ROTANEWS176 E POR IG 27/02/2022 14:38 Por Renan Tafarel
O cão farejador é selecionado desde seu nascimento, dentro de raças mais requisitadas. Adestrador e zootecnista explica como funciona o processo
Reprodução/Foto-RN176 Farejar é um instinto natural dos animais, mas é difícil fazê-lo rastrear algo sem treinamento. É necessário despertar o instinto rastreador que todo canino tem – reprodução shutterstock
RESUMO
· O cães farejadores são condicionados a acreditar que, ao encontrar um determinado odor, ele receberá algo positivo em troca. Essa recompensa pode ser em petiscos, brincadeiras e até elogios.
· Um mesmo cão pode ter treinado para detectar mais de um odor, contanto que não interfiram entre si, ou causem problemas.
· Os cães são escolhidos dentro de raças que atendam mais aos propósitos de cada função, Além disso, o indivíduo deve atender ao perfil do serviço, como busca por vítimas desmoronamentos ou procura de itens em aeroportos, por exemplo.
É de conhecimento comum que os cães têm um olfato muito apurado e que podem sentir o cheiro de algo, ou alguém, a grandes distâncias. Esses animais, além de serem popularmente conhecidos como “o melhor amigo do homem”, também exercem funções de extrema importância para a vida e segurança de todos nós.
Eles auxiliam na busca por drogas ilícitas e armamentos em aeroportos, ajudam na busca por vítimas em desastres, de pessoas desaparecidas ou fugitivas e até mesmo a encontrar sinais de doenças comuns e, como mais recentemente, a identificar sinais do vírus causador da Covid-19.
São trabalhos realmente muito importantes e que somente os cães são capazes de exercer, mas qualquer cão pode fazer isso? Existem mesmo raças de cães que são mais eficazes para determinadas tarefas?
Para sanar essas e outras curiosidades a respeito dos cães farejadores e como é feito esse treinamento, o Canal do Pet conversou com o adestrador e zootecnista Cláudio Fudimoto. Segundo ele, existem sim raças específicas para cada tipo de trabalho, e por isso se preza muito pela criação consciente dos animais.
“Nós fazemos uma seleção genética, um melhoramento genético, a fim de selecionarmos cães cada vez mais aptos ao trabalho de cães farejadores. Esse não é um trabalho fácil de se fazer, tanto para o homem, na condução do adestramento, quanto para os cães, porque esse é um desafio enorme”, conta o adestrador.
Cláudio explica que é preciso fazer o cachorro entender que ele deve procurar por um odor específico e ignorar uma quantidade imensurável de outros odores que estão presentes no ambiente. Sendo assim, não basta ter um cão, é preciso ter um indivíduo proveniente de uma raça com a seleção genética a fim de desempenhar trabalhos que exijam a identificação de odores e inteligência o suficiente para entender a relação entre odor e prazer.
“O prazer proveniente dos pagamentos que nós fazemos, por meio de petiscos, brinquedos, brincadeiras, afagos e da relação binômio – entre homem e cão. Então há a necessidade sim de termos raças específicas para trabalhos específicos. Além do custo benefício, em manutenção, transporte e a viabilidade de manter cães de determinadas raças, pesos e portes diferentes para que possamos ter uma forma de escolher um indivíduo específico”, conta o profissional.
O adestrador menciona exemplos como ambientes confinados e pequenos, nesses casos são necessários cães que tenham uma boa capacidade olfativa, tenha uma boa movimentação e que seja esguio o suficiente para passar por espaços pequenos.
“Cães de estruturas colapsadas, que vão procurar pessoas desaparecidas, cadáveres, precisam ser cães leves, calmos e concentrados, a fim de trabalhar em um ambiente totalmente avesso às condições normais. Além da tensão, e que esses cães não venham a piorar a cena do evento”, explica.
Dentro de uma raça, qualquer cão pode atuar como farejador?
Reprodução/Foto-RN176 Os cães farejadores são treinados para trabalharem junto com a polícia em diversos casos – reprodução shutterstock
Cláudio afirma que não, além de uma raça determinada, é preciso encontrar o indivíduo certo. “Nós temos que procurar por um indivíduo que se adeque às condições. Então para isso nós procuramos por características específicas, como a capacidade de resolver problemas, capacidade cognitiva, treinabilidade, adestrabilidade”, diz.
É preciso que o cão se encaixe em um perfil um tanto quanto restrito. “O cachorro tem que ser independente, ao mesmo tempo que trabalha com o binômio (dependente do homem), e tem que ser curioso”, o zootecnista ainda ressalta que existe um número relativamente pequeno de cães que se qualificam para essa função.
Como funciona o treinamento
O processo de treinamento é bastante longo e complexo. O profissional explica que o cão deve associar um odor específico (que se deseja que ele procure) ao recebimento de uma recompensa. “Nós escondemos determinados odores e fazemos o cachorro acreditar que, quando os encontrar, ele vai receber algo positivo em troca”.
Um cão farejador pode ser treinado para mais de um odor?
Para Cláudio, o olfato está para os cães como a visão está para os humanos. Sendo assim, é possível treinar um cão para detectar diversos odores, mas é preciso pensar na viabilidade disso e até onde é conveniente fazê-lo.
De forma enfática, ele explica que, “para um cachorro detector de explosivos, é viável que ele seja treinado para a detecção de narcóticos, ou produtor ilícitos, por exemplo? A resposta para isso é não! E isso porque nós, como homens, ao não interpretarmos os sinais, nós podemos crer que o animal está nos indicando a presença de um entorpecente quando, na verdade, existe ali a presença de um artefato que pode explodir. Então isso não é viável”.
Os cães treinados para a busca de explosivos serão treinados exclusivamente para essa função, porém, “os cães treinados para a detecção de narcóticos, como a THC (como a cannabis), também podem ser treinados para encontrar o cloridrato de cocaína, assim como vários outros tipos de drogas. Porque assim que ele nos identificar, nós saberemos que ali existe um produto ilícito que não colocará os demais membros da equipe em risco”, exemplifica.
Os cães farejadores funcionam como nos filmes?
Reprodução/Foto-RN176 Os Beagles são excelentes farejadores – olginaa84/Pixabay
Na TV e no cinema é comum vermos alguém dando uma peça de roupa ou um pertence de algum indivíduo para que o cão sinta o cheiro e então siga o rastro dessa pessoa, e é exatamente assim que funciona.
“Esse tipo de detecção é chamado de ‘faro por odor específico’ ou, como no termo em inglês, ‘mantrailing’. Esse tipo de treinamento se faz mostrando ao animal o odor que ele tem que encontrar”, conta.
No treinamento, conforme explica Cláudio explica, uma gaze com um certo cheiro (ou objeto com o odor da pessoa desaparecida ou foragida) é isolada em um saco hermeticamente fechado e, posteriormente, esse item será apresentado ao cão.
“O cão vai guardar esse odor na memória, porque cada pessoa tem um odor característico e único, como uma impressão digital. A partir daí, o cão ignora todos os outros odores e vai rastrear as trilhas de odores deixado ao longo do trajeto e irá indicar ao condutor o caminho que se deve seguir”, explica.
Quanto tempo dura o treinamento em média?
Cláudio explica que o tempo de treinamento depende muito da técnica usada, a capacidade técnica do adestrador e também da capacidade de aprendizagem do cão.
“No geral, para um cão se tornar totalmente qualificado e certificado por um órgão competente, como cão farejador, ele leva cerca de dois anos e meio de duração, em média”, afirma.
O zootecnista ressalta que esse não é um trabalho fácil e que demanda tempo, muita paciência e, acima de tudo, muito conhecimento. Não sendo qualquer um, mesmo que seja adestrador profissional, que pode realizar esse treinamento.