“Tornem pessoas de bom senso”

ROTANEWS176 08/09/2023 13:20                                                                                                                              CADERNO NOVA RELAÇÃO HUMANA                                                                                                                    Por Ho Goku

Capítulo “Sino do Alvorecer”, volume 30

 

Reprodução/Foto-RN176 Desenho de ilustrações de Ilustração: Kenichiro Uchida

PARTE 41

No dia seguinte, 7 de junho, como parte do curso de verão, foi realizada a convenção comemorativa dos vinte anos do kosen-rufu da Europa. Nessa ocasião também, Shin’ichi Yamamoto estudou os princípios do budismo junto com os participantes, apresentando trechos dos escritos de Nichiren Daishonin. Em um dos pontos, citando que todos os seres vivos possuem inerentemente a condição de buda, enfatizou que o budismo prega o respeito à vida e sempre foi pacifista. E declarou que a história da Soka Gakkai comprova esse fato. Na época da Segunda Guerra Mundial, no Japão, a Soka Gakkai lutou contra a opressão do governo militarista, que se envolveu na guerra tendo como pilar espiritual o xintoísmo do Estado.

Na sequência, referiu-se à postura na sociedade de um budista que faz da paz a sua crença:

— Incorporando profundamente a passagem dos escritos de Nichiren Daishonin — “Todos os fenômenos são manifestações da Lei budista”1 — no coração dos senhores, peço que se tornem pessoas de bom senso, que são um exemplo para os demais como bons cidadãos e bons trabalhadores na sociedade em seu respectivo país. Nós repudiamos absolutamente a violência. Com base nessa convicção, desejo que estendam as raízes da confiança na sociedade, respeitando ao máximo os costumes e as tradições de seu país e localidade. E assim, gostaria que objetivassem a paz, unindo seu coração com o coração dos amigos do mundo.

Shin’ichi falou ainda sobre o poder do Gohonzon que incorpora a Lei Mística, a lei fundamental do universo.

— Não há nada mais complexo que o coração humano que muda sutilmente de momento a momento. A plenitude e a felicidade da vida se definem a partir do quanto se conseguiu fortalecer esse coração, tornando-o inabalável. Na vida, podemos nos defrontar com as tempestades do destino e do carma pelas quais sentimos: “Por que tenho de passar por uma situação tão terrível?”. O objetivo da prática do budismo é fortalecer o coração para que não seja derrotado por nada, superando todas essas adversidades. O Gohonzon é o objeto que incorpora a lei fundamental do universo chamada de Lei Mística. Por meio do nosso “poder da fé” e do “poder da prática”, podemos inspirar a nossa vida com o “poder do Buda” e o “poder da Lei” contidos no Gohonzon do Nam-myoho-renge-kyo. Dessa forma, conseguimos manifestar uma extraordinária energia vital e abrir, infalivelmente, o espesso portal de ferro das dificuldades e dos sofrimentos.

O filósofo francês Michel de Montaigne afirma: “A bravura não significa que os braços e as pernas são fortes, mas depende da firmeza do coração e da alma”.2

PARTE 42

Aqui, Shin’ichi passou a discorrer sobre a expressão “despertar espiritual” citada no budismo:

— O “despertar espiritual” possui o significado de “despertar de uma aspiração à iluminação”. De forma simples, significa manifestar o espírito de buscar a iluminação, isto é, a decisão de se tornar Buda ou de alcançar o estado de buda. Para que se tenha uma existência plena, não há como deixar de enfrentar questões básicas como “Quem sou eu?”; “Qual é a minha missão nesse mundo?”; “O que é a minha vida?”; “Que tipo de valor devo criar para a sociedade e como contribuir para ela?”. Buscar e desafiar sempre a solução dessas questões, dedicando-se ao exercício budista que é, em si, o exercício do ser humano, correspondem ao “despertar espiritual”, ou seja, a expressão do espírito de se desenvolver.

Shin’ichi vinha se preocupando em como transmitir os princípios e termos budistas aos companheiros da Europa de uma forma compreensível. Por mais que um princípio filosófico seja profundo, se as pessoas não o compreenderem, no final, não lhes acrescentará nenhum valor. É no desenvolvimento do budismo para a atualidade que se encontra o caminho para tornar a suprema sabedoria do homem o mais valioso tesouro espiritual comum a todo o mundo.

Em 8 de junho, abrilhantando o encerramento do curso de verão, foi realizado um festival cultural da amizade.

Os membros da Inglaterra cantaram com ardente paixão:

Unidos por forte laço

De coração a coração,

Vamos desbravar o caminho da liberdade

Por mais que esse caminho seja longo,

Hasteando

a luz da esperança

Os membros da Dinamarca, da Noruega e da Suécia dançaram fazendo esvoaçar lenços floridos; os da Espanha bailaram com jovialidade e atiraram os chapéus pretos à plateia; os da Bélgica apresentaram uma coreografia própria com a música Doshi no Uta [Canção dos Companheiros] ao fundo; e seguiram-se as apresentações da Alemanha Ocidental, da Suíça, da Grécia e de outros países.

O coração de todos se fundiu num só: “Não serei derrotado! Vencerei infalivelmente!”. O som das músicas ecoava na montanha da vitória, Sainte-Victoire. A Europa se tornava uma só. Era uma aliança de espírito a espírito dos seres humanos, que visam à paz do mundo.

PARTE 43

No dia 9, após o meio-dia, Shin’ichi Yamamoto e comitiva visitaram Marselha. Sobre uma suave colina, via-se um campanário de formato quadrangular. Era a Basílica de Notre-Dame de la Garde. Do alto da colina, avistava-se uma pequena ilha cercada por sólidos muros de pedra no meio do Mar Mediterrâneo de águas da cor de cobalto. Era o Château d’If (Castelo de If), palco do romance O Conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas. Originalmente, o Château d’If havia sido construído como um forte, mas pela dificuldade de alguém sair de lá, acabou sendo utilizado como uma prisão, onde foram encarcerados criminosos políticos e outros. O personagem Edmond Dantès (posterior conde de Monte Cristo) é descrito como alguém que ficou preso por catorze anos nesse local.

Reprodução/Foto-RN176 Desenho de ilustrações de Ilustração: Kenichiro Uchida

Meu mestre, Josei Toda, que foi aprisionado durante dois anos na época da Segunda Guerra Mundial, prometeu firmemente em seu íntimo: “Vou vingar a morte de Makiguchi sensei, que faleceu na prisão suportando todos os tipos de sofrimento, tal como o conde de Monte Cristo! Vou abrir o caminho do kosen-rufu e comprovar resolutamente a retidão do meu mestre!”. E assim, iniciou a jornada da reconstrução da Soka Gakkai após o término da guerra.

Shin’ichi sentia que o espírito do conde de Monte Cristo pulsava também na Resistência Francesa (La Résistance) que conquistou a vitória, suportando a violenta opressão dos nazistas.

O conde de Monte Cristo simboliza uma pessoa indomável, de coragem, de convicção e de persistência. O kosen-rufu só se torna possível com a presença desse tipo de pessoas. Portanto, deve-se continuar avançando com obsessão e forte perseverança até concretizar o objetivo, sem retroceder diante de quaisquer dificuldades. O que se levanta para obstruir esse caminho é a barreira no coração, por exemplo, “Já deve ser suficiente” ou “Mais que isso é impossível. Já chegamos ao limite”. Somente quando se rompe esse sentimento, extraindo todas as suas forças, e inicia-se a caminhada da obstinação, o sol da vitória resplandece.

Observando o aspecto dos jovens da França e da Europa, e visualizando o século 21, Shin’ichi orava: “Surjam muitos e muitos como o ‘conde de Monte Cristo’ da Soka Gakkai! Com as mãos, façam badalar o sino do alvorecer da cooperação humana da nova era”.

O mar reluzia prateado, banhado pelos raios do sol.

PARTE 44

Kosen-rufu é uma constante nova partida. É uma jornada de desafio repleta de esperança.

Pouco depois das 15h30 do dia 10, a comitiva de Shin’ichi Yamamoto partiu de Marselha, despedindo-se de cerca de cinquenta membros locais, em uma viagem ferroviária que levaria umas sete horas rumo a Paris. O palco de luta ininterrupta de Shin’ichi transferiu-se para Paris, a Cidade Luz.

Durante a estada em Paris, no dia 11, participou de uma recepção comemorando a publicação do diálogo Escolha a Vida com o falecido historiador Arnold J. Toynbee, em língua francesa.

No dia seguinte, 12 de junho, dialogou com René Huyghe, artista e escritor, membro da Academia Francesa. Conversaram e trocaram opiniões sobre o diálogo entre os dois A Noite Clama pela Alvorada, publicado no ano anterior em língua francesa, como também sobre Victor Hugo.

E no dia 15, visitou o presidente do Senado francês, Alain Poher, com quem manteve o primeiro encontro na residência oficial dele. Antes do encontro, por cortesia do presidente, conheceu as dependências do Senado. Era o histórico Palácio de Luxemburgo, onde havia também a sala de Victor Hugo, que chegou a atuar como senador. Ali, o que chamava atenção era uma gravura de Victor Hugo na parede. Estava estampado o rosto dele com barba, demonstrando sua firmeza de caráter.

Na majestosa sala principal, havia o lugar que foi ocupado por Victor Hugo. Uma placa comemorativa afixada ali e também uma placa dourada gravada com o rosto dele colocada em sua mesa louvavam a indestrutível contribuição prestada por ele.

Shin’ichi foi conduzido até esse lugar. Parecia ressoar seu apaixonado discurso pela eliminação da pobreza, pela reforma da educação e contra a pena de morte.

Abençoado por sua rara habilidade em literatura, Victor Hugo foi agraciado com a Ordem Nacional da Legião de Honra, a mais elevada honraria da França, aos 23 anos. Ele ingressou no mundo da política em 1845, aos 43 anos. Não conseguia fechar os olhos à realidade, por exemplo, da extrema miséria das pessoas. Era uma pessoa da literatura e, ao mesmo tempo, de ação. Sem dúvida, um grande ser humano.

O personagem do presidente Ikeda no romance é Shin’ichi Yamamoto, e seu pseudônimo, como autor, é Ho Goku.

Ilustrações: Kenichiro Uchida

Notas:

  1. The Writings of Nichiren Daishonin[Os Escritos de Nichiren Daishonin], v. II. Tóquio: Soka Gakkai: 2006, p. 843.
    MONTAIGNE. Renomadas Obras do Mundo. v. 19. Tradução: Shotaro Araki. Editora Chuo Koron Sha.

FONTE: JORNAL BRASIL SEIKYO – BSGI