Como foi e quais os efeitos devastadores do primeiro teste nuclear liderado por Oppenheimer no Novo México

ROTANEWS176 22/07/2023 às 13:01                                                                                                                              Por Germán Padinger

O primeiro teste nuclear da história aconteceu em um polígono das Forças Armadas dos Estados Unidos, no deserto de Jornada del Muerto.

 

Reprodução/Foto-RN176 Fotografia da Segunda Guerra Mundial mostrando a bola de fogo explosiva gerada no primeiro teste de bomba nuclear, codinome Trinity, em White Sands Missile Range, no Novo México, 16 de julho de 1945. O teste fazia parte do Projeto Manhattan.John Parrot/Stocktrek Images/ via Getty Images

Quando aconteceu o primeiro teste nuclear da história, a detonação do chamado “gadget” (aparelho), em 16 de julho de 1945, no Novo México, pouco se sabia realmente sobre os efeitos da radiação liberada nesta escala, muito menos o fallout, a chuva de partículas radioativas, que chegaram após a explosão sobre territórios povoados em grande parte por hispânicos e nativos.

É claro que a radiação havia sido descoberta em 1896 e os experimentos não faltavam, mas a possibilidade de uma explosão atômica só se tornou realidade em 1938, quando a fissão nuclear foi descoberta e o desenvolvimento das primeiras armas atômicas começou logo depois.

Este é um olhar sobre os efeitos do teste “Trinity”, conclusão do Projeto Manhattan com o qual os Estados Unidos buscaram desenvolver – com sucesso – uma bomba atômica antes da Alemanha, e a luta que persiste pelo reconhecimento das vítimas, entre elas, numerosos hispânicos e tribos nativas.

O que aconteceu em 16 de julho de 1945?

O primeiro teste nuclear da história aconteceu em um polígono das Forças Armadas dos Estados Unidos, no deserto de Jornada del Muerto, no Novo México, 336 quilômetros ao sul da cidade de Los Alamos.

O “gadget”, uma bomba nuclear do tipo implosão que utiliza plutônio como combustível nuclear, foi colocada em uma plataforma a 30 metros de altura e detonada às 5h30 da manhã do dia 16 de julho de 1945.

A explosão, a maior já vista na história mundial, teve a potência de 18,6 quilotons (ou o equivalente a 18.600 toneladas de TNT), e a intensa luz foi vista a uma distância máxima de 320 quilômetros.

De um ponto militar e científico, o teste foi um sucesso retumbante que abriu as portas para um novo mundo marcado pelo horror e pela ansiedade: um mês depois, os Estados Unidos lançaram as duas primeiras bombas atômicas sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, matando mais de 100.000 pessoas instantaneamente.

Mas enquanto os bombardeiros B-29 aterrorizavam o planeta, evaporando duas cidades no Japão, no Novo México, onde o local da explosão não foi fechado e os moradores até visitados após o teste, começava-se a entender mais sobre as consequências imediatas de uma explosão nuclear.

O que acontece com as pessoas durante uma explosão nuclear?

No momento da explosão, uma bomba nuclear libera energia em três etapas: a primeira é a onda de choque, a destruição causada pelo impulso de um ar comprimido que destrói tudo em seu caminho; segue-se então um pulso de calor extremo, com temperaturas próximas à do sol; o último estágio é a radiação letal emitida no primeiro minuto da explosão.

Esses são os efeitos imediatos e quase instantâneos causados pela explosão nuclear, mas há mais. Se a detonação de um dispositivo nuclear ocorrer no ar, partículas leves e gases radioativos são lançados na atmosfera, a uma altitude máxima de 80 quilômetros.

Essas partículas e gases então caem progressivamente na Terra —pode até levar anos—, um fenômeno conhecido como precipitação ou precipitação radioativa (não porque cai como água, mas porque as partículas descem lentamente para a terra).

A precipitação radioativa não tem o poder destrutivo ou letal de uma explosão nuclear, mas é uma séria ameaça às pessoas, aos animais e à vida em geral, uma ameaça que também se estende ao longo do tempo.

Reprodução/Foto-RN176 White Sands Missile Range, no Novo México, nos EUA. Memorial ao Projeto Manhattan, que culminou na explosão da primeira bomba nuclear. / Pgiam/ via Getty Images

De acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (EPA), a precipitação radioativa pode contaminar a água e as plantas, levando posteriormente pessoas e animais a ingerir as partículas radioativas e sofrer os efeitos dessa contaminação na saúde, especialmente através do desenvolvimento de câncer, aborto espontâneo e deformidades nos fetos.

A letalidade desses efeitos não foi bem compreendida até a década de 1960, quando centenas de outros testes pós-Trinity já haviam sido conduzidos pelos Estados Unidos, e países como União Soviética, Reino Unido, França e China se juntaram para testar suas próprias armas.

Cada uma dessas explosões liberou enormes quantidades de partículas na atmosfera.

Em 1963, a maioria dos países do mundo, incluindo as potências nucleares, concordou em acabar com os testes nucleares atmosféricos com o Tratado de Proibição Parcial de Testes Nucleares, precisamente por causa da crescente evidência do perigo de precipitação. O tratado, no entanto, permitia a realização de testes subterrâneos.

Leia mais assuntos relacionados a explosão nuclear:

RN176; – Como funciona a bomba nuclear?

RN176; – Nossos salvadores do espaço: porque os alienígenas não gostam de armas nucleares

RN176; – Morre último homem do Enola Gay, que jogou a bomba atômica

E mais tarde, em 1996, foi assinado o Tratado de Proibição Abrangente de Testes Nucleares, cancelando todos os testes. Mas mesmo os países nucleares que não assinaram o tratado, como a Coreia do Norte, realizam seus testes no subsolo por medo de consequências.

As vítimas do “desacelerar” do “Trinity”

A precipitação radioativa da explosão do “gadget” no Novo México se espalhou cerca de 400 quilômetros a nordeste, e baixos níveis de partículas radioativas foram detectados mesmo em cidades tão distantes como Albuquerque e Santa Fe, de acordo com o US National Park Service, que administra o local da explosão como um parque histórico.

Alguns dos territórios mais afetados pela precipitação foram os condados de Lincoln, Socorro, Otero e Sierra, dentro da Bacia de Tularosa e próximos ao local onde foi realizado o julgamento “Trinity”.

Esses quatro condados tinham uma população de 37.463 pessoas em 1940, de acordo com o censo federal daquele ano. É uma região rural e é habitada principalmente por brancos não hispânicos, hispânicos e nativos.

No caso de Socorro, os hispânicos representam 50,3% do total, os brancos não hispânicos são 32,3% e os nativos, 11,7%, segundo o censo de 2020.

Lá, o maior número de problemas de saúde foi relatado em pessoas saudáveis, incluindo leucemia e outros tipos de câncer. Mas um aumento na mortalidade infantil também foi relatado em cidades como Roswell, a 180 quilômetros de “Trinity”, segundo a organização Nuclear Threat Initiative.

As pessoas afetadas pela precipitação “Trinity” e centenas de outras provações ficaram conhecidas como “Downwinders” (que se traduz como aqueles que vivem a favor do vento, uma referência ao efeito do vento na direção da precipitação radioativa).

Em 1995, Tina Cordova e Fred Tyler fundaram o Tularosa Basin Downwinders Consortium, um grupo que exige que as vítimas da precipitação de Trinity sejam reconhecidas sob o Radiation Exposure Compensation Act (RECA), com base em estudos recentes de exposição radioativa causada pelo teste de 1945.

Aprovada em 1990, a lei RECA prevê indenizações para vítimas de testes nucleares atmosféricos e trabalhadores da indústria de urânio nos Estados Unidos com pagamentos entre US$ 50.000 e US$ 100.000. Mas ele não reconhece os “Downwinders” do Novo México afetados por “Trinity”.

FONTE: CNN