre uma exibição de colaboradores ilustres na entrada das Cavernas de Mogao.
Em 1992, a Academia de Pesquisa de Dunhuang nomeou Shin’ichi “pesquisador honorário”; e em 1994, ela lhe concedeu uma medalha de bronze em reconhecimento à sua profunda compreensão e ao seu apoio contínuo no trabalho de proteção e preservação das antigas relíquias culturais de Dunhuang.
Durante a sua quinta visita à China, em 1980, Shin’ichi e os outros membros da delegação se reuniram com o presidente do Partido Comunista e com o primeiro-ministro Hua Guofeng na noite de 24 de abril.
No Grande Salão do Povo, Shin’ichi e o primeiro-ministro Hua dialogaram por cerca de uma hora e meia, abordando assuntos como o novo Plano Quinquenal da China, a Revolução Cultural, o problema da burocratização, a educação para a nova geração e muitos outros tópicos.
O primeiro-ministro Hua disse a Shin’ichi com um sorriso:
— Acredito que esta seja sua quinta visita à China. Já ouvi seu nome ser mencionado como um velho amigo da China. Como eu, há muitas pessoas que, embora nunca tenham se encontrado pessoalmente com o senhor, sabem muito bem a seu respeito e sobre a Soka Gakkai. Também assisti a um documentário sobre a Soka Gakkai e suas atividades.
O primeiro-ministro Hua acompanhava com interesse o movimento popular da Soka Gakkai embasado na revolução humana. A chave para construir uma sociedade sólida é a transformação ou reforma interior das próprias pessoas.
PARTE 8
No diálogo com Shin’ichi Yamamoto, o primeiro-ministro Hua Guofeng falou do desafio de atender às necessidades básicas de alimento, de abrigo e de roupas de mais de um bilhão de pessoas na China. Dado o problema particularmente sério de garantir produção suficiente de alimentos, disse Hua, o objetivo da China era estabelecer a agricultura como base da economia nacional. A melhoria da subsistência dos agricultores aumentaria seu poder aquisitivo, o que por sua vez também contribuiria para o desenvolvimento industrial.
Essas palavras do primeiro-ministro Hua fizeram com que Shin’ichi sentisse uma vez mais a seriedade dos desafios que os líderes chineses enfrentavam enquanto procuravam uma forma de proteger os meios de subsistência da enorme população do país.
Governar significa lidar com realidades. A vida das pessoas depende disso. As teorias idealistas não relacionadas com a realidade não passam de devaneios. Quando os formuladores de políticas estabelecem caminhos para reformas e melhorias constantes e práticas, eles também obterão o apoio e a aprovação do povo.
Shin’ichi perguntou a opinião do primeiro-ministro a respeito da possibilidade de o burocratismo se estabelecer, uma vez que a revolução seja alcançada, criando um distanciamento entre o povo e o governo.
O primeiro-ministro Hua disse que a correção do burocratismo era um importante desafio na realização das Quatro Modernizações e falou da necessidade de educar funcionários, reformar instituições e promover a supervisão pública.
Reprodução/Foto-RN176 Desenho de ilustrações da Editora Brasil Seikyo – BSGI
Qualquer organização entrará em burocratismo rígido se seus líderes se esquecerem do propósito de servir ao povo e passarem a agir por interesse próprio. Os líderes das pessoas, em especial, devem sempre ocupar seu lugar na linha de frente da organização, viver em meio às pessoas e se esforçar e trabalhar junto delas. Também é imprescindível que sempre retornem para o ponto primordial do “para quê?”, reflitam sobre si mesmos e se autodisciplinem promovendo sua revolução humana.
Estava prevista uma visita do primeiro-ministro Hua ao Japão no final de maio. Durante a conversa em Pequim, Shin’ichi e o líder chinês reconfirmaram a importância de se solidificar a “ponte dourada” da amizade entre Japão e China.
Enquanto visitava Pequim, Shin’ichi também se encontrou e conversou com uma jovem chinesa que tinha estudado na Universidade Soka como intercambista e havia retornado ao seu país naquela primavera.
O momento presente, denominado “agora”, nunca mais voltará. Decidido a não deixar escapar um instante sequer, Shin’ichi se encontrou com o maior número de pessoas possível. Ele se empenhou de coração para dialogar com elas e encorajá-las, fortalecendo e aprofundando os laços de amizade.
O grande escritor Liev Tolstói registrou: “É importante, antes de tudo, viver o momento presente, nas circunstâncias atuais, da melhor maneira possível”.2
O personagem do presidente Ikeda no romance é Shin’ichi Yamamoto, e seu pseudônimo, como autor, é Ho Goku.
Notas:
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin. São Paulo: Editora Brasil Seikyo, v. II, p. 264, 2019.
- TOLSTÓI, Liev. Polnoe Sobranie Sochinenii(Complete Works). Moscou: Terra, v. 69, p. 144, 1992. Tradução do russo.