ROTANEWS176 E POR JORNAL BRASIL SEIKYO 17/10/2020 18:13
RELATO
Numa jornada inspiradora, a família Nascimento relata a alegria de fazer parte da BSGI há mais de meio século
Reprodução/Foto-RN176 Altair Nascimento e Nilson Nascimento aposentados, conselheiros do Distrito Centro. Natália Nascimento, aposentada, resp. pela DF da RM Sergipe. CRE Leste, CGRE – Foto Editora Brasil Seikyo – BSGI
A família Nascimento completa 52 anos de prática budista, desbravados com a bravura de pessoas que decidiram vencer os desafios e ser felizes. Nesta edição, Brasil Seikyo conta essa surpreendente história construída em meio ao desenvolvimento da sexagenária BSGI, numa jornada em que se entrelaçam as vitórias de mestre e discípulo.
Novo despertar
Natália é a filha mais velha do casal Altair e Nilson e a personagem que relembra os detalhes sobre a trajetória da família.
Em Aracaju, SE, desde 2006, desfruta uma vida tranquila com os pais, numa casa confortável. “Sinto imensa alegria por cuidar deles, pois estou cumprindo o direcionamento que recebi de Ikeda sensei na juventude. Anos atrás, eles tinham uma rotina atribulada em São Paulo e, hoje, com mais de 80 anos, cuidam das galinhas e da horta que temos num maravilhoso quintal, e têm mais tempo e disposição para participar das atividades da BSGI. São integrantes do coral, realizam plantões de atendimento aos membros na sede regional, fazem faxina, cuidam das plantas; são bem ativos. Meu pai gosta de ir à feira comprar frutas para pôr no oratório. Somente deixou de fazê-lo por conta da pandemia”, afirma Natália.
Ele, que teve um câncer de próstata em 2017, é exemplo de superação na localidade. “Passou por uma cirurgia bem-sucedida, que dispensou o tratamento de quimioterapia. O segredo dele é a fé. Há mais de cinquenta anos, recita duas horas de daimoku todos os dias. Ele costuma dizer que não há nada que vença quem tem daimoku nas costas [risos]”, completa a filha.
Da infância, vivida no Jardim Miriam, zona sul da capital paulista, ela guarda memórias desafiadoras que a fizeram amadurecer rápido. “Minha irmã por parte de mãe, Glayds, morava com minha avó. Meu irmão, Nailton, meus pais e eu morávamos numa comunidade carente e éramos privados de muitas coisas. Certa vez, mamãe cozinhou o único ovo que tínhamos, dividindo entre meu irmão e eu, e tomou um copo d’água para conter a fome. Apenas sobrevivíamos sem saber como mudar a situação.”
É nessa época também que Nilson participa da primeira atividade da BSGI, a convite do amigo Joaquim. O aspecto feliz dos participantes desperta-lhe a esperança. “Vou praticar essa religião!”, decide. Assim, em 22 de agosto de 1968, recebe o Gohonzon, na então sede central da BSGI. “Quando entrei na sala principal, avistei um quadro com a foto do presidente Ikeda. Minha primeira reação foi dizer ‘Eu conheço esse japonês! Eu peguei as malas dele!’”, relembra.
Isso porque, em 1960, trabalhava numa companhia de aviação como carregador de bagagem, quando da primeira visita de Ikeda sensei ao Brasil. “Acompanhei sua chegada e sua partida, e fiquei encantado ao ouvir um grupo de pessoas cantando para recepcionar a comitiva. Era a Canção do Imponente Avanço [Ifu Dodo no Uta]. Comentei sobre o ocorrido com minha esposa e expus minha preocupação com aquele homem que parecia um pouco adoentado. Fazia frio”, descreve Nilson.
Ele continua: “Oito anos depois, Ikeda sensei passou a ser o mestre da minha vida, e ao longo dos anos venho me dedicando para corresponder às suas expectativas”.
