ROTANEWS176 E POR ESTADÃO CONTEÚDO 27/10/2020 12h17 Por Marcelo Godoy, com colaboração de Claudio Liza Junior, especial para o Estadão
O inquérito sobre o caso foi aberto pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic)
A Polícia Civil de São Paulo investiga a possível atuação do Primeiro Comando da Capital (PCC) nas eleições municipais. No alvo dos investigadores está a possibilidade de a facção usar seu poder para impedir que candidatos possam fazer campanha em comunidades dominadas por criminosos no Estado. O Estadão apurou que há relatos de ameaças nas regiões de Campinas e da Baixada Santista.
Reprodução/Foto-RN176 Agentes da Polícia Civil durante operação Foto: Sinpol / DF / Agência Brasil / Estadão Conteúdo
O inquérito sobre o caso foi aberto pelo Departamento Estadual de Investigações Criminais (Deic). A investigação, segundo o delegado Ismael Lopes Rodrigues Junior, diretor do Deic, está a cargo da 4.ª Delegacia de Investigações Gerais. A polícia, de acordo com o delegado, ainda não conseguiu avançar na apuração da denúncia. O Deic é o departamento da Polícia Civil paulista responsável pelo combate à facção criminosa e tem atuação em todo o Estado.
Há cerca de 20 dias, a direção da polícia na Baixada Santista foi procurada por políticos ligados ao PSDB que estavam preocupados com relatos de cabos eleitorais envolvendo ameaças durante a distribuição de material de campanha em comunidades da cidade. A preocupação principal incluía os candidatos de Praia Grande e de Santos do PSDB, partido que governa os dois municípios e o Estado. Tanto o comando da Polícia Civil quando o da PM na Baixada pediram à campanha de Raquel Chini (PSDB), na Praia Grande, que encaminhasse testemunhas sobre as ameaças.
“Orientamos as campanhas a nos procurar. Garantimos o sigilo da apuração, mas até agora não recebemos ninguém”, afirmou o delegado Manoel Gatto Neto, diretor do Departamento de Polícia Judiciária do Interior-6 (Deinter-6), responsável pela Baixada Santista. O medo em formalizar a denúncia – os cabos eleitorais moram nas comunidades ou perto de onde ocorreram as ameaças – seria um dos motivos para a ausência de denúncias formais.
Por enquanto, a inteligência da polícia não detectou nenhum texto que tenha saído da Penitenciária 2 de Presidente Venceslau com ordem da cúpula da facção para intervir no processo eleitoral. Mas não descarta que bandidos tenham iniciativas locais de acordo com seus interesses, como em Arujá, na Grande São Paulo, onde o megatraficante de drogas Anderson Lacerda Pereira, o Gordo, financiara a campanha da chapa vencedora em 2016 para depois se apoderar dos serviços da cidade.
Vigilância
“O que interessa à facção não é começar uma guerra, mas obter lucro”, afirmou o delegado Gatto Neto. Em razão da preocupação das candidaturas na região, o diretor do Deinter- 6 determinou que os homens descaracterizados da inteligência policial acompanhassem as ações de campanha dos candidatos da cidade. Por meio de fotografias e filmagens, carreatas e ações em comunidades de Santos foram vigiadas pelos agentes para garantir a segurança dos candidatos e dos cabos eleitorais. Centenas de fotos já foram feitas pelos policiais.
Na sexta-feira, o prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), conversou com o chefe da Polícia Civil na região e disse que não havia registrado, por enquanto, nenhum incidente durante a campanha do candidato de seu partido à sua sucessão, Rogério Santos (PSDB). De acordo com o delegado, a polícia pôs à disposição o disque-denúncia (181) para receber informações caso os cabos eleitorais não se sintam à vontade para procurar as delegacias.
“Aparentemente, esse problema não deve ter nenhum impacto no resultado das eleições. Nenhum candidato terá seu direito de fazer campanha cerceado por bandidos aqui na Baixada Santista”, afirmou o delegado. Além de Santos, a polícia na região de Campinas também recebeu denúncias sobre ações de criminosos nas eleições.
Campinas
Segundo o delegado Nestor Penteado Sampaio Filho, titular da 1.ª Delegacia Seccional de Campinas, as denúncias que chegaram à polícia informavam sobre a intimidação de líderes comunitários e candidatos a vereador e a prefeito da cidade de mais de um partido em diversos bairro da periferia. “Vamos começar a acompanhar os atos de campanha”, disse.
Entre os casos relatados à polícia está o de uma candidata a vereador na cidade que foi avisada por meio de um áudio recebido pelo WhatsApp para não entrar em um bairro em que pretendia fazer campanha.
A maioria das ameaças relatadas à polícia foi feita por meio de áudio. Uma das hipóteses apuradas pela polícia é de que criminosos da facção tenham sido contratados por candidatos para ameaçar seus adversários.
Vereadores
A Coordenadoria-Geral de Polícia de Repressão a Drogas e Facções Criminosas da Polícia Federal (PF) está investigando o uso do dinheiro do crime organizado no financiamento de candidaturas a vereador em todo o País. A informação é do coordenador-geral do órgão, delegado Elvis Secco.
“Já na Operação Ferrari, em 2013, (ela detectou R$ 100 milhões lavados pela facção), já tínhamos vereadores em cidades pequenas financiados pela facção. Sete anos depois, isso cresceu. A partir de agora vamos catalogar os vereadores eleitos com ligação com o tráfico”, afirmou o delegado.
De acordo com o delegado, o Primeiro Comando da Capital (PCC) já está infiltrado na política. O caso de Arujá, onde o megatraficante Anderson Lacerda Pereira, o Gordo, agiria não é o único. “Temos outras investigações”, contou Secco.
Segundo ele, o caminho de entrada da facção na política – além de patrocinar candidaturas – seria uma forma de ganhar dinheiro com fraudes em contratos públicos, a exemplo do que acontecera nas coleta de lixo em Arujá e na Saúde do município da Grande São Paulo.
O esquema envolveria as organizações sociais abertas por criminosos como uma espécie de empresas de gaveta para serem usadas pelos bandidos no momento de fechar um contrato com os municípios. “As OSs são abertas por integrantes da facção para fraudar contratos com prefeituras pelo País.”
De acordo com o delegado, só na Operação Ferrari havia 70 empresas de fachada utilizadas pela organização criminosa. “Com o tempo, a facção passou a usar o mesmo esquema de empresas de gaveta para lavar o dinheiro assim como foi feito na Lava Jato”, afirmou.
Segundo ele, doleiros que antes atuavam para lavar dinheiro da corrupção estão lavando do tráfico. “O PCC está com muito dinheiro. Eles são a elite do crime hoje no País”, afirmou o delegado. Gordo continua foragido. Sua defesa nega os crimes.