ROTANEWS176 E POR BBC NEWS BRASIL 22/09/2022 10h23
Estima-se que a Rússia possua quase seis mil ogivas nucleares — incluindo 1,5 mil que estão inativas e prontas para serem desmontadas.
Reprodução/Foto-RN176 Mísseis Foto: BBC News Brasil
O presidente russo, Vladimir Putin, anunciou uma “mobilização parcial” das tropas do país para a Ucrânia — e ameaçou usar “todos os meios” à sua disposição para defender o território russo.
Analistas sugerem que, mais do que indicar o desejo de usar tais armas — inclusive as nucleares —, as ações de Putin podem ser interpretadas como uma advertência para que outros países não intensifiquem seu envolvimento na Ucrânia.
No entanto, a escalada retórica e militar de Putin levantou preocupações em todo o mundo.
As armas nucleares existem há quase 80 anos — e muitos países as veem como um elemento de dissuasão para garantir sua segurança nacional.
Quantas armas nucleares a Rússia tem?
O número exato de armas nucleares em posse de cada país é um segredo nacional, então as análises são baseadas em estimativas. Embora o compartilhamento dessas informações varie de acordo com cada nação, a maioria divulga os números de seus arsenais nucleares.
De acordo com a Federação de Cientistas Americanos (FAS, na sigla em inglês), a Rússia tem 5.977 ogivas nucleares (dispositivos que desencadeiam uma explosão nuclear), embora este número inclua cerca de 1,5 mil que estão inativas e prontas para serem desmontadas.
Das cerca de 4,5 mil restantes, a maioria é considerada armas nucleares estratégicas, geralmente associadas à guerra nuclear, que podem ser lançadas a longas distâncias.
Reprodução/Foto-RN176 Gráfico sobre ogivas nucleares estratégicas da Rússia Foto: BBC News Brasil
O resto são armas nucleares menores e menos destrutivas para uso de curto alcance em campos de batalha ou no mar.
Mas isso não significa que a Rússia tenha milhares de armas nucleares de longo alcance prontas para usar.
Apenas 1.588 ogivas russas estão atualmente “implantadas”, segundo os especialistas — ou seja, localizadas em bases de mísseis e bombardeiros ou em submarinos no mar.
Em 2020, o país gastou cerca de US$ 8 bilhões (cerca de R$ 41 bilhões) para construir e manter suas forças nucleares, de acordo com um levantamento feito pela Campanha Internacional para a Abolição de Armas Nucleares (Ican, na sigla em inglês).
Como se compara a outros países?
A Rússia tem o maior arsenal nuclear do mundo atualmente e mantém uma extensa infraestrutura de produção de armas nucleares capaz de projetar e construir novas ogivas e mísseis sofisticados.
Nove países possuem armas nucleares: China, França, Índia, Israel, Coreia do Norte, Paquistão, Rússia, Estados Unidos e Reino Unido.
Reprodução/Foto-RN176 Infográfico mostra número de ogivas nucleares por país Foto: BBC News Brasil
China, França, Rússia, EUA e Reino Unido também estão entre os 191 Estados que assinaram o Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares (TNP).
Sob o acordo, eles têm que reduzir seu arsenal de ogivas nucleares e, em teoria, se comprometer a eliminá-las completamente.
Desde as décadas de 1970 e 1980, o número de ogivas armazenadas nesses países foi reduzido.
Índia, Israel e Paquistão nunca aderiram ao tratado, e a Coreia do Norte o abandonou em 2003.
Israel é o único país dos nove que nunca reconheceu formalmente seu programa nuclear, mas é amplamente aceito que possui ogivas nucleares.
A Ucrânia não possui armas nucleares e, apesar das acusações de Putin, não há evidências de que tenha tentado adquiri-las.
Qual o poder de destruição das armas nucleares?
As armas nucleares são projetadas para causar o máximo de devastação.
O alcance da destruição depende de uma variedade de fatores, mas vai desde acabar com cidades pequenas e médias até a destruição completa de grandes metrópoles, como Nova York.
Entre estes fatores, estão:
– O tamanho da ogiva;
– A que altura é detonada;
– O entorno do local.
Reprodução/Foto-RN176 Gráfico sobre danos de arma nuclear Foto: BBC News Brasil
Mas até mesmo a menor ogiva poderia causar muitas mortes e consequências duradouras.
A bomba que matou 146 mil pessoas em Hiroshima, no Japão, durante a Segunda Guerra Mundial, tinha 15 quilotoneladas.
E as ogivas nucleares de hoje podem ter mais de 1.000 quilotoneladas.
Espera-se que pouco sobreviva na zona de impacto imediato de uma explosão nuclear.
Depois de um clarão ofuscante, há uma enorme bola de fogo e uma onda de explosão que pode destruir edifícios e estruturas a quilômetros de distância.
Além do impacto da explosão, armas nucleares emitem altos níveis de radiação, que também podem ser fatais.
Estima-se que até hoje nenhuma explosão em testes tenha superado a potência da “Bomba-Czar”, da União Soviética, que foi lançada em 1961 com poder equivalente ao de 50 milhões de toneladas de dinamite (50 megatoneladas) — mais de 3 mil vezes mais potente que a lançada sobre Hiroshima.
O que significa ‘dissuasão nuclear’? Tem funcionado?
O argumento para manter um grande número de armas nucleares tem sido ter capacidade de destruir completamente o inimigo para evitar que ele te ataque.
O termo mais famoso para isso é “destruição mútua assegurada” (Mad, na sigla em inglês).
Reprodução/Foto-RN176 Veículo submarino Poseidon com armas nucleares — captura de vídeo feita pela Tass, agência de notícias estatal da Rússia Foto: Getty Images / BBC News Brasil
Embora tenha havido muitos testes nucleares e um aumento constante em sua complexidade técnica e poder destrutivo, as armas nucleares não são usadas em conflitos armados desde 1945.
Até hoje, os EUA foram o único país a utilizar armas nucleares numa situação de conflito — devastando as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki durante a Segunda Guerra Mundial.
A política russa também reconhece as armas nucleares apenas como um elemento de dissuasão — e lista quatro casos para seu uso:
– Lançamento de mísseis balísticos que atacam o território da Federação Russa ou seus aliados;
Reprodução/Foto-RN176 Sarmat, ou ‘Satan 2’, foi anunciado pela Rússia em 2018 como uma arma ‘invencível’ Foto: EPA / BBC News Brasil
– Uso de armas nucleares ou outros tipos de armas de destruição em massa contra a Federação Russa ou seus aliados;
– Ataque a instalações governamentais ou militares críticas da Federação Russa que ameace sua capacidade nuclear;
– Agressão contra a Federação Russa com o uso de armas convencionais quando a própria existência do Estado está em perigo.
Análise: Quão preocupados deveríamos estar?
Por Gordon Corera, correspondente de segurança da BBC
Reprodução/Foto-RN176 Vídeo do Ministério da Defesa russo mostra o Avangard em uma simulação de computador Foto: Getty Images / BBC News Brasil
A ameaça de armas nucleares tem rondado este conflito desde seus primeiros dias, e essa foi uma escolha deliberada por parte de Vladimir Putin. O presidente russo sugeriu seu uso quando estava na defensiva, como após o fracasso de seu plano inicial de fevereiro para derrubar rapidamente o governo de Kiev, e agora, mais uma vez, quando uma ofensiva ucraniana fez suas forças retrocederem.
Ele espera que ao mencionar o poder devastador destas armas consiga intimidar e dissuadir seus oponentes — e os obrigue a pensar duas vezes até onde estão dispostos a avançar.
Há também um motivo interno: a população russa está preocupada com a mobilização parcial e com as próprias afirmações de Putin de que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) ameaça seu país.
Assim, mencionar as armas nucleares é uma forma de tranquilizar a opinião pública interna, ao sugerir que, apesar das adversidades, Moscou ainda é capaz de se defender. A doutrina militar russa diz que as armas atômicas só serão usadas se o Estado russo se vir ameaçado.
Reprodução/Foto-RN176 Jato MiG-31 carrega um míssil Kinzhal sobre Moscou em registro feito em maio de 2018 Foto: Getty Images / BBC News Brasil
Foi notável que Putin enquadrou seu uso num sentido defensivo em resposta ao que alegou serem ameaças nucleares ocidentais. Sua referência a não ser um “blefe” faz alusão a uma situação em que a integridade territorial da Rússia estaria ameaçada.
Neste sentido, é importante se perguntar até que ponto a Rússia pretende expandir seu território após os próximos referendos em território ucraniano. Tudo isso sugere que o uso de armas nucleares está longe de ser iminente ou até mesmo provável.
Embora não se possa descartar a possibilidade de que Putin as use, especialmente se sentir a segurança do Estado ameaçada, a resposta do Ocidente por enquanto provavelmente será observar de perto as ações da Rússia, em vez de sua retórica, e permanecer focado em sua estratégia.
Armas à disposição da Rússia
Entre as armas à disposição do governo russo, estão:
RS-28 Sarmat, um míssil balístico intercontinental com capacidade para transportar até 15 toneladas de ogivas nucleares.
Status-6 (apelidado de Poseidon), se assemelha a um grande torpedo, mas é amplamente referido como um veículo submarino não tripulado. Pode ser equipado com um sistema antimísseis — incluindo mísseis antibalísticos e armas laser — e com uma bomba nuclear de cobalto que, ao explodir, provoca uma onda de tsunami com 500 metros. É capaz de espalhar uma nuvem de material radioativo numa área de 510 mil quilômetros quadrados (quase o tamanho do Estado da Bahia).
Avangard, que pode transportar armas nucleares e convencionais. Tem apenas duas toneladas e viaja a uma velocidade pelo menos 20 vezes superior à do som, o que o permite escapar aos sistemas de defesa antimísseis do inimigo.
Kh-47M2 Kinzhal, um míssil de cruzeiro hipersônico capaz de transportar armas nucleares e convencionais. É o único míssil hipersônico lançado a partir de aeronaves em serviço no mundo todo e pode atingir 10 vezes a velocidade do som.
– Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60564958
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