A felicidade chegou
Em casa, praticando o budismo sozinho, Nilson inspira os demais com sua convicção: “Ele mudou bastante. Parou de beber e adotou uma postura mais tolerante. E mesmo levando até duas horas para fazer as orações, não desistiu. Passados três meses, as crianças iniciaram a prática. Eu, ainda ressabiada, recitava Nam-myoho-renge-kyo escondida e logo aprendi a ler a liturgia da Soka Gakkai”, conta a esposa, Altair.
“Quando papai soube que minha mãe já recitava gongyo, ficou emocionado. Foi a primeira vez que o vi chorar”, revela Natália.
Ela detalha: “Ainda havia dificuldades, mas passamos a recitar daimoku pela nossa felicidade. O Gohonzon foi consagrado numa caixinha de maçãs, e para participar das atividades caminhávamos uma, duas horas. Eu só tinha um chinelo de borracha, com um reparo feito com prego, e meus pés sempre ficavam sujos. Muitas vezes, junto com meu irmão, aproveitava a água da chuva, nas canaletas, para lavá-los. Mas íamos felizes para as reuniões”.
Na organização, Altair e Nilson assumem a liderança da Comunidade Miriam e atuam com a meta de promover o desenvolvimento da localidade. “Não tínhamos estrutura como hoje, porém, avançamos lutando pelo kosen-rufu. Lembro-me de que recebemos o Sr. Eduardo Taguchi (presidente da BSGI, na ocasião) recém-chegado do Japão, numa reunião com cem pessoas. Ele nos incentivou com a ajuda de um tradutor. Foi inesquecível”, complementa Altair.
Com base na filosofia da revolução humana, os Nascimento se desenvolvem ao passo que transformam sua realidade. “Meu pai comprou um carro para trabalhar como taxista e nós nos mudamos para uma casa de tijolos. Meus pais alugaram um salão para fazer as reuniões de palestra devido à quantidade de participantes e de novos membros, e recitavam horas e horas de daimoku pelo sucesso desses encontros. Muitas vezes eu tomava conta do meu irmão, que tinha convulsões. Aos poucos, ele se recuperou dessas crises e, adiante, ingressou no Taiyo Ongakutai, banda masculina; eu, aos 15 anos, consegui um estágio numa grande empresa de telefonia. É como Nichiren Daishonin declara: ‘Mesmo que alguém errasse ao apontar para a terra ou fosse capaz de atar o firmamento; mesmo que o fluxo e refluxo da maré cessassem; e o Sol nascesse no oeste, jamais ocorreria de as orações do devoto do Sutra do Lótus ficarem sem resposta’”,1 ressalta Natália.
Então, continua: “Em 1984, recebíamos o presidente Ikeda no Brasil. Que alegria! Era integrante do Ballet Mil Milhas, meus pais do coral e meu irmão do grupo de samba no Festival Cultural da BSGI. Dois anos depois, realizava o primeiro curso de aprimoramento da SGI, no Japão, com todas as responsáveis do meu distrito, comprovando que ‘O inverno nunca falha em se tornar primavera’”.2
Sublime missão
Natália assume a vice-liderança da Divisão Feminina de Jovens da BSGI e a liderança do grupo Cerejeira, em 1987 – etapa que considera um grande tesouro. “Abracei essa chance com sinceridade. E, desejando corresponder a Ikeda sensei, aprendi a cultivar a gratidão. Foi um período desafiador por conta da problemática do clero. Tivemos de proteger a Gakkai com todas as forças. Também acompanhava a Orquestra Filarmônica Brasileira do Humanismo Ikeda e fui líder do coral da BSGI. Viajei para muitos lugares para incentivar os membros e amadureci bastante com isso”, ela relembra.
Entre as viagens, destaca a segunda vez que foi ao Japão, em 1992, participando do 5o Curso de Aprimoramento da Divisão dos Jovens da SGI. “Contei relato para mais de 3 mil jovens, e o meu grupo havia convidado o presidente Ikeda para vir ao Brasil novamente. Na mesma ocasião, nós nos encontramos com o casal Ikeda num jantar. O Mestre solicitou que eu protegesse meus pais e me presenteou com um bolinho de feijão, o qual compartilhei com os amigos. Esse dia se tornou um ponto primordial”.
Então, desponta 1993, ano da quarta visita do líder da SGI ao Brasil. “Quando Ikeda sensei chegou ao Centro Cultural Campestre (CCCamp), em Itapevi, SP, com um largo sorriso segurava um buquê para recepcioná-lo. Senti uma emoção muito grande!”.
Natália também integra a equipe de ornamentação, esforçando-se nos preparativos da Convenção da SGI. “Algumas letras da lateral do palco se descolaram e tivemos de improvisar os mastros de bandeiras utilizando cabos de madeira e tinta prateada. Fiquei apreensiva, mas no final tudo foi maravilhoso”, revive.
Cumprir um juramento
Proporcionar uma velhice confortável aos pais se torna o principal objetivo de Nailton, Natália e Glayds. Em paralelo, Altair se dedica ao trabalho numa instituição que dá assistência a pessoas com deficiência, destacando-se pela sua postura humanística. “Durante quase dezesseis anos, cuidei deles com amor e respeitando sua dignidade. Aprendi a fazer papel reciclado e ensinei esse processo aos internos, que passaram a me ajudar e a ter um salário. Embora desafiador, foi um projeto muito gratificante”, cita Altair.
Nilson ainda era taxista quando Natália se aposentou, em 2005, após trabalhar 31 anos na mesma empresa de telefonia. “No ano seguinte, me mudei para Aracaju com meus pais. Já atuando pela Divisão Feminina, vim com o desejo de contribuir para que a DF da localidade seja a mais feliz do mundo!”, brada.
Para os filhos, o retorno dos pais à terra natal foi uma grande alegria. Emocionados, contam que sua trajetória de fé sempre foi admirável.
Tal convicção é essencial quando Altair é diagnosticada com câncer no intestino, em 2009. “Decidi vencer a doença com forte fé no Gohonzon. Encontrei bons médicos. Fiz radioterapia, quimioterapia e nem mesmo tive queda de cabelos. A fase mais crítica foi quando fiquei em coma após passar por uma cirurgia. Natália me contou que recitava gongyo e daimoku em meu ouvido; até que certo momento consegui recitar Nam-myoho-renge-kyo. Superei complicações nos rins, cheguei a pesar 40 quilos e perdi o movimento das pernas. No entanto, sentia que Ikeda sensei aguardava minha vitória e resisti. Recuperei-me completamente”, conta ela.
Em 2016, mãe e filha viajam para o Japão levando essa vitória na bagagem. “Vivemos dias inesquecíveis e pude expressar toda a gratidão à minha mãe. Foi a comprovação de uma vida inteira de desafios e conquistas, lutando pelo kosen-rufu, sem jamais abandonar a Gakkai. Quanta felicidade!”, comemora Natália.
A família Nascimento venceu. E o desfecho dessa história cinquentenária é uma combinação de abnegados esforços e o desejo de corresponder ao Mestre; um drama que inspira persistência e coragem. “Minha meta é dedicar a vida em prol da Lei Mística. Não importa onde estiver, defenderei o budismo com toda a convicção. E defenderei o desejo de Ikeda sensei de proteger a vida”, finaliza, emocionada.
Notas:
- Coletânea dos Escritos de Nichiren Daishonin, v. I, p. 362.
- Ibidem, p. 559.
Altair Nascimento, 82 anos, e Nilson Nascimento, 85 anos, aposentados, conselheiros do Distrito Centro. Natália Nascimento, aposentada, resp. pela DF da RM Sergipe. CRE Leste, CGRE